ESA_logo.png                                               Recebido: 3.mar.2023   •    Aceito: 4.set.2023   •    Publicado: 5.out.2023                                                                                                                                                                                                                                                   

Situações de emergência no sudeste do Pará: a sobrevivência econômica e social de duas organizações camponesas em tempos de pandemia e pecuarização

Emergency situations in southeastern Pará: the economic and social survival of two peasant organizations amid the pandemic and expanding livestock farming

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Cristiano Bento da Silva[1]

 

 

 

 

 

https://doi.org/10.36920/esa31-2_06

 

Resumo: São Félix do Xingu – PA é o município brasileiro campeão de produção de gado, com um rebanho de mais de 2 milhões de cabeças, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2020). A forte presença dessa atividade, entretanto, não pode ser vista como a única em curso ou a que representa, em absoluto, todas as formas de apropriação, significação e uso dos espaços. A região acolhe uma diversidade social ampla, sendo os agricultores e agricultoras familiares atores expressivos. Durante a pandemia, estes últimos viram as suas lógicas de existência confrontadas. Estimulado a investigar a situação, o presente trabalho estudou o modo como agricultores e agricultoras familiares do município de São Félix do Xingu – PA organizados em associações e cooperativas atravessaram/atravessam a crise no contexto da pandemia e dos processos de pecuarização. A análise recaiu sobre as suas maneiras de perceber riscos à saúde e à perda de condições de trabalho em face do referido cenário. A pesquisa realizada foi de natureza qualitativa, sendo a ferramenta digital WhatsApp um instrumento de interlocução fundamental, nos tempos mais duros da pandemia. As entrevistas foram semiestruturadas, sendo o distanciamento devidamente observado. A pandemia da Covid-19 impôs uma situação de vulnerabilidade aos interlocutores da pesquisa, pela ameaça à saúde física, mas também econômica e social. A despeito da situação, os atores sociais seguem reoxigenando as esperanças, mantendo as suas agendas e planos traçados.

Palavras-chave: crise; pandemia; pecuária.

 

Abstract: São Félix do Xingú, Pará is the Brazilian city that produces the most cattle, with a herd of over 2 million head, according to the Brazilian Institute of Geography and Statistics (IBGE, 2020). Despite its strong presence, this is not the only activity underway in this region, nor does it entirely represent all forms of appropriation, signification, and use of spaces. The region is home to broad social diversity, and family farmers play an important role; during the pandemic, these farmers saw their way of living threatened. In an effort to investigate the situation, this work studied how family farmers in São Félix do Xingu who had organized themselves into associations and cooperatives lived through and continue to live through the crisis within the context of the pandemic and expanding livestock farming. The analysis focused on how they perceived health risks and the inability to work within this scenario. The research was qualitative, and the WhatsApp cell phone application was essential for maintaining contact with the participants during the most difficult times of the pandemic. The interviews were partially structured and social distancing strictly observed. The COVID-19 pandemic made the interlocutors in this study vulnerable in terms of infection risk as well as economic and social threats. Despite this situation, the social actors continue to keep their hopes alive, maintaining their established agendas and plans.

Keywords: crisis; pandemic; livestock.

 

 

Introdução

O alerta planetário sobre o novo coronavírus (Sars-Cov-2) foi dado em janeiro de 2020, pela Organização Mundial de Saúde (OMS), justamente quando a doença (Covid-19) se espraiou pelo mundo nos corpos de turistas e de outras pessoas de posição social e econômica privilegiada. Se, por um lado, é verdade que a Covid-19 acomete a saúde humana indistintamente, por outro, fatores geopolíticos, econômicos, ecológicos e histórico-culturais determinam a intensidade com que afeta diferentes sociedades, povos e territórios, tornando-os mais ou menos vulneráveis a esse contexto de crise (OLIVEIRA; TIRIBA, 2020). Desse modo, as condições sociais e materiais que recobrem os diferentes atores incidem, categoricamente, na possibilidade destes se defenderem das consequências socioeconômicas e ambientais da doença. 

Vários meses após a identificação do primeiro caso no Brasil, do ponto de vista sanitário, a situação ainda se mostrava absolutamente crítica. À crise sanitária somou-se uma crise econômica vivida, sentida e refletida rigorosamente por variados povos do campo, cujos mundos seguem sendo invisibilizados. Em outra escala, a produção de commodities e os processos de violência a ela associados continuaram a pleno vapor.

Carolina Motoki, jornalista, educadora popular e assessora da “Campanha de Prevenção e Combate ao Trabalho Escravo da Comissão Pastoral da Terra”, em artigo publicado no Le Monde Diplomatique Brasil, asseverou que “é preciso enxergar a violência como sendo sistêmica: ela é necessária para a expansão do agronegócio e dos projetos extrativos”. Essa reflexão é bem ilustrada pelo fato de que, em plena pandemia, a justiça do município de Redenção (sul do estado do Pará) concedia liminar de reintegração de posse das terras em que habitam as 200 famílias onde, “em 2017, nove trabalhadores e uma trabalhadora foram torturados e assassinados por policiais civis e militares na área da fazenda Santa Lúcia, pleiteada pela família Babinski” (MOTOKI, 2020).

 Não fosse a Vara Agrária da cidade de Marabá (sudeste do estado do Pará), que sustou a ordem até que a contaminação do coronavírus tivesse uma solução, tudo teria sido feito em tom de (uma já conhecida) normalidade (MOTOKI, 2020). Juntamente com esse fenômeno, outros estavam acontecendo na(s) Amazônia(s). Um artigo publicado em junho de 2020 assinalou que “enquanto a doença [Covid 19] se alastrava por metrópoles, interior e territórios indígenas, o desmatamento da Amazônia continuou a subir assustadoramente” (PINTO; BERNASCONI; VASCONCELOS, 2020).

Esse quadro é sintomático de que, durante a pandemia, o capitalismo não parou. Por isso mesmo, “afirmar sua parada é como definir uma grande montanha apenas pela sua parte visível e esquecer toda sua base de sustentação” (MALHEIRO; MICHELOTTI; SABINO, 2020, p. 34), a qual é muito expressiva no campo brasileiro, nos processos de concentração de terras, na especulação fundiária e, de modo geral, na privatização de bens comuns (ACSELRAD, 2004, 2009, 2020). O mês de abril de 2020, conforme especificam os autores com base em dados do Ministério da Economia, Indústria, Comércio Exterior e Serviços, “para aqueles que constroem uma violenta economia de exportação de commodities agrícolas e minerais” foi “o melhor mês de abril da história” (MALHEIRO; MICHELOTTI; SABINO, 2020, p. 39, grifo no original). 

No município de São Félix do Xingu, sudeste do estado do Pará, onde esta pesquisa foi ancorada empiricamente, a dinâmica hegemônica da economia é dada pela pecuária. O município, que tem o dobro da área territorial da Holanda, é o campeão em cabeças de gado no Brasil, com cerca de 2,5 milhões (PONTES, 2020). A jornalista Nádia Pontes, em reportagem intitulada “A capital do desmatamento na Amazônia”, assinalou que o gado oriundo da região é destinado tanto para os frigoríficos locais (cerca de cinco) como para outros países e continentes: China, Estados Unidos, Ásia e África.

Nesse contexto, é sabido que parte da dinâmica do desmatamento ilegal resulta, em alguma medida, da abertura de áreas para a pecuária (ROSÁRIO, 2020) e, consequentemente, da grilagem de terras (CASTRO et al., 2017). Na região são recorrentes ações, denúncias e reclamações de que grande parte da área de desmatamento mais recente está situada na Área de Preservação Ambiental Triunfo do Xingu (PONTES, 2020).

Entretanto, imputar essa concepção de desenvolvimento a todos os agentes locais indistintamente seria um equívoco interpretativo. São Félix do Xingu é um espaço geográfico que abriga uma diversidade de formas sociais, pautadas em modos sui generis de relação com o ambiente, ancoradas em modos de vida tradicionais.

Se, conforme ressaltei, o capitalismo não parou, as atividades que se processam nos territórios em que habitam agricultores familiares também não recuaram. Tais atividades continuaram/continuam essenciais para a existência e o abastecimento das famílias produtoras e para o comércio local. As famílias camponesas, a despeito das intempéries – crise sanitária, dificuldades em comercializar seus produtos, dos constantes encarecimentos de itens alimentícios básicos – continuam com os processos organizativos e de trabalho anterior à pandemia, apesar das limitantes impostas pela situação atual.

Para a pesquisa, foram elencados dois grupos sociais. O primeiro é representado por mulheres camponesas organizadas na Associação das Mulheres Produtoras de Polpas de Frutas­ (AMPPF), fundada em 2012. As associadas aproveitam comercialmente as frutas de suas propriedades e, ao mesmo tempo, reforçam a autonomia produtiva e política, o que é feito com os parceiros: a AMPPF é assessorada pela Organização não Governamental Instituto de Manejo de Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora). As mulheres vinculadas à referida associação habitam três vilas rurais de São Félix do Xingu: Maguary, Tancredo e Nereu.

Nessa mesma escala, há outros agentes sociais organizados que mereceram aqui atenção. Refiro-me aos cooperados – agricultores familiares – da Cooperativa Alternativa Mista dos Pequenos Produtores do Alto Xingu (Camppax), que também atravessaram/atravessam os atuais momentos de crise sanitária e econômica. A Camppax foi criada em 2013. As entrevistas apontam a existência de 226 cooperados, embora a cooperativa esteja passando por um processo de recadastramento para avaliar o número exato de cooperados ativos. Estima-se que a quantidade de cooperados orbita entre 180 e 200. A Camppax também é assessorada pela ONG Imaflora e pela Comissão Pastoral da Terra (CPT). O principal produto que recebe dos pequenos produtores[2] é o cacau. Em segundo lugar está a castanha-do-pará, adquirida de agricultores familiares e dos povos indígenas Mebêngôkre-Kayapó; adquire ainda folhas de jaborandi, que estava quase em extinção na região por causa da ação sistemática de madeireiros desde a década de 1990. 

O trabalho está estruturado em seis subtópicos, nos quais  são apresentadas as entrevistas realizadas e o contexto de pesquisa; os impactos na produção e comercialização dos produtos; as categorias (auto)definidoras e a organização política dos interlocutores do estudo; o espaço social e as condições de realização da pesquisa; a crise sanitária como produtora de vulnerabilidade; e a crise sanitária e a reverberação na saúde econômica.

 

Entrevistas realizadas e contexto de pesquisa

Este artigo apresenta os resultados de uma pesquisa realizada em São Félix do Xingu, entre os meses de junho e agosto de 2020, durante o período de isolamento social imposto pela pandemia. Foram conduzidas sete entrevistas com representantes da ONG Imaflora e membros da Associação das Mulheres Produtoras de Polpa de Frutas (AMPPF) e da Cooperativa Alternativa Mista dos Pequenos Produtores do Alto Xingu (Camppax). O objetivo da pesquisa foi caracterizar a relação dos entrevistados com as áreas rurais de São Félix do Xingu, sua organização social e, principalmente, compreender os impactos socioeconômicos da pandemia em suas vidas.

As entrevistas foram conduzidas com cinco mulheres e dois homens. Um dos homens é o presidente da Cooperativa Camppax, um agricultor residente em São Félix do Xingu desde os anos 1980, em uma propriedade rural legalizada. O outro homem é o gerente da ONG Imaflora, que assessora a Camppax, e estava na região desde 2017. Notavelmente, o presidente da Camppax é um agricultor negro, enquanto o gerente da Imaflora é um paulista branco.

Entre as mulheres entrevistadas, uma é assessora de projetos da Imaflora e trabalha diretamente com as mulheres produtoras de polpa de frutas. Ela é negra, chegou à região em 2006, vinda de Minas Gerais. A presidente da AMPPF é uma agricultora que possui terra própria e está na região há 33 anos, vindo do Paraná. Outra entrevistada, M.H., também é moradora da região e reside na vila Tancredo desde 1997, quando se mudou do município de Xinguara. Todas as mulheres iniciaram suas atividades com polpa de frutas em 2012, ano de criação da associação e de consolidação da participação feminina nessa atividade econômica. Muitas delas tiveram que aprender todo o processo de produção da polpa de frutas ao longo desses anos.

A pandemia de Covid-19 trouxe significativos impactos para as comunidades rurais de São Félix do Xingu e afetou de forma expressiva a vida social e econômica dos entrevistados. Durante as entrevistas, emergiu a preocupação com a continuidade das atividades produtivas e as dificuldades de manter o sustento das famílias. O isolamento social e as restrições impostas afetaram diretamente a comercialização dos produtos, impactando a renda dos agricultores e das mulheres produtoras de polpa de frutas.

Especificamente, a comunidade de folheiros, trabalhadores que vivem do extrativismo e não possuem terra própria, também enfrentou desafios durante a pandemia. A restrição de acesso a áreas de coleta, aliada à queda na demanda e nos preços dos produtos coletados, agravou a situação econômica desses trabalhadores.

Além dos desafios econômicos, a pandemia trouxe preocupações com a saúde e bem-estar dos moradores da região. Durante as entrevistas, os impactos psicológicos e emocionais do isolamento social e da incerteza em relação ao futuro foram evidenciados.

A pesquisa realizada com representantes da ONG Imaflora, da AMPPF e da Camppax evidenciou os desafios enfrentados pelas comunidades rurais de São Félix do Xingu durante a pandemia de Covid-19. A dificuldade em manter a atividade econômica e a incerteza em relação ao futuro destacaram-se como pontos centrais das preocupações dos entrevistados. Nesse contexto, compreender as experiências e percepções das mulheres produtoras de polpa de frutas e dos pequenos agricultores é fundamental para desenvolver políticas e ações que possam mitigar os impactos socioeconômicos decorrentes de situações de crise como essa pandemia. Além disso, considerando a diversidade étnica e de origens dos entrevistados, é essencial que as abordagens de apoio e assistência considerem as particularidades e necessidades específicas de cada grupo, buscando promover a inclusão e a sustentabilidade das atividades produtivas no contexto rural de São Félix do Xingu.

Antes da pandemia, o trabalho dos agricultores e agricultoras da Camppax seguia um curso normal, com produção e comercialização de seus produtos, como a polpa de fruta, com a Prefeitura através do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) e com restaurantes locais. Além disso, havia reuniões para trabalhos em grupo e formações, sendo o contato humano essencial para a articulação com as ONGs que os assessoravam.

No entanto, a pandemia trouxe impactos significativos para essa dinâmica. A limitação do contato humano e a ameaça do vírus tornaram impossível a realização de reuniões coletivas, fundamentais para a produção agrícola local. Diante dessa situação, foi necessário criar um protocolo de biossegurança para reunir poucas pessoas (homens e mulheres) com as ONGs, garantindo a continuidade do suporte e assessoria, embora de forma mais restrita.

 

Impactos na produção e comercialização dos produtos

Com a pandemia, os mercados para a polpa de frutas, jaborandi e castanha-do-pará foram prejudicados. A cooperativa Camppax é responsável por comprar e processar esses produtos em sua fábrica própria, o que inclui a retirada da casca da castanha-do-pará e o seu posterior acondicionamento a vácuo. Durante a pandemia, o processo de compra, processamento e comercialização desses produtos sofreu impactos negativos, como destacado pelo senhor R.F.S., presidente da cooperativa.

A redução da demanda por esses produtos e as dificuldades logísticas decorrentes das restrições afetaram diretamente a renda dos agricultores e a continuidade das atividades produtivas. Além disso, o contato limitado com os assessores das ONGs também impactou a produtividade e a organização das atividades agrícolas.

 

A agricultura familiar, a construção social da organização política e o tempo da pandemia

O presente artigo aludiu à categorização dos agentes sociais provocado, sobretudo, pela observância da autoidentificação. Nesse sentido, as denominações agricultoras(es) familiares e pequenos produtores rurais serão amplamente utilizados. Tais distinções, entretanto, não existem sem uma razão histórica e sociológica. O mesmo ocorre com as formas associativas e cooperativistas abordadas no estudo. 

A socióloga Maria de Nazareth Baudel Wanderley assevera que a agricultura familiar é uma denominação genérica a qual remete a uma diversidade de situações concretas. O agricultor familiar, assim considerado, não perdeu suas referências tradicionais camponesas. Ocorre que em um contexto de modernização ele se adapta às novas exigências da sociedade englobante. A agricultura de base familiar seria, então, “aquela em que a família, ao mesmo tempo em que é proprietária dos meios de produção, assume o trabalho no estabelecimento produtivo”[3] (WANDERLEY, 1996, p. 2). Essa relação família-produção-trabalho assume, no tempo e no espaço, uma diversidade de formas sociais, conforme a mencionada autora.

Nesse sentido, o agricultor é o camponês que passou a incorporar tecnologias no processo de produção e, com isso, teve modificada a estrutura tradicional de produção. Tradicionalmente, o camponês organiza as múltiplas dimensões da vida a partir dos seus conhecimentos ancestrais e experiências cotidianas. Entretanto, “a modernização o transforma num agricultor, profissão, sem dúvida, multidimensional, mas que pode ser apreendida em escalas especializadas e com os especialistas dos serviços técnicos de assistência técnica” (WANDERLEY, 2003, p. 46). No universo da agricultura familiar, cresce a importância dos serviços de assistência técnica gerados fora da comunidade local.[4]

Wanderley (2003, p. 47) ressalta o debate que há entre diversos autores sobre a existência de uma possível ruptura entre o campesinato (tradicional) e o agricultor (moderno). Ela, entretanto, busca equalizar a situação controversa ao defender a hipótese de que “teríamos que considerar, simultaneamente, pontos de ruptura e elementos de continuidade entre as duas categorias sociais”.

Assim, tem-se o reconhecimento de que o agricultor familiar é portador de uma ontologia específica. O seu ser social comporta, nesse caso, as referências do mundo moderno e, ao mesmo tempo, as referências do camponês tradicional. Em todo caso, o que torna os agricultores familiares “construtores e parceiros de um projeto de sociedade – e não simplesmente objetos de intervenção do Estado, sem história – é precisamente a dupla referência à continuidade e à ruptura” (WANDERLEY, 2003, p. 47).

No Brasil, os anos 1990 foram bastante representativos para a agricultura familiar, porque marcaram o início “de um conjunto de transformações sociais, econômicas e políticas, que vão criar espaço e condições favoráveis à emergência, legitimação e consolidação da [expressão] agricultura familiar no Brasil” (SCHNEIDER; CASSOL, 2013, p. 9). O agricultor familiar/camponês, mesmo em condições sociais e históricas difíceis, não se furta à busca pela construção de “sua própria história nesse emaranhado campo de forças que vem a ser a agricultura e o meio rural inseridos em uma sociedade moderna” (WANDERLEY, 2003, p. 58). A agência na construção da própria história pode ser percebida quando se depara com a organização política dos camponeses com os quais se trabalhou em São Félix do Xingu – PA.

Há muito se discute que os sujeitos pertencentes às diversas sociedades subalternizadas do globo terrestre possuem historicidades, ordem culturais, sociais, econômicas, ecológicas e cosmológicas muito próprias (WOLF, 2005). Tais análises relativizaram as narrativas e formulações coloniais, que insistiam em considerar essas sociedades como desprovidas de “experiência em construir seu próprio modo de vida” ou que as suas histórias tivessem iniciado quando agentes externos passaram a surgir diante delas (SAHLINS, 2007, p. 534).

De acordo com Andrade e Alves (2013), o cooperativismo desponta como uma espécie de opção para a resolução de vários problemas enfrentados pelos atores sociais que assim se organizam. A ideia é que, desse modo, haja uma contribuição para o fortalecimento das atividades produtivas, bem como uma inserção mais participativa e positiva nos circuitos econômicos. Além de organizar a capacidade e o espaço da produção, no caso de agricultores familiares, espera-se que as cooperativas contribuam no sentido de promover vantagens aos produtos da agricultura familiar e, com isso, fortalecer os seus territórios (ANDRADE; ALVES, 2013).

No caso da Associação das Mulheres Produtoras de Polpa de Frutas (AMPPF), a intenção é de expandir e integrar outras famílias da região de São Félix do Xingu. Hoje, a associação conta com 16 famílias associadas. O número é pequeno, se for considerada a imensidão territorial do município e a existência de muitas outras famílias.

De todo modo, “demanda a gente tem”, afirma a analista de projetos da ONG Imaflora. Enumerando as possibilidades, diz ela,

a gente tem famílias da Casa Familiar Rural que querem se associar. Já fomos provocados por pessoas lá da [vila] Nova Vida, tem a parceria com a CPT com possibilidade de fazer algum trabalho com aquela região de Lindoeste, Sudoeste [assentamentos muito distantes da cidade]. A dona L. quer mobilizar famílias da [vila] Santa Rosa. (Entrevista concedida por C.G.O, 2020)

Esse era o curso ordinário dos acontecimentos e do planejamento, até o início da pandemia. Entretanto, as animadas intenções tiveram um freio significativo e ficaram comprometidas, no ano de 2020. A explicação é esta: “a gente ainda não teve possibilidade de continuar por causa da Covid-19. Fica difícil marcar reunião, ir a campo, né? Mas essa é a expectativa: a de que a gente aumente para 50 famílias” (Entrevista concedida por C.G.O., 2020). Os planos interrompidos também reverberam na Cooperativa Alternativa Mista dos Pequenos Produtores do Alto Xingu (Camppax), assunto abordado adiante.

Ao ser questionado sobre qual comprometimento a atividade da ONG Imaflora sofreu no contexto da pandemia, e que repercutiu também na Camppax, o assistente de projetos da referida ONG, V. F., destacou que a perda principal aconteceu na oferta dos serviços às famílias de agricultores que vendem seus produtos para a cooperativa. Em janeiro, “que é um mês meio parado, e em fevereiro já começam as atividades, a gente conseguiu fazer uns mutirões, só que em março parou”, destacou ele.

Mesmo que as atividades desenvolvidas sejam coletivas, por meio de mutirões, o pouco tempo não permitiu que elas fossem suficientemente realizadas. “São bastantes frentes”, detalha o interlocutor, “adubação, curso de cacau, sistema agroflorestal, entrelinhas, manejo de entrelinhas, beneficiamento, gestão de sítios, gestão das organizações sociais, mercado” (Entrevista concedida por V.F., 2020).

 

O espaço social e as condições para a interlocução

A frente de expansão impulsionadora da ocupação do município de São Félix do Xingu, região sudeste do estado do Pará, por grupos não indígenas esteve intimamente conectada à chegada de migrantes na região de Marabá, nos anos de 1970 (CASTRO; MONTEIRO; CASTRO, 2004). Estes recém-chegados adentraram municípios como Xinguara e Redenção e foram abrindo novas áreas rumo ao município de São Félix do Xingu.

Passou a haver, nesse período, a coexistência entre uma diversidade de atores sociais, notadamente grandes e médios empresários da madeira e da pecuária, pequenos produtores cuja existência material orbitava em torno do uso necessário da mão de obra familiar e da articulação da pecuária com a agricultura; também havia aqueles que possuíam grandes propriedades e não dependiam de mão de obra familiar; existiam as comunidades ribeirinhas situadas próximas das margens dos rios e várias áreas indígenas, nomeadamente as dos povos Mebêngokrê-Kayapó (ESCADA et al., 2005). 

A presença dessa diversidade de atores é algo contemporâneo e caracteriza, inclusive, a região. É o caso da vila Taboca, distante 97 km da cidade de São Félix do Xingu. Esta é uma daquelas localidades em que é perceptível a coexistência de múltiplas atividades econômicas. É o caso do garimpo artesanal de cassiterita, monazita e (em menor escala) de ouro. Ainda há pessoas que retiram e comercializam madeira de forma ilegal e famílias que vivem da agricultura, mas sem o abandono total da pecuária. A vila foi formada em função desse amálgama de atividades. Localmente, a retirada de madeiras, como a castanheira, não parece ser encarada como infração. Na vila, existe até uma pequena marcenaria que beneficia a madeira retirada e emprega umas poucas pessoas. Em estudo nessa região, Escada et al. (2005) observaram fenômeno similar, em que os pequenos colonos interlocutores de sua pesquisa afirmaram que não são criminosos por executarem queimadas nas terras (devolutas) em que ocupavam. Alegavam apenas que estariam ali tentando tirar o sustento, haja vista que o Estado não lhes dava alternativas de sobrevivência.

Na década de 1980, a mineradora Taboca se instalou na referida vila. Nesse período, uma madeireira denominada “Perachi” também se instalou nos arredores, incentivando ainda mais o povoamento a partir de suas atividades. As famílias que foram morar nos arredores, mas que viviam da atividade agrícola, vendiam a sua produção para os funcionários da empresa que residiam em casas construídas pela própria mineradora.

O resultado dessa dinâmica deu-se da seguinte maneira: “após a desativação da mineradora Taboca nos anos 1990, a vila construída no ‘meio do nada’, com infraestrutura para servir exclusivamente aos funcionários da empresa, foi invadida por famílias de colonos” (KAWAGE, 2002, p. 71, grifo do original). Cedendo à pressão dos ocupantes, nasce o então povoado, cuja população é estimada atualmente em cerca de 20.000 habitantes.

Na região de São Félix do Xingu, “o pecuarista chegou ao mesmo tempo que as empresas de mineração de cassiterita e o garimpo de ouro, com a chegada de novos grupos atraídos pela exploração da folha de jaborandi” (CASTRO; MONTEIRO; CASTRO, 2004, p. 7). O (des)encontro de agentes com historicidades distintas, nessa região de fronteira (MARTINS, 2009), e portadores de diferentes formas não só de apropriação, mas também de significação do mundo material (ACSELRAD, 2004), resulta até hoje em conflitos socioambientais.

Essa diversidade social expressiva remete a manifestações já referidas pelo antropólogo Paul Little. Com razão afirma que “a imensa diversidade sociocultural do Brasil é acompanhada de uma extraordinária diversidade fundiária” (LITTLE, 2004, p 251). As múltiplas formas de relação com o ambiente geográfico delineiam a territorialidade, a qual consiste no “esforço coletivo de um grupo social para ocupar, usar, controlar e se identificar com uma parcela específica de seu ambiente biofísico, convertendo-a assim em seu território” (p. 253).

Com o passar do tempo, e em função das denúncias de diversos setores sociais, ficou cada vez mais patente que a devastação da floresta e da complexidade de seus ecossistemas, em São Félix do Xingu, produzia efeitos deletérios sobre as sociedades indígenas e comunidades tradicionais, possuidoras de saberes específicos sobre esses ecossistemas e que, em função disso, corriam sérios riscos. 

No limiar dos anos 2000, Castro, Monteiro e Castro (2004) registraram o risco de perda da possibilidade de continuidade das atividades extrativistas, como castanha-do-pará, frutas e raízes, plantas medicinais, entre outras, em função do avanço do desmatamento e, sobretudo, em virtude do padrão dominante de ocupação dos espaços ainda preservados ser a instalação de grandes fazendas.

Um desdobramento dessas atividades, cujo passivo ambiental atinge fortemente os grupos não hegemônicos, pode ser percebido a partir dos dados apontados pelo Inpe (2019). Eles ressaltam que o estado do Pará contribuiu com 34% (148.399 km²) do desmatamento total da Amazônia Legal, no período de 1988 até o ano de 2018. Nesse cenário, o município com maior índice de desmatamento foi São Félix do Xingu – com 18.440 km² – de 2000 a 2015.

 

Figura 1 – Localização do município de São Félix do Xingu

 

Fonte: SIRGAS, 2000.

 

Foi, portanto, no interior dessa realidade socioespacial, com todas as suas complexidades, que esta pesquisa se desenvolveu. O enfoque foi dado aos agentes sociais cuja preocupação com a produção material da vida não está descolada de preocupações com as chamadas questões ambientais. Conforme mencionado na introdução, a pesquisa foi feita com agricultores e agricultoras familiares da região. Estes encaminham práticas variadas de produção, sendo o extrativismo uma prática muito valorizada. Além disso, há uma preocupação crescente com uma produção orgânica, sobretudo de cacau, polpa de frutas e outros.

As entrevistas demonstram que a ordenação das atividades produtivas dessas famílias foi mudando ao longo do tempo, na medida em que elas foram se articulando a organizações como a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e a Associação para o Desenvolvimento da Agricultura Familiar do Alto Xingu (Adafax). A analista de projetos da ONG Imaflora, que assessora esses agentes sociais desde o ano de 2006, quando ainda trabalhava na Adafax, considera que “o carro-chefe dessas famílias sempre foi a pecuária. Quando a gente começa, a Adafax vem com um trabalho iniciado pela CPT. Então, A CPT aqui em São Félix já tinha essa animação, esse trabalho para diversificar com o cacau” (Entrevista concedida por C.G.O., 2020).

Esse padrão de produção, centrado quase que exclusivamente na pecuária, foi se diversificando conforme o passar do tempo e as articulações com diversas instâncias, dentre elas a CPT, as associações locais, a Secretaria de Estado de Agricultura (Sagri) e as ONGs. O fato é que as famílias tinham a produtividade assentada na pecuária e depois surgiu a possibilidade de plantarem cacau. Nesse processo, conforme referiu a interlocutora, “ao invés de ser a pecuária em primeiro plano, e o cacau em segundo, o cacau passa a ser em primeiro e a pecuária em segundo” (Entrevista concedida por C.G.O., 2020).

Um fato importante é que não estava em discussão o fim da possibilidade de criar gado. Ao contrário, havia um respeito pelo modo de vida das famílias camponesas, em que a diversidade de culturas já fazia parte da vida social. Por isso,

a Adafax, além do cacau e além da pecuária, trabalhou muito na linha da diversificação da produção: com pequenos animais, polpas de fruta, horta. Quando a gente criou a AMPPF, essas famílias já eram famílias vindas de um trabalho com a Adafax. Já eram famílias bem dispostas a mudar, a reverter essa situação. (Entrevista concedida por C.G.O., 2020)

Há famílias que fizeram essa travessia econômica deixando de criar gado para pôr na ordem de prioridades a produção de cacau e de outras árvores frutíferas. É o caso da dona M.J.N., vinculada à AMPPF. Ela é migrante (veio do estado do Paraná) e mora na região há 33 anos. Já chegou a trabalhar com o gado e, na antiga propriedade, também plantava cacau. Morava entre grandes fazendas. Aconteceu, certa vez, da sua roça de cacau ser queimada. Não se sabe explicar quem o fez nem a razão. O testemunho deu-se nos termos a seguir. “Perdemos tudo. Meu marido quase perdeu a cabeça e falou que não ia plantar mais nada pra lá, porque a gente morava no meio de várias fazendas. E aí o fogo, naquela época, queimou tudo” (Entrevista concedida por M.J.N., 2020). O fato, de acordo com ela, ocorreu há dez anos. Esse período é correspondente ao tempo em que a vida se rearranjou. Assim, ressalta a interlocutora,

vendemos a terra lá e compramos a terra aqui. Só que lá, na época, nós vendemos 18 alqueires e compramos só dois alqueires e meio, e é onde nós moramos hoje. Aí nós decidimos não mexer com o gado (...). E aí acabamos com o gado e ficamos mexendo só com o cacau.

Em 2012, a família ingressa na AMPPF para trabalhar também com a comercialização das polpas das frutas dos seus quintais.

A organização da vida produtiva nos termos colocados anteriormente tem sinergia com o que o escritor Eduardo Galeano disse, ao prefaciar a edição brasileira do livro As veias abertas da América Latina. Naquela ocasião, o pensador latino-americano fez referência à produção baseada na monocultura como sendo uma “prisão”, ao passo que a diversidade produtiva foi assemelhada à liberdade, porque seria ela quem nos defenderia “dos mortíferos golpes da cotação internacional, que oferece pão para hoje e fome para amanhã” (GALEANO, 2015, p. 7). As palavras de Eduardo Galeano são bastante assertivas, em virtude de aludir que: “A autodeterminação começa pela boca” (GALEANO, 2015).

As reflexões postas até aqui, antecedem, contextualizam e ambientam o que era importante que fosse dito sobre a organização metodológica deste artigo. Falam, por conseguinte, de como foi possível materializar os dados para compor este artigo. Um primeiro elemento a ressaltar é que estes escritos refletem as condições sanitárias impostas pela situação da pandemia, no período em que as entrevistas foram conduzidas. Assim, os instrumentos usuais de coleta de dados – o partilhar das vivências com os interlocutores e suas dinâmicas cotidianas, tão caro às ciências sociais – tiveram que ser rearranjados.

A antropóloga Rosana Guber considera o trabalho de campo importante por abrir possibilidades para o pesquisador compreender, na interação com os interlocutores, “el sentido que éstos le dan al encuentro” (GUBER, 2011, p. 59). Assim, as produções textuais resultantes desse encontro são sempre construções “a partir de interlocuções” (NEVES, 2007, p. 33). Diante da impossibilidade do “encontro etnográfico” (PEIRANO, 1986) nos moldes ordinários, lançou-se mão de um aporte tecnológico que estava sendo muito utilizado pelas agricultoras e agricultores, nos tempos de pouco contato pessoal, ou seja, às conexões e conversas pelo WhatsApp.

Antes de principiar qualquer diálogo com as agricultoras e agricultores houve uma conversa com mediadores, em especial da Comissão Pastoral da Terra e da ONG Imaflora. O trabalho na Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (Unifesspa) possibilitou conhecer pessoas ligadas a essas entidades e, a partir delas, foi feita a interlocução – como uma rede virtual – necessária à pesquisa. Outro fator a considerar é que, quanto mais ocorre o afastamento da cidade de São Félix do Xingu em direção à área rural, menos possibilidades de cobertura telefônica existem. Por outro lado, mesmo em algumas áreas onde não tem rede telefônica, há redes de internet.

Boa parte das interlocutoras e interlocutores da pesquisa têm acesso à internet em suas propriedades. Não apenas acessam a internet, como também lhe conferem um uso político. Nessa pandemia, a tesoureira da AMPPF ressalta a importância de acessar o WhatsApp, nos marcos da organização social e em tempos de pandemia. Em seus próprios termos, “devagar, a gente vai se atualizando. Hoje, já é bom porque tem WhatsApp, a gente se comunica. Esses tempos atrás era mais difícil, mas agora pelo menos tem WhatsApp para manter a gente organizadas” (Entrevista concedida por M.J.N., 2020).

De todo modo, a pesquisa se beneficiou do uso que as agricultoras já estavam fazendo dessa ferramenta. A partir dela, a interlocução foi possível. Esse contato, por outro lado, mostrou-se permanente, haja vista que a conexão continuou e, por diversas vezes, a conversa foi retomada, as dúvidas foram esclarecidas, e houve atualização sobre os últimos acontecimentos relacionados à condição social dos(as) interlocutores(as).

De qualquer forma, o uso do WhatsApp também demonstrou que os agricultores e agricultoras calculavam/calculam os riscos do contato pessoal, no cenário pandêmico. Isto é o que apontou a tesoureira da AMPPF: “A gente sempre fala que na nossa associação, todo mês, nós tinha a nossa reunião. Aí, com o negócio da pandemia, nós nos distanciamos, porque não estava podendo” (Entrevista concedida por M.J.N., 2020).

As reflexões sobre o risco à saúde, a partir do contato interpessoal, também foram registradas pelo assistente de projetos da ONG Imflora. Com a pandemia, as visitas de campo ficaram prejudicadas. Por isso, eles elaboraram o que foi denominado de “Protocolo de Biossegurança”, prevendo uso normativo de máscaras, autorização do proprietário, não aglomeração, dentre outras coisas.

Porém,

alguns não aceitaram a nossa visita: “Ah não, vocês estão na rua”. A gente tem que concordar: “você está certo, é isso aí mesmo”. Isso eu achei interessante por parte dos agricultores. Achei que teriam menos agricultores assim, mas até que não. Não vêm para a cidade, mesmo que seja para entregar cacau, pedem para alguém trazer. Isso está acontecendo bastante. (Entrevista concedida por V.F., 2020)

Esse é, portanto, o cenário que demarcou os caminhos metodológicos, bem como as ferramentas de interlocução e pesquisa, no presente contexto.

 

A crise sanitária e a produção da vulnerabilidade para as associadas da AMPPF 

A associação de Mulheres Produtoras de Frutas (AMPPF) foi criada em 3 de março de 2012 e congrega famílias de três comunidades do município de São Félix do Xingu – Xadá, Maguary e Tancredo Neves. O livro Adequação ambiental e políticas públicas para a agricultura familiar do Alto Xingu, organizado pela Associação para o Desenvolvimento da Agricultura Familiar do Alto Xingu (Adafax), conta um pouco dessa história.

Destaca, dentre outras coisas, que o surgimento da AMPPF se deve à “percepção da falta de aproveitamento das frutas produzidas nos lotes de alguns agricultores” (OLIVEIRA et al., 2013, p. 29). Houve, a partir de então, um diálogo com os agricultores e agricultoras familiares para firmar o interesse em criar a associação e, nesse mesmo processo, fez-se um estudo de mercado para saber das potencialidades comerciais, preferências de sabores e cotação de valores.

Esse diálogo, de acordo com a analista de projetos da ONG Imaflora que nessa época prestava assessoria para a Adafax, não foi obra do acaso, mas sim fruto de provocações das pessoas interessadas. É o caso da dona Maria da Conceição – dona Diomar, como era conhecida – que, individualmente, já vinha construindo experiências de aproveitamento de frutas em seu lote, apesar das limitações com relação à falta de eletricidade. Ela morava na comunidade Maguary e, vendo a necessidade de dar uma finalidade econômica às frutas, sentiu que haveria de ter uma articulação coletiva para comercializar os seus derivados. Esse processo foi e tem sido fundamental em termos da emancipação não apenas produtiva, mas também política e social.

Nessa época já existia um desejo das mulheres de aproveitar todo o excesso que tem de produção de frutas nas propriedades. Nisso, a Adafax começou a conversar com uma e conversar com outra, se elas tinham interesse. Na verdade, o interesse partiu de uma senhora chamada dona Diomar. (...) Dona Diomar faleceu, mas desde de 2011 ela já falava: “olha, vocês da Adafax podiam fazer um apoio, a gente tem tanta fruta que poderia processar”. Ela já fazia alguns ensaios na propriedade dela. Porque, lá não tinha energia elétrica. Então, esse era um grande gargalo a ser superado. E aí ela começou a conversar com a Adafax: “o que vocês podem fazer pra ajudar a gente?”. E aí ela foi se reunindo com as vizinhas, porque lá a casa de todo mundo é de parentes, na colônia lá. É uma colônia pequena, Maguary, e todas elas demonstraram interesse. (Entrevista concedida por C.G.O., julho de 2020)

O ponto é que o resultado desse debate foi positivo. Avaliou-se a existência de um mercado e, em função disso, soube-se que os agricultores e agricultoras das três regiões poderiam destinar seus produtos ao comércio institucional e, concomitantemente, já poderiam ir pensando na possibilidade de ampliar a diversidade do que seria produzido ulteriormente. Do início até os dias atuais o mercado institucional é quem absorve grande parte das polpas produzidas. Nesse sentido, a comercialização de peso ocorria com o Programa Nacional de Alimentação Escolar – Pnae. 

A Lei no 11.947,[5] de 16 de junho de 2009, determina que no mínimo 30% do valor repassado a estados, municípios e Distrito Federal pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) devem ser utilizados obrigatoriamente na compra de gêneros alimentícios provenientes da agricultura familiar. É esse mercado institucional que tem sido a salvaguarda, por assim dizer, das mulheres produtoras de frutas organizadas na AMPPF.

Mesmo a lei existindo, o acordo para a comercialização não foi pacífico. A Prefeitura do município de São Félix do Xingu precisou ser interpelada e avisada de que comprar das agricultoras não era conceder-lhes favor, mas sim respeitar um direito que estava em vigor.

A gente discutiu com a prefeitura, até então a prefeitura não comprava a merenda escolar delas. Então foi uma briga boa, com a prefeitura, com secretária de dizer que esse programa não era favor da prefeitura, nem do governo, era um direito dos agricultores familiares e elas conseguiram comercializar. (Entrevista concedida por C.G.O., julho de 2020)

Em 2013, ano da publicação do já mencionado livro Adequação ambiental e políticas públicas para a agricultura familiar do Alto Xingu, tinha-se um diagnóstico de que a AMPPF havia conseguido uma capacidade organizacional muito importante. Isso graças à “tomada de decisão, de definição de papeis, e governança autônoma”. Aliado a esse aspecto, há o fato de que seus membros já eram sócios de outras entidades organizativas. Mais ainda, está dito que o “que diferencia a AMPPF dos demais é a mentalidade objetiva da mudança de paradigmas em relação às alternativas produtivas sustentáveis” (OLIVEIRA et al., 2013, p. 30).

Para as mulheres da AMPPF, a situação imposta pela pandemia impactou, sobremaneira, a continuidade das atividades. A comercialização pelo Pnae, por exemplo, ficou prejudicada em 2020. Desde o início daquele ano o quadro foi se agravando. É o que ressalta a tesoureira da AMPPF, referindo-se à situação dizendo que “nós estamos paradas. Nós só conseguimos fazer duas entregas no mês de março. Logo veio a pandemia e acabou, está tudo parado, e esse foi um impacto grande para nós”. Ou seja, sem aulas na rede municipal, a Prefeitura achou por bem não continuar comprando os produtos das agricultoras.

O caso é que “como elas entregam diretamente para a merenda escolar, a prefeitura está alegando que não tem aula e então não tem porque comprar”, ressalta a analista de projetos da Imaflora. Porém, a Prefeitura começou a comprar sextas básicas (os kits) e a doar para as famílias dos estudantes que estavam necessitadas, em razão de medidas legais.[6] Eis, então, um novo desajuste, pois

a Prefeitura está fazendo esse kit, essa sexta, com produtos tradicionais”, isto é, “produtos de mercado mesmo, arroz que compra em pacote, feijão e não estão entregando os produtos da agricultura familiar”. A alegação, diz ela, é a de que a “polpa de fruta não entra como alimento essencial. (Entrevista concedida por M.J.N, 2020)

Em função disso, as mulheres pediram um posicionamento da Prefeitura sobre esse modo de proceder. Enquanto aguardavam, foram sobrevivendo do jeito que podiam. Dona M., uma das associadas que vive às margens do rio Xingu, falou comigo muito rapidamente, em função do acesso à internet e de sinal de celular precários. E também pelo fato de que o seu confinamento estava sendo na propriedade recém-adquirida.

Ela destacou que estava sobrevivendo graças ao auxílio emergencial,[7] no valor de 600 reais, que recebia do governo federal. Por outro lado, diz a interlocutora, “não recebemos nada do governo estadual”. A tesoureira da AMPPF explicou a situação vivida: “da nossa associação, tem mulheres que receberam o auxílio. Tem outras pessoas também que não tem Bolsa Família que receberam o auxílio”. O auxílio, de acordo com ela, tinha sido a única renda do governo.

As associadas tentaram concorrer a um edital aberto pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) que incentiva a compra de produtos da Agricultura Familiar (PAA). Foi uma tentativa não exitosa, por assim dizer. M.J.O. assinala que “não tivemos outra renda. Nós até tentamos entrar na Conab, PAA estadual, mas ficamos entre os 50, mas nós não conseguimos chegar a entregar pelo PAA/Conab”. Ela finaliza dizendo que estão sobrevivendo “só mesmo com o auxílio. Quase todas as mulheres têm o Bolsa Família” (Entrevista concedida por M.J.N., 2020).

Na sequência da conversa, dona M.J.N. ressaltou que foi muito bom receber o auxílio. Boa parte das mulheres receberam até 1.200 reais. Àquela altura da conversa estimava-se que teriam direito, no segundo semestre de 2020, a receber apenas 600 reais, dada a redução dos valores. Para dona M.J.N., a despeito de receberem o auxílio, ainda continuaria a existir um desbalanceamento, pois “o auxílio abaixa e as coisas sobem, porque, agora a complicação não vai ser o auxílio, vai ser a condição dos mantimentos que a pessoa compra, que não tem no campo e tem que comprar. E caro, que está ficando caro, então vai ser uma polêmica”.

 

A Camppax entre a crise sanitária e a saúde econômica

A Cooperativa Alternativa Mista dos Pequenos Produtores do Alto Xingu (Camppax), assim como a AMPPF, também não atravessou incólume a situação posta pelo contexto pandêmico. Ela adquire dos agricultores familiares a castanha-do-pará, o cacau e a folha do jaborandi. Esse produto, conforme revelam os dados da pesquisa, já estava em queda durante os últimos três anos, em função da dificuldade em comercializá-lo de forma certificada no mercado. É um produto caro.  

Na década de 1990, a cadeia do jaborandi era controlada pelos grupos econômicos que detinham maior força. O senhor R.F.S. assinalou que “na época quem dominava mais não era a agricultura familiar”, porque “quem tinha mais bagagem, mais valentia adquiria as áreas”. Tais pessoas eram conhecidas como “gatos” e, para explorar o jaborandi, contratavam mão de obra local – os chamados “folheiros”. 

Analisando essa relação a partir de suas memórias considerou ambientalmente descuidado o modo como a exploração da matéria-prima aconteceu. Em seus próprios termos, “não cuidaram da questão ambiental, de zelar pelo produto” e “chegou o momento de ser suspenso”.

Os antigos “folheiros”, outrora subordinados aos “gatos”, mais recentemente retomaram o extrativismo desse produto e passaram a ser cooperados. Com isso, retiram a folha do jaborandi observando os critérios ambientais necessários. Embora a cooperativa trabalhe com esse produto, “a produção ainda é pouca de acordo com a procura que tem”, observa o senhor R.F.S. Consoante a sua narrativa, as folhas de jaborandi são coletadas em terras particulares, pois “os que tiram folhas não têm terra”. Eles fazem a coleta nas terras de fazendeiros e pagam uma porcentagem do lucro para os proprietários. A norma criada pela cooperativa assinala que 10% do lucro do extrativista deve ser destinado ao proprietário da terra.

Esse é um processo não apenas para evitar o extrativismo ilegal e problemas de degradação ambiental. É também para tentar gerenciar e amortecer eventuais conflitos. 

Hoje não tem problema de conflito. O cara, ele próprio, vai lá e negocia. A gente faz um cadastro e nesse cadastro a gente tem um controle de onde o cara tá, o acampamento em que ele tá. E aí tem os técnicos daqui que tá dando esse suporte, vai lá e vê a área. Por exemplo, ele trabalhou esse ano e no próximo ano ele não vai mais trabalhar naquela área. Ela vai recuperar. Ela também precisa da semente, de reproduzir a semente para tá repovoando. (Entrevista concedida pelo senhor R.F.S. em 2020)

A compra desse produto pela cooperativa é fruto da demanda, sobretudo, da empresa Centroflora,[8] que também exige um compromisso ambiental dos extrativistas. Em todo caso, o jaborandi não chega à cooperativa em volumes próximos aos do cacau e da castanha-do-pará. Contudo, há ainda muitos agricultores desconhecedores da importância da cooperativa e, em função disso, depositam a produção nas mãos dos chamados “atravessadores”.

Hoje tem muitos concorrentes, os atravessadores, que querem tirar de linha a própria cooperativa e ficar livre do negócio. (...) A maioria deles [agricultores] não sabe a importância de ter a cooperativa. Mas já tem um bom número, e esse número a gente vem acreditando. E hoje tem uma demanda de produção e a gente precisa trabalhar ela com qualidade. (Entrevista concedida pelo senhor R.F.S. em 2020)

A despeito das tantas dificuldades, o vislumbre por um futuro mais próspero ainda é mantido: “A gente pensa em trabalhar também os outros produtos, mas aí veio essa questão [pandemia]. ... Hoje a gente precisa de mais estrutura”, assinalou o senhor R.F.S.

A pandemia, nesse sentido, produziu para os cooperados não apenas riscos à saúde física, mas também a sua saúde econômica. É o que pode ser exemplificado a partir do beneficiamento da castanha-do-pará. A castanha-do-pará que chega à Camppax é oriunda do município de São Félix do Xingu, de áreas pertencentes à agricultura familiar e, principalmente, das Terras Indígenas (TI) onde residem os povos Mebêngôkre-Kayapó.

A pandemia afetou intensamente a comercialização do produto. Nesse cenário, a fábrica teve que ficar fechada, por causa da lei que proibiu a aglomeração. Como são mais de dez funcionários – e é necessária uma quantidade superior a dez funcionários para funcionar –, ela ficou parada. Ou seja,

a cooperativa só fez um estoque de castanha in natura, comprou castanha in natura, quando foi ligar as máquinas, deu um problema na eletricidade. Beleza, não tinha ainda a lei. E aí foi comprando, comprando e quando arrumou o transformador, veio a lei. (Entrevista concedida por V.F., 2020)

Em decorrência da pandemia, houve um gasto de dinheiro para estocar a castanha in natura, porém, a fábrica não pôde funcionar. O fato é que “isso deu um baque grande na cooperativa, tanto que não tem castanha nova para vender. Só tem castanha in natura. Aí ferrou, porque tinha gente esperando comprar, como todo ano tem clientes que compram de São Paulo” (Entrevista concedida por V.F., 2020).

As frentes de agravos à saúde econômica são intensamente retomadas nas narrativas dos interlocutores e interlocutoras. Os problemas já mencionados se somaram a outros. O senhor R.F.S. assinala o prejuízo a partir de dois principais fatores: a interrupção do planejamento e a rescisão do contrato dos trabalhadores. Assim, diz ele, “um é que a gente tinha um planejamento e não podemos cumprir pelo que estava sendo projetado, que é a implantação da nossa indústria, que era pra ser concluída e não foi concluída”. Sem poder dar continuidade às ações propostas e ao trabalho na fábrica de beneficiamento de castanha-do-pará, a situação se complexificou.

Em decorrência disso, a gente teve que rescindir o contrato de todo mundo. Até hoje não voltou ainda. As vezes volta uma semana, duas semanas só pra atender o mercado local e suspende as atividades”, destacou o senhor R.F.S. A cooperativa também ficou sem poder adquirir a produção de muitos cooperados, haja vista a diminuição de seu poder de compra. O cacau foi o único produto que ainda manteve a comercialização. Os contratos firmados antes da pandemia com as empresas compradoras foram mantidos e os pequenos produtores puderam dar continuidade à produção e a cooperativa assegurar a circulação do produto. Os outros produtos não tiveram a mesma sorte. Portanto, o efeito à saúde econômica tendeu a se projetar, inevitavelmente, sobre a agricultura familiar local.

O agricultor familiar, nessa pandemia, se viu impelido a permanecer em seu território. Isso aconteceu quando passou a conceber as atuais condições sanitárias como muito graves. Porém, não interrompeu as suas atividades. Quando questionado sobre como os agricultores compreenderam as atitudes exigidas pelo cenário da pandemia, o senhor R.F.S. destacou que, inicialmente, “eles tiveram muita dúvida. Só deram fé mesmo porque deu um impacto no financeiro”, ocorrido quando a cooperativa chamou a atenção para as dificuldades de comprar os seus produtos à vista.

Em todo caso, a produção nos territórios camponeses não parou, porque “o trabalhador já tem o hábito de amanhecer o dia e ele fazer o que deve fazer, chovendo ou fazendo sol, com algum problema, dor na coluna ele vai fazer”, afirmou o interlocutor, ao assinalar que também age dessa forma em sua terra.

 

Considerações finais

O presente trabalho analisou o modo como agricultores e agricultoras familiares cooperados e associados do município de São Félix do Xingu (PA) percebem os riscos à saúde e à perda das condições de trabalho em face do atual contexto de pandemia e de pecuarização. A interlocução para a pesquisa ocorreu com atores sociais vinculados à Associação das Mulheres Produtoras de Polpas de Frutas (AMPPF) e à Cooperativa Alternativa Mista dos Pequenos Produtores do Alto Xingu (Camppax).

A pesquisa, naquela situação, precisou ser articulada de modo a garantir o distanciamento físico. A pandemia, apesar de todas as problemáticas que trouxe, direcionou agricultores e agricultoras para o diálogo por meio do WhatsApp. Esta ferramenta digital foi mobilizada para debater os problemas e manter o contato entre associadas e cooperados. Portanto, está aí contido um uso político.

O processo de interlocução, apesar de ocorrido por meio do WhatsApp, possibilitou a obtenção de materiais importantes para a análise. Por meio dos diálogos pôde-se perceber, concretamente a partir dos testemunhos, como a região de São Félix do Xingu é habitada por uma heterogeneidade de atores sociais, com suas formas diversas de utilização e significação do mundo material. O desencontro entre elas influencia, sobremaneira, a emergência dos conflitos sociais (ACSELRAD, 2004).

A pandemia veio a somar com situações preexistentes, produzindo agravos significativos à saúde física e financeira dos pequenos produtores. Tanto as mulheres associadas na AMPPF quanto os cooperados da Camppax presenciaram uma retração do mercado para os seus produtos.

A percepção dos interlocutores da pesquisa, portanto, remete às dificuldades existentes antes da pandemia nos marcos dos conflitos com o latifúndio. A crise sanitária e econômica provocada pela Covid-19, como se nota, criou um problema no interior de uma realidade já problemática. De todo modo, e apesar de tudo, os agricultores e agricultoras familiares, durante todo o processo de pesquisa, deixaram evidente que continuavam o trabalho ordinário. Além disso, sempre reforçaram a possibilidade de fortalecer a AMPPF e a Camppax, a partir da acolhida de novas iniciativas, pessoas, e projetos futuros.

 

Agradecimentos

Esta pesquisa é fruto do projeto “Construção de movimentos sociais e capacidade das comunidades para defender seus direitos ameaçados pelas empresas de mineração no Brasil”, financiado pela Fundação Ford e coordenado pelo professor Dr. Henri Acselrad (IPPUR/UFRJ), a quem o autor agradece o apoio.

 

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Como citar

SILVA, Cristiano Bento da. Situações de emergência no sudeste do Pará: a sobrevivência econômica e social de duas organizações camponesas em tempos de pandemia e pecuarização. Estudos Sociedade e Agricultura, Rio de Janeiro, v. 31, n. 2, e2331206, 5 out. 2023. DOI: https://doi.org/10.36920/esa31-2_06.

 

 

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[1] Docente no Instituto de Estudos do Xingu da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (IEX/Unifesspa). Doutorado em Sociologia e Antropologia pela Universidade Federal do Pará (UFPA). E-mail: cristiano@unifesspa.edu.br

[2] A grafia dos termos em itálico será sempre quando me referir a algum termo em língua estrangeira. Pequenos produtores é um termo local utilizado juntamente com a categoria correlata, agricultor(a) familiar. Optei por ocultar os nomes dos(as) interlocutores(as) apresentando apenas as iniciais.

[3] Em sentido similar, Schneider e Cassol (2013) destacam que agricultores familiares são grupos sociais formados por pequenos proprietários de terra que trabalham mediante o uso da força de trabalho dos membros de suas famílias, produzindo tanto para seu autoconsumo como para a comercialização e vivendo em pequenas comunidades ou povoados rurais.

[4] O município de São Félix do Xingu apresenta uma realidade marcada pela presença de ONGs e entidades governamentais de assistência técnica que prestam assessoria a diversas unidades familiares, dada a recorrente degradação do solo, da água e de boa parte do ambiente imediato de produção da vida. Entre as instituições cujo trabalho é desenvolvido com os pequenos produtores rurais, três são centrais. São elas: The Nature Conservancy Brasil (TNC), o Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora) e a Comissão Pastoral da Terra (CPT).

[5] Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L11947.htm. Acesso em: maio 2020.

[6] A Lei no 13.987, de 7 de abril de 2020, publicada na edição extra do Diário Oficial da União desta terça-feira, 7, alterou a Lei no 11.947, de 16 de junho de 2009, para autorizar, em caráter excepcional, a distribuição de gêneros alimentícios adquiridos com recursos do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) aos pais ou responsáveis dos estudantes das escolas públicas de Educação Básica. A medida ficará vigente enquanto durar o período de suspensão das aulas em razão de situação de emergência ou calamidade pública, resultante da pandemia do coronavírus. “Publicada a lei que autoriza a distribuição de alimentos adquiridos com recursos do Pnae durante a suspensão das aulas na rede pública”. Disponível em: http://www.fnde.gov.br/index.php/acesso-a-informacao/institucional/area-de-imprensa/noticias/item/ 13438-publicada-a-lei-que-autoriza-a-distribui%C3%A7%C3%A3o-de-alimentos-adquiridos-com-recursos-do-pnae-durante-a-suspens%C3%A3o-das-aulas-na-rede-p%C3%BAblica. Acesso em: 20 jun. 2020.

[7] O auxílio emergencial estava previsto para ser pago, inicialmente, em três parcelas a partir de abril de 2020. Elas tinham o valor de R$ 600,00 cada uma. No fim de junho de 2020, o governo anunciou a prorrogação desse pagamento, totalizando cinco parcelas. Logo após, foi confirmada mais uma prorrogação. Desta vez, seriam mais quatro parcelas. Porém, o valor caiu para R$ 300,00, com exceção de quem já recebia vinculado ao Programa Bolsa Família, que permaneceria com o valor anterior. “Beneficiário do Bolsa Família recebe 6a parcela do auxílio emergencial a partir do dia 17”. Disponível em: https://agora.folha.uol.com.br/grana/2020/09/beneficiario-do-bolsa-familia-recebe-6a-parcela-do-auxilio-emergencial-a-partir-do-dia-17.shtml. Acesso em: 20 set. 2020.

[8] Para mais informações sobre a empresa e seu ramo de atuação, acessar: https://www.centroflora.com.br/grupo-centroflora-vence-o-1-premio-nacional-da-biodiversidade/.