Estudos Sociedade e Agricultura,
v. 28, n. 1, p. 227-254, fevereiro a maio de 2020.

Artigo recebido em 19/11/2019.  Aceito em 06/01/2019. Publicado em 01/02/2020.

 

 

 

Sergio Pereira Leite[1] orcid.png

 

 

 

Ruralidades, enfoque territorial e políticas públicas diferenciadas para o desenvolvimento rural brasileiro:  uma agenda perdida?

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DOI: 10.36920/esa-v28n1-10

 

 

 

 

 

Introdução

Não há dúvida que o tema aqui abordado – emergência das novas ruralidades num contexto de políticas públicas diferenciadas com enfoque territorial – é extremamente complexo e percorre um largo período histórico de transformações do meio rural brasileiro (e também latino-americano) que demandaria um trabalho mais exaustivo e detalhado do que permite o escopo desse artigo. Desse modo, sem qualquer pretensão de esgotar o assunto ou mesmo pontificar a respeito, a intenção principal desse esforço é destacar algumas ideias-chave associadas ao objeto em questão, desenvolvendo-as à luz de fontes bibliográficas, documentais e estatísticas, especialmente aqueles pontos que me pareceram ausentes (ou pouco discutidos) do debate travado até o momento sobre a noção de desenvolvimento territorial.

Para tanto, adianto que cinco pontos, em particular, merecem uma atenção especial nessa discussão sobre ruralidades, desenvolvimento territorial e rural e políticas públicas:

a.    O primeiro deles refere-se ao fato de que “rural” e “territorial” são dimensões que dialogam fortemente entre si, embora não sejam idênticas. Assim, é necessário perceber claramente quais são os pontos de contato e quais são as especificidades que marcam tais “categorias” de análise.

b.    O segundo aspecto reforça o argumento de que a noção de “território” não pode prescindir de um debate sobre o significado que a “terra” ocupa hoje no capitalismo ao nível internacional e, em particular, no Brasil.

c.    O fato de que as transformações históricas recentes do meio rural brasileiro demandam novas categorias de análise constitui o terceiro elemento a ser destacado.

d.   O quarto ponto em relevo propõe que a forma concreta que o processo de “territorialização” se expressa em regiões específicas resulta de um conjunto de fluxos não necessariamente convergentes, muito pelo contrário.

e.    Finalmente, a ideia de que o “desenvolvimento rural e territorial” demanda um desenho – e a implementação – de políticas públicas específicas e diferenciadas, além de um amplo leque de inovações institucionais, parece constituir-se num consenso entre os estudiosos da área e merece aqui uma atenção importante.

Os pontos acima serão desenvolvidos nesse texto ao longo de três partes. A primeira delas recupera brevemente as diferentes concepções de ruralidade e alguns momentos do amplo debate que se realizou sobre o assunto, especialmente ao longo dos anos 2000. Na sequência procuro detalhar os diferentes fluxos e dinâmicas que vêm marcando o conjunto das transformações experimentadas pelo meio rural brasileiro. A terceira parte do trabalho aborda o tema das políticas públicas vis-à-vis um conjunto de diferentes radiografias possíveis do setor rural no país, buscando algumas interpretações e causalidades que problematizam o tema central desse texto. Ao final são expostas algumas considerações, a título de conclusão, aliadas a um conjunto de especulações sobre os acúmulos experimentados no passado recente e a capacidade, ou não, de recuperá-los frente ao desmonte dos instrumentos de programas governamentais que lhe deram apoio e sustentação.

 

Concepções de ruralidade

Segundo Ellis e Biggs (2001), uma perspectiva histórica de mais longo prazo sobre as ideias e referências que marcaram o debate a respeito do desenvolvimento rural, em particular na América Latina, pode ser expressa no Quadro 1, a seguir.

Para os autores, entre as décadas de 1950 e 2000, uma série de “referenciais” marcaram o debate sobre as questões relacionadas ao desenvolvimento rural, e porque não dizer às políticas públicas.[2] Longe de uma superposição mecânica entre um período e outro, Ellis e Biggs (2001), procuraram identificar atributos para a noção de desenvolvimento rural nesses diferentes momentos. Assim, por exemplo, as concepções sobre modernização agrícola, modelo econômico dual e os processos de mecanização e transferência de tecnologia, incluindo a extensão rural, deram a tônica no meio rural latino-americano entre os anos de 1950, 1960 e 1970, no auge do processo do modelo conhecido como “revolução verde”. Da mesma maneira, entre o final dos anos 1970 e 1980, críticas à ideia de modernização agrícola e seus efeitos concentradores, já podiam ser sentidas por meio da implementação do Programa de Desenvolvimento Rural Integrado (PDRI) do Banco Mundial, buscando compensar os resultados socialmente excludentes da “Green Revolution”, ao mesmo tempo que o período assistia uma expansionista (porém seletiva) política de crédito rural, mola-mestra da modernização agrícola brasileira (LEITE, 1998).

 

 

Quadro 1 – Linha do tempo das ideias sobre Desenvolvimento Rural

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Fonte: Ellis e Biggs, 2001.

 

 

Os efeitos, especialmente econômicos, do ajuste estrutural imposto aos países latino-americanos rebateram de forma drástica no setor rural, especialmente através das políticas de liberalização (comercial, de investimentos, financeira, etc.), entre as décadas de 1980 e 1990, dando origem a preocupações que se voltaram aos problemas do alívio (anos 1980 e 1990), redução (1990’s) e erradicação da pobreza (2000’s), complementados por programas de segurança alimentar, processos de participação social, descentralização de políticas (como o microcrédito, por exemplo). Nas duas últimas décadas do Quadro 1, ganham destaques dois outros temas que marcarão definitivamente o debate: as noções de “sustentabilidade” (sobretudo a partir da Rio-92) e de “governança” (utilizada de forma crescente ao longo dos anos 1990).

Se pensarmos o contexto das políticas agrárias no Brasil e aplicando rapidamente a ideia de referenciais temáticos para o período pós-1980 que informou processos e políticas nesse campo de atuação, poderíamos dizer que na década de 1980 prevaleceram ideias acerca do processo de reforma agrária e do desenvolvimento rural, enquanto na década seguinte a emergência das noções de agricultura familiar e desenvolvimento sustentável deram a tônica do debate. Já nos anos 2000 pode-se verificar a consolidação do problema da segurança alimentar e, para o que nos interessa mais de perto, de desenvolvimento territorial. Na década atual, a erradicação da miséria ganhou espaço nos programas agrários até a crise e o desmonte das políticas em 2016.

Ainda que abusando da forma sistemática e, de certo modo, reducionista empregada na elaboração do quadro acima, a compilação desses referenciais de forma organizada na linha do tempo, pareceu-me muito oportuna para iniciar uma revisita ao debate sobre as concepções de ruralidade, destacando as principais ideias-força que testemunharam tais transformações.

Um paralelo do contexto latino-americano com as transformações rurais europeias é também tentado no Quadro 2, a partir do trabalho de Delgado et al. (2013).

 

 

Quadro 2 – Sinopse comparativa entre os contextos latino-americanos e europeu

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Fonte: Delgado et al. (2013).

 

 

Pode-se verificar pelo quadro que a ideia de uma modernização “produtivista” da agricultura vigorou com força tanto num contexto quanto noutro, incluindo a expansão da área cultivada e das políticas de crédito (Brasil) e preços (Europa), num cenário de forte intervenção do Estado (o modelo de industrialização por substituição de importações no primeiro caso e a emergência da Política Agrícola Comum – PAC, no segundo).

A década de 1980 marcaria a crise deste “modelo” no contexto brasileiro, forçando um export drive da produção agropecuária, orientado ao ajuste do balanço de pagamentos e à contenção do processo inflacionário e da crise fiscal. Esta última também influenciaria as reformas da PAC, cujos debates se aprofundam na segunda metade dos anos 1980, redundando numa mudança estrutural da mesma em 1992.

Segundo os autores durante os anos 1990 e 2000 vigoraram na América Latina ideias que discutem uma “nova ruralidade”, enquanto que na Europa o conceito de “multifuncionalidade da agricultura” passa a ser empregado, inclusive pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). No bojo da reforma do Estado e das políticas de liberalização latino-americanas ganharão peso duas outras concepções diretamente relacionadas ao rural: aquela de “segurança alimentar” (especialmente nos anos 1990) e a de “desenvolvimento territorial” (sobretudo na década seguinte). Diga-se de passagem, que essas noções “contrabalanceadoras” concorrerão com a emergência e a consolidação da noção de “agronegócio”, no lastro do processo de modernização agrícola e da conformação dos distintos complexos agroindustriais, que haviam dado a tônica nas décadas anteriores. Na Europa, os impactos da conclusão da Rodada Uruguai do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT) e as sucessivas reformatações da PAC ganharão destaque na agenda, associados a preocupações com as políticas de desenvolvimento regional comunitária e de desenvolvimento territorial, especialmente em alguns países, como a Espanha, por exemplo. Em ambos os contextos a ideia de “desenvolvimento sustentável” incidirá com força a partir dos anos 1990, perdurando ao longo dos anos 2000 e 2010.

Tais transformações e a forma de percebê-las e interpretá-las levou a uma série de questionamentos acerca do significado do termo “rural”, particularmente na área demográfica, visto que, invariavelmente, tal noção era definida no seu sentido negativo, isto é, “o rural é tudo que não é urbano”. Ou, ainda, definidos os espaços urbanos a partir de critérios, como aquele de densidade demográfica (número de habitantes por área), o “resto” era automaticamente identificado como rural. Essa forma de definição, extremamente simplificadora e complicada, informou boa parte dos órgãos de produção de dados estatísticos de caráter socioeconômico e demográfico por um largo período de tempo, incluindo o próprio Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), como já apontava corretamente Veiga (2002).

Atente-se ao fato de que, entendido nessa perspectiva reducionista, o “rural” ganhava contornos subdimensionados e era objeto de políticas públicas com forte viés “agrícola” e produtivista, desqualificando outras possibilidades que seriam lembradas, por exemplo, com a emergência do debate sobre a “multifuncionalidade” da agricultura (doravante MFA) na virada dos anos 1990 para os anos 2000. Como bem lembravam Bonnal et al. (2004), duas concepções marcaram a discussão sobre a MFA: a) de um lado, uma perspectiva positiva, ou positivista, que enxergava na multifuncionalidade e suas políticas derivadas, uma forma de correção das “falhas de mercado” que a lógica produtivista não compreendia; b) de outro, uma perspectiva normativa, priorizando um enfoque global sobre a noção de MFA e não apenas como instrumento de compensação mas, sobretudo, como forma de afirmação, legitimação e valoração das chamadas outras “funções” da agricultura para além da produção agropecuária propriamente dita, quais sejam: preservação da paisagem, manutenção de determinadas espécies da fauna e da flora, serviços variados (como turismo, patrimônio histórico, etc.), manutenção de um determinado modo de vida, entre outros. Segundo Delorme (2004) essas diferentes interpretações marcarão as experiências implementadas na Europa ocidental por ocasião da reforma da PAC de 1999 (com vigência entre 2000 e 2006). Numa ponta mais conservadora a perspectiva inglesa, de corte liberal, que promovia algumas ações que não modificavam radicalmente o status quo da política rural; na outra ponta, a experiência francesa, com os Contratos Territoriais de Exploração/Estabelecimento (CTEs), que implicava num redesenho estrutural da divisão de recursos alocados ao setor rural, taxando os repasses da PAC de viés produtivo (“pagamentos diretos”) para constituir um fundo de financiamento aos CTEs (RÉMY, 2002).

Paralelamente ao debate feito na Europa sobre a MFA, na América Latina, a partir da iniciativa de diversos acadêmicos e instituições (PEREZ, 2001; PEREZ; FARAH, 2004) assistiu-se nos anos 1990 e 2000, uma interessante discussão a propósito da noção de “nova ruralidade”. Grosso modo, os autores postulavam que tal concepção considerava a permanência da dualidade na agricultura e o aumento da pobreza no meio rural, como um contexto histórico importante sobre o qual se erigia a nova provocação. Tratava-se, pois, de criticar os instrumentos de intervenção de corte populista, de identificar as mudanças nas realidades agrícola e rural, como respostas ao processo de liberação, em voga na década de 1990, e, sobretudo, formular uma reestruturação de políticas públicas que atendessem essa diversidade do campo e não se reduzisse apenas aos clássicos mecanismos de crédito e preço para fomento da produção agropecuária stricto sensu. No Brasil, diga-se de passagem, tal “dualidade”, foi marca registrada da estrutura administrativa do Estado no período posterior à redemocratização. Veja-se, por exemplo, a coexistência do Ministério da Agricultura e do Ministério da Reforma e do Desenvolvimento Agrário (MIRAD) nos anos 1980 e do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) entre o final dos anos 1990 e durante toda a década de 2000, chegando até 2016, quando o segundo foi extinto e suas funções incorporadas por uma secretaria específica ligada à Casa Civil. A partir de 2019, nem mesmo essa secretaria se manteve, visto que parte das atividades do setor retornaram ao MAPA depois de mais de vinte anos e outra parte foi simplesmente desativada.

Esses e outros debates sobre uma melhor e mais complexa definição de “rural” e, consequentemente, de “ruralidade”, levaram diversas agências e organismos multilaterais, além de órgãos públicos responsáveis pela produção e publicação de estatísticas socioeconômicas e demográficas, a revisitarem seus critérios e metodologias, buscando aprimorar e redefinir os contornos dos espaços rurais. Delgado et al. (2013) realizaram um exaustivo levantamento dessas iniciativas no plano internacional, além de recuperarem também as mesmas questões no plano nacional em oito países da América Latina e Europa.[3]

 

 

Figura 1 – Tipologias de ruralidade: organizações multilaterais

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Fonte: Delgado et al. (2013).

 

Como pode ser visualizado na Figura 1, diferentes tipologias de ruralidade tornaram-se, ao longo do tempo (especialmente a partir do início dos anos 1990), objeto de reflexão de uma série de organizações, em particular a OCDE, mas também o Banco Mundial, a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) e a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL).

Como já apontava Veiga (2002), a OCDE foi uma das primeiras instituições, no plano internacional, a criticar a visão empobrecida do espaço rural que predominava nos dados disponíveis acerca dos países que constituíam a Organização. Isso foi melhor desenvolvido ao longo da década de 2000, quando outros critérios, além da densidade demográfica, passaram a integrar a metodologia, especialmente a introdução do tamanho dos centros urbanos que cercavam os espaços rurais (2005) e a distância ou o tempo de deslocamento às zonas urbanas (2010), permitindo um gradiente classificatório que ia do “rural isolado”, digamos assim, até as “regiões metropolitanas”, com forte densidade demográfica. A União Europeia, na década de 2010, aplica uma versão aperfeiçoada dessa metodologia ao espaço europeu, identificando áreas em quadrantes de 1 km2 (DELGADO et al., 2013).

 

 

Figura 2 – Concepções de ruralidade e seus processos de institucionalização

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Fonte: Delgado et al. (2013).

 

 

Exercício semelhante foi realizado igualmente pelo Banco Mundial na década passada, agregando dimensões como a “vocação” de determinadas regiões para atividades agrícolas, pecuárias e florestais. O Centro Latino-americano para o Desenvolvimento Rural (RIMISP) enfatiza, diferentemente das demais organizações acima, as dinâmicas territoriais que informam esses espaços, desenvolvendo metodologia específica que considera sete dimensões básicas: demografia, renda, pobreza e distribuição de renda, emprego, educação, moradia, governo local, participação social e política (BERDEGUÉ et al., 2012; DELGADO et al., 2013).[4]

Tratava-se, portanto, de construir um novo repertório de metodologias e instrumentos de intervenção a partir das novas concepções de ruralidade em curso, que implicava numa “nova” rede de atores sociais a ser alinhavada bem como na elaboração de um quadro normativo e institucional que lastreasse e suportasse tais iniciativas. Esse complexo jogo de relações pode ser visualizado, de forma um tanto quanto esquemática, na Figura 2.

A partir de uma iniciativa de diversas instituições brasileiras ou sediadas no Brasil, entre as quais o IICA, realizou-se alguns anos atrás um amplo estudo coordenado por Tania Bacelar, voltado a problematizar a noção de rural no país e a construir, com base nos microdados do Censo Demográfico, de informações do Censo Agropecuário e considerando os diferentes biomas existentes no país, uma nova tipologia dos espaços rurais (ARAÚJO, 2015; BITOUN et al., 2017).

Para tanto os autores partiram de algumas bases conceituais que informavam a visão contemporânea de rural e ruralidade no Brasil (ARAÚJO, 2015), atestando que o “rural se expressa enquanto ‘forma territorial da vida social’. Para compreendê-lo, deve-se levar em conta, especialmente, o acesso aos recursos naturais e aos bens e serviços da cidadania; a composição da sociedade rural em sistemas e categorias sociais; e os valores culturais que sedimentam e particularizam os seus modos de vida. O rural não resulta apenas da presença da agropecuária”. Isso implica em que: a) o rural atual tem interdependência crescente com as cidades (ou seja, não pode ser visto mais em oposição ao urbano); b) os traços distintivos dos espaços rurais variam segundo as sociedades (fortemente heterogênea no caso brasileiro); c) o desenvolvimento rural é um projeto de sociedade.

Ou seja, para os autores, o rural não pode ser entendido como uma categoria a-histórica. Sua definição tem direta correspondência com a trajetória da formação econômica e social brasileira. Assim, o rural não pode ser compreendido como periférico, residual e/ou dominado, como frequentemente é feito no Brasil, especialmente tendo em vista que a definição legal do espaço é feita a partir da área urbana.

Nesse sentido, a ruralidade em questão reflete a disputa de diferentes interpretações e concepções do rural, seja enquanto espaço de investimento, seja enquanto lugar de vida (ARAÚJO, 2015).

Para os autores algumas tendências caracterizam particularmente a ruralidade atual no Brasil. São elas: a) o rural muda o perfil demográfico com o arrefecimento do êxodo e as condições de vida no campo observaram alguma melhoria;[5] b) a agricultura ganha importância no cenário internacional e nas exportações, mas perde peso na ocupação de mão-de-obra; c) mantém-se uma “convivência conflituosa” de duas formas sociais de produção na agricultura brasileira; d) o território ganha espaço como unidade de planejamento, mas as instituições e as forças sociais continuam operando setorialmente e o viés dos investimentos territoriais permanece fortemente compensatórios; e) o surgimento de uma economia da nova ruralidade é fato e resulta de vários processos e não somente das transferências de renda; e f) os territórios rurais, em particular, surgem no Brasil do século XXI como “janelas de oportunidade”, frente aos processos de produção de energia e alimentos.

Após um exaustivo trabalho de construção de indicadores, sistematização de informações estatísticas secundárias, construção de cartogramas e farta revisão bibliográfica, o estudo coordenado por Araújo (2015), chegou à conclusão que o espaço rural brasileiro (nas suas diferentes tipologias) englobava 37% da população total e não apenas 15,5% como atestava o Censo Demográfico de 2010, produzido pelo IBGE (BITOUN et al., 2017). Esse novo cálculo implica, certamente, no redesenho de políticas, na valorização de outros atores sociais e na melhor compreensão dos fluxos e das dinâmicas que vêm caracterizando as transformações do campo brasileiro, objeto do próximo tópico.

 

Fluxos e dinâmicas em curso que incidem sobre o rural brasileiro

Os movimentos historicamente recentes na área rural brasileira, em especial nas regiões compreendidas como “fronteiras agrícolas”, poderiam ser objeto de um determinado tipo de análise que priorizasse os diferentes “fluxos” que informam a territorialização propriamente dita desses espaços. Ou seja, como “aterrizam” ou ganham densidade territorial os distintos movimentos que caracterizam as dinâmicas de ocupação de um conjunto não desprezível de áreas no meio rural brasileiro.

Dessa forma, se pode falar de um fluxo de “produtores rurais”, como aquele que caracteriza o deslocamento populacional de migrantes gaúchos em direção aos cerrados das regiões Nordeste, Sudeste e Centro-Oeste. Ou ainda, de um fluxo de “trabalhadores rurais”, que explica a migração – geralmente sazonal – de pessoas entre distintas regiões, como os trabalhadores oriundos do Maranhão que seguem para o Mato Grosso para o processo de limpeza das áreas. Há também um fluxo de “capitais” (nacionais e/ou internacionais), que informam estratégias locacionais de tradings e demais empresas ligadas ao setor agrícola, carregando pacotes tecnológicos, formatando cadeias produtivas etc.). Destaque-se, nesse caso, os capitais financeiros, que promovem transferências de fundos, investimentos que amparam operações produtivas e especulativas. Poder-se-ia falar igualmente de um fluxo “governamental”, exemplificado por diferentes políticas públicas que fomentam ou estimulam os fluxos acima, como é o caso dos programas de crédito rural, de infraestrutura (transportes em particular) etc.[6]

Convergindo num território específico, esses fluxos (demográficos, de capitais e investimentos, de financiamento, etc.) produzem sinergias e conflitos entre os próprios stakeholders e entre esses e as comunidades nativas (populações indígenas, povos tradicionais, camponeses, quilombolas etc. que ocupa(va)m essas áreas), e desses com os processos de urbanização, etc.

Dessa forma, a performance desses fluxos traduz diferentes dinâmicas que vêm caracterizando as transformações recentes da agricultura doméstica. Entre elas destacaria aqui: a) a financeirização da agricultura e a estrangeirização da terra; b) o reordenamento demográfico-populacional e o crescimento das cidades médias; c) as novas configurações regionais e as inovações territoriais; d) o acelerado processo de controle externo das atividades produtivas (agrícolas, agroindustriais, de comercialização etc.); e) a ideia do rural como espaço de vida e produtor de novas tecnologias (como é o caso, por exemplo, da agroecologia); e f) os processos de resistência from below e novos conflitos envolvendo a terra e os recursos naturais.

Por uma questão de escopo, não será possível desenvolver nesse texto todas essas questões. Gostaria, apenas, de chamar a atenção para o primeiro ponto, objeto de uma rápida e intensa transformação da paisagem rural de algumas regiões brasileiras e que, de forma geral, passa desapercebido das análises sobre as novas ruralidades.

Dada a dinâmica e a complexidade da projeção externa do Brasil, pareceu-me oportuna uma análise mais fina para compreender as características, tanto sociais, como econômicas e político-institucionais, dos processos de expansão do agronegócio e, adicionalmente, da revalorização dos ativos fundiários gerando novas pressões para apropriação de terras (não exclusivamente mediadas pelo mercado de compra e venda) e do papel que o Estado vem desempenhando ao longo desses últimos anos. Um dos resultados já observados em pesquisas anteriores (FLEXOR; LEITE, 2017; SAUER; LEITE, 2012), foi a constatação da forte valorização dos preços das terras entre o final dos anos 1990 e meados dos anos 2010, especialmente nas áreas objeto de expansão da produção de commodities, como foi o caso do Oeste baiano, da Amazônia brasileira, do circuito Maranhão-Piauí-Tocantins e mesmo em áreas já consolidadas, como Mato Grosso (com soja e algodão) e São Paulo (com cana de açúcar).

Essa valorização das terras esteve atrelada, por sua vez, à performance altista dos preços das commodities no mercado internacional, em particular ao longo da década de 2000.

Não foi à toa que Svampa (2013) denominou esse período como o “Consenso de Commodities”, na sequência do Consenso de Washington, para caracterizar a emergência de uma busca voraz por terras em países da América Latina, por exemplo, atrás das altas valorizações dessas mercadorias (agrícolas e minerais), abrindo para uma discussão importante sobre os mecanismos de neoextrativismo (liberal ou não, segundo a autora) observados em escala crescente no contexto regional, em boa parte dos casos com o incentivo dos governos nacionais associados aos interesses do capital internacional (COLQUE, 2017). Balestro e Lourenço (2014), também chamam a atenção para a importância de considerar o comportamento da produção e preço das commodities agrícolas no fortalecimento das estratégias financeiras do setor.[7]

No caso da estrangeirização das terras, como mostra uma crescente bibliografia nacional e internacional,[8] é importante lembrar que, no Brasil, houve uma tentativa de regulamentação a partir do parecer Advocacia Geral da União (AGU), emitido em 2010, buscando estabelecer limites ao volume de terra adquiridos diretamente por pessoas, empresas ou governos estrangeiros (CASTRO; SAUER, 2016; SAUER; LEITE, 2012). Com efeito, o parecer recuperava lei específica sobre o assunto, promulgada em 1971, e que havia caído em “desuso” especialmente durante os anos 1990 e 2000, quando a corrida por terras se agrava. Dando seguimento ao parecer da AGU, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) emite em 2013 a Instrução Normativa (IN) no 76, que dispõe sobre a aquisição e arrendamento rural por estrangeiros. A matéria está bem fundamentada e coloca o Instituto como peça central na fiscalização desse tipo de transação imobiliária, embora a efetividade dessas ações pareça diminuir com a falta de recursos orçamentários para sua realização. Tal posição foi, em parte, atenuada com outra IN, de 2017, quando do movimento acelerado de “titulação dos assentamentos” patrocinado pelo mesmo órgão.

O capital internacional continuou participando no setor agrícola (e mineral), agora mediado pela atuação de firmas nacionais, valendo-se da legislação respectiva sobre o conceito de empresas nacionais aptas a funcionar no país. Além disso, há forte pressão política para a aprovação do PL 4059/2012 (entre outros 11 projetos em curso), que flexibiliza a precária regulamentação do setor. Os argumentos empregados giram em torno da necessidade de atrair novos investimentos no setor numa conjuntura de crise econômica.

 

 

Figura 3 – 20 principais países alvo de investimentos em terras

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Nota: Pontos indicam o número de transações (eixo direito), barras indicam o tamanho da terra (eixo esquerdo).

Fonte: Land Matrix (2016, p. 17), apud Gomes (2017, p. 31).

 

 

Ainda que controversos, os dados oficiais do INCRA de 2010 indicavam a presença de cerca de 34.400 imóveis rurais e 4.350.000 hectares registrados sob a propriedade de estrangeiros, dado que parece-me estar subdeclarado pois, com as modificações ocorridas no conceito de “empresa nacional” na década de 1990, várias propriedades registradas como pertencentes ao capital nacional são, de fato, controladas por estrangeiros.

Entre outros fatores, pode-se supor que a entrada recente e crescente de inversões estrangeiras em terra venha contribuindo para manter aquecida a variação do preço dos ativos fundiários no contexto nacional ao longo dos últimos 15 anos. Mesmo tratando-se de uma região “consolidada” de expansão do chamado agronegócio, a variação nominal do preço do hectare superou, em muito, a variação da inflação no período, que ficou em 65%. Em regiões ditas de “fronteira agrícola”, a alta dos preços das propriedades agrícolas chegou a alcançar 700% para o mesmo intervalo.

Parece-me lógico que esse processo, aliado às outras dinâmicas indicadas no início do tópico, alteraram fortemente o quadro sobre o qual se assenta o rural brasileiro, demandando uma reformulação nos processos interpretativos, inclusive no que tange às próprias categorias de análise, como chamamos a atenção na Introdução do artigo.

Se estamos tratando do rural moderno e das novas expressões territoriais, é fundamental que sejam assinaladas, mesmo que não aprofundadas, questões que implicam em novas configurações espaciais, quer aquelas orientadas a um movimento global do mercado de terras, como assinala Sassen (2016), quer aquelas relacionadas à afirmação de direitos sobre o uso da terra e dos recursos naturais.

 

Políticas públicas e radiografias do meio rural brasileiro

Dando seguimento ao exposto até aqui, pareceu-me oportuno destacar como alguns processos sociais no campo estiveram – ou estão – articulados diretamente à implementação de determinadas políticas públicas, reforçando a necessidade de compreendermos melhor o papel do Estado nesses movimentos. Se atentarmos para o contexto dos últimos 25 anos, poderíamos destacar alguns processos importantes, tais como: a) a já aludida compra de terras por estrangeiros; b) mecanismos de financiamento rural e agroindustrial, incluindo a participação de tradings; c) a emergência dos chamados novos títulos do agronegócio (1994 e 2004); d) o crescente endividamento do setor rural; e) o aumento da produção e da produtividade das principais culturas e criações, especialmente aquelas destinadas à exportação (commodities); f) a expansão dessa produção e a abertura de novas “fronteiras” (especialmente nas regiões Norte e Nordeste); g) a reformulação e revisão de códigos cunhados, em boa medida, na era Vargas (mineração, florestal, etc.); h) a promoção do desenvolvimento rural e territorial; i) a explicitação da diferenciação social no campo; j) o reconhecimento – mesmo que parcial – do direito de acesso à terra de povos e comunidades tradicionais.

 

 

Figura 4 – Participação da agricultura no valor adicionado dos municípios – 2010

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Fonte: Favareto et al. (2014) com base nos dados do IBGE de 2012, apud Favareto (2015).

 

Como atesta a Figura 4, para uma boa parte dos municípios brasileiros, especialmente aqueles localizados na região central do país (partes do Centro-Oeste, do Norte, do Nordeste e do Sudeste) e em boa medida nos estados da Região Sul, a atividade agropecuária mantém uma forte contribuição para a geração de valor adicionado, ressaltando certo dinamismo econômico, mesmo que fortemente diferenciado em função das distintas características que marcam essas áreas.

Para levar a cabo tais dinâmicas, foram relevantes diversos programas governamentais (setoriais ou não) no período, entre os quais sublinho: a) política de crédito rural por meio do Sistema Nacional de Crédito Rural (SNCR) em forte expansão durante a década de 2000 até meados dos anos 2010, além da emissão dos novos títulos do agronegócio; b) programas de investimentos agropecuários e agroindustriais, particularmente aqueles capitaneados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES); c) o fomento à pesquisa agropecuária através da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa); d) o leque de políticas públicas direcionadas à agricultura familiar a partir de 1995/96 e com maior ênfase depois de 2003, especialmente o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf); e) as marchas e contramarchas da política fundiária, seja aquela de reforma agrária, seja aquela de regularização fundiária; f) as políticas de ordenamento e desenvolvimento territorial, em particular o Programa de Desenvolvimento Sustentável dos Territórios Rurais (Pronat); g) as políticas de infraestrutura, em especial na área de transportes e habitação rural; e h) os programas de seguridade social no campo e de segurança alimentar e nutricional.

Uma rápida retrospectiva sobre os últimos 15 anos de transformações do meio rural brasileiro permitiria identificar alguns movimentos particulares que estou chamando aqui de “radiografias” das mudanças operadas no campo. A título de exemplificação vou destacar dois “tipos” que possibilitam problematizar a relação atividades/processos agrários x políticas públicas setoriais. O primeiro deles refere-se a uma “radiografia conservadora” dessa performance e o segundo à uma “radiografia alternativa” a esse padrão dominante.

 

Uma radiografia conservadora das transformações agropecuárias

Talvez a mais expressiva identificação da agricultura brasileira seja aquela associada ao “agronegócio” e a respectiva produção de bens para exportação. O chamado “complexo da soja” é claramente um dos casos mais lembrados nessa direção e vou tomá-lo aqui como indicador de um determinado padrão de crescimento que informa uma determinada perspectiva de rural.

 

 

Figura 5 – Produção de Soja (em toneladas) – Brasil – 1973 a 2018

 

Fonte: GEMAP (2019) com base em PAM/IBGE. Elaboração de Valdemar Wesz Jr.

 

 

A Figura 5 apresenta a evolução da produção (em toneladas) de soja entre 1973 e 2018 no Brasil. Pode-se verificar que, especialmente a partir de 1999/2000, houve um enorme crescimento, que se concentrou em determinadas regiões do país: originalmente centrada na região Sul a produção de soja expandiu-se para os cerrados, inicialmente na região Centro-Oeste e, posteriormente, na região Nordeste. O caso do estado de Mato Grosso é bastante significativo e deixa bem claro o forte processo de concentração (econômica e fundiária) que lastreia esse “estilo” de crescimento. Podemos acrescentar que parte dessa produção e seu respectivo esmagamento passaram a ser objeto de controle de grupos estrangeiros (argentinos, americanos, chineses etc.).

O que eu gostaria de frisar é que tal “modelo” não se fez sem a participação do Estado brasileiro, seja por meio de políticas “indiretas”, como aquelas do setor de infraestrutura, câmbio e de incentivos fiscais, seja diretamente através da política de crédito rural, por exemplo. Com efeito, tomando a participação do financiamento agrícola registrado pelo SNCR segundo os diferentes tipos de culturas, pode-se inferir que somente a soja concentrou entre 30% a 35% de todo o valor disponibilizado entre as safras de 2003 e 2012 (LEITE; WESZ JR., 2014), o que é bastante significativo.

 

Outras radiografias possíveis

Volto agora aos trabalhos de Araújo (2015) e Bitoun et al. (2017) para rascunhar alguns elementos que permitiriam identificar, nesse mesmo período, outras radiografias do rural brasileiro não contempladas pelo “modelo” anterior.

Os autores, ao revisitarem os microdados do IBGE propondo uma nova tipologia do espaço rural brasileiro, identificam seis classes de áreas, partindo daquela denominada “essencialmente rural isolada” até a “urbana em metrópoles e capitais regionais” (BITOUN et al., 2017). Pode-se verificar pelo Quadro 3 que os estratos que integram as regiões rurais contabilizam 36,92% do total da população brasileira, distribuída em 87% dos municípios, que ocupam uma área equivalente a 89,2% do território nacional.

 

 

Quadro 3 – Redimensionamento do rural no Brasil

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Fonte: IBGE (Censo Demográfico, 2010) apud Bitoun et al. (2017).

 

 

Notadamente no setor rural os autores identificaram 27 “tipos” que estão apresentados no Quadro 4 e na Figura 6.

Uma questão que pode ser levantada a partir dessa nova radiografia do campo é: dada uma reclassificação dos espaços rurais brasileiros qual(is) tipo(s) de política(s) deveria(m) ser adotado(s) para uma melhor compreensão da diversidade social rural e a promoção de uma estratégia de desenvolvimento rural (e porque não dizer territorial) mais includente que não se resuma somente ao crescimento agrícola? Argumentei que a política de crédito rural, por exemplo, mantidos os critérios que vigoram até o momento, tende a concentrar os recursos em alguns produtos para a exportação, especialmente em grandes estabelecimentos agropecuários localizados na região Centro-Sul do país.

 

 

Quadro 4 – Tipos regionalizados: denominações

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Fonte
: Bitoun et al. (2017).

 

 

Acredito que a experiência da política de desenvolvimento territorial no meio rural brasileiro, como todos os alcances e, sobretudo, limites observados (LEITE; DELGADO, 2011; DELGADO; LEITE, 2015),[9] possa ser trazida aqui como ilustração para desenhos que acionem uma nova institucionalidade para a elaboração e a implementação de políticas públicas diferenciadas.

 

 

Figura 6 – Brasil: tipos de espaços rurais

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Fonte: Bitoun et al. (2017).

 

 

Os dois programas mais conhecidos nessa direção são o Pronat, que passou a vigorar em 2004, e o Programa Territórios da Cidadania (PTC) instituído em 2008. O Quadro 5 traz os dados sobre o total de territórios por região do país. Há um total de 239 territórios, sendo 120 do PTC, concentrados na Região Nordeste (43,1% do total). O número atualizado em 2017 pela Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário (SEAD), vinculada à Casa Civil (depois da extinção do MDA e, consequentemente da Secretaria de Desenvolvimento Territorial – SDT, com a crise e o desmonte das políticas agrárias em 2016), é de 246 territórios (127 ligados ao PTC), sendo 42,68% deles localizados na Região Nordeste (SEAD, 2017).

Embora a prática desses programas até 2015 tenha sido marcada por vários tipos de problemas que não cabe aqui discutir, houve também inovações importantes seja nas esferas de participação social (Colegiados de Desenvolvimento Territorial), seja na identificação de atores sociais que passaram a integrar as diferentes instâncias e que possuíam até aquele momento pouca experiência de participação em ações de caráter supramunicipal. Na realidade, a política acabou revelando, como bem lembrou Tania Bacelar, um outro Brasil rural que os mapas de produção de commodities não permitiam identificar.

 

 

Quadro 5 – Territórios Rurais e da Cidadania, por região

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Fonte: SDT/MDA, 2014.

 

 

 

Quadro 6 – PROINF – 2003/2015 – Número de projetos – Valores em R$

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Fonte: CGMA/SDT, 2016.

 

 

Veja-se, por exemplo, pelos Quadros 6 e 7, a distribuição dos recursos do Programa de Apoio a Projetos Infraestrutura e Serviços em Territórios Rurais (PROINF), talvez a principal fonte de recursos que viabilizou os projetos territoriais.

 

 

Quadro 7 – PROINF – 2003/2015 – Número de projetos por região e natureza do gasto – Valores em R$

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Fonte: CGMA/SDT, 2016.

 

 

Como pode ser observado no Quadro 6, foram financiados entre 2003 e 2015 um total de 8.134 projetos de desenvolvimento territorial, chegando a quase R$ 2 bilhões correntes, o que é comparativamente pouco frente aos valores praticados com a política de crédito rural no país. Diferentemente desta última, tais recursos se concentraram (37,92%) na Região Nordeste do país (ver Quadro 7) e com forte peso também da Região Norte (15,24%), o que corrobora objetivos contidos nos programas voltados ao combate à pobreza e à promoção do desenvolvimento, especialmente por meio de investimentos em infraestruturas territoriais (82,86% dos recursos), revelando uma outra radiografia de um “rural possível” no país.

 

À guisa de conclusão

O artigo procurou revisitar, mesmo que de forma sucinta, o debate sobre as concepções e interpretações a respeito do peso, significado e dimensão das áreas rurais na sociedade contemporânea, em particular no caso brasileiro. Para tanto foram igualmente tratados distintos fluxos, dinâmicas e políticas que lastrearam esses movimentos nas últimas décadas, buscando identificar características e atributos que reforçavam ou problematizavam diferentes compreensões do rural, o que me permitiu discutir o fato de que não existe apenas uma possibilidade e/ou estilo de transformações, mas, sim, várias, com objetivos, finalidades e resultados também diferenciados.

Finalizo brevemente essas considerações chamando a atenção para o fato de que determinados objetivos a serem alcançados (como é o caso do desenvolvimento rural) que impliquem em novas institucionalidades de políticas e que operam com um grau de cobertura mais abrangente dos programas governamentais no campo, carregam desafios não desprezíveis, seja por alterar o modus operandi das políticas propriamente ditas (incluindo redistribuição dos recursos públicos), seja por operar com uma gama de atores distintos daqueles que historicamente foram beneficiados pelas políticas agrícolas no país.

A política de desenvolvimento territorial, entre outras possibilidades, é um exemplo importante nessa direção ao enfrentar desafios e dilemas caros ao universo rural, tais como: a luta social contra a pobreza (no curto e no longo prazo);o combate à desigualdade; a estruturação de cadeias produtivas e a geração riqueza em novas plataformas (territoriais); a geração de renda social (investimentos públicos e privados e seu rebatimento na dimensão sócio territorial); e a compreensão da dimensão estratégica do desenvolvimento, acentuam a abordagem pública desse processo. É também um exemplo de que a promoção do desenvolvimento não pode ser feita exclusivamente de maneira top-down, mas, ao contrário, pressupõe o engajamento, a participação e o controle social pelos atores from below, mesmo que esse aprendizado seja muito mais “custoso” em termos de gestão de políticas. No entanto, a capacidade de fortalecer uma tessitura mais democrática e socialmente diversa no meio rural, atendendo aos novos olhares sobre esses espaços, seria certamente um ganho a ser observado e mantido.

Ao contrário da política de crédito rural que vem se mantendo relativamente estável ou com ligeira ascensão de valores nos últimos três anos, os programas de desenvolvimento territorial, entre outros do repertório das políticas agrárias, sofreram forte interrupção a partir de 2016 e praticamente foram extintos desde janeiro de 2019, revelando um desmantelamento da política em questão. Esse resultado coloca um desafio importante sobre o “legado” das políticas agrárias e sua capacidade de resiliência diante dos “momentos críticos” na trajetória de políticas públicas, em particular aquelas de caráter diferenciado. A experiência pretérita e os resultados alcançados por essas políticas foram, de fato, suficientes para garantir um mínimo de acúmulos irreversíveis, mesmo diante dos contratempos institucionais? O redesenho observado pela emergência das políticas agrárias diferenciadas ao longo de, praticamente, duas décadas, mostrou que seria possível fomentar processos de desenvolvimento rural mais abrangentes e inclusivos. Esse legado foi suficientemente forte no sentido de convencer os atores sociais e policymakers de que um projeto de desenvolvimento mais equânime assegura maior sustentabilidade, no sentido amplo do termo, às instituições democráticas e aos processos de participação social? A reviravolta no quadro de políticas públicas ensaiada em 2015, oficializada em 2016 e consolidada em 2019, assegurando maior espaço e recursos aos programas voltados ao chamado “agronegócio” teria legitimidade suficiente para se impor mesmo diante das evidências críticas que mostraram resultados desfavoráveis no campo da segurança alimentar, do meio ambiente e da distribuição de renda?

Essas são questões que merecem reflexões mais apuradas e que extrapolam os limites desse artigo, mas certamente figurarão na agenda rural brasileira dos próximos anos.

 

 

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LEITE, Sergio Pereira. Ruralidades, enfoque territorial e políticas públicas diferenciadas para o desenvolvimento rural brasileiro: uma agenda perdida? Estudos Sociedade e Agricultura, v. 28, n. 1, p. 227-254, fev. 2020.

 

 

Resumo: (Ruralidades, enfoque territorial e políticas públicas diferenciadas para o desenvolvimento rural brasileiro: uma agenda perdida?). Equacionar o desenvolvimento territorial, as políticas públicas diferenciadas e a emergência de novas ruralidades no ambiente agrário brasileiro, tendo por base a experiência observada nas últimas décadas, é o objetivo central desse artigo para refletir sobre os “estilos” ou “modelos” de desenvolvimento que caracterizaram as transformações sociais, econômicas e político-institucionais no campo. Para tanto, o trabalho aborda, à luz da literatura internacional, o significado e o impacto que o emprego das novas ruralidades para caracterizar o meio rural trouxe sobre um conjunto importante de indicadores e de políticas governamentais. Tomando o caso brasileiro, o artigo busca retratar brevemente alguns processos recentes que influenciaram o desenho de distintas “radiografias” possíveis da agricultura nacional, exemplificada no trabalho a partir dos movimentos de estrangeirização e financeirização da terra e da constituição de territórios rurais, ambos processos amparados em políticas governamentais não menos desprezíveis, como aquela do crédito rural e do programa de desenvolvimento territorial. A recente crise das políticas agrárias brasileiras traz novos desafios à compreensão desse contexto mais amplo, gerando novas questões, sistematizadas ao final do artigo.

Palavras-chave: desenvolvimento rural; desenvolvimento territorial; políticas agrárias; ruralidades.

 

Abstract: (Ruralities, territorial focus and public policies for rural development in Brazil: an abandoned priority?). This paper invites a reflection on “styles” or “models” of development that have characterized social, economic and politico-institutional transformations in rural areas. It does so by evaluating territorial development, differentiated public policies, and the emergence of new ruralities in the agricultural context in Brazil, based on the experience over the last few decades. By drawing on international literature, this work assesses the meaning of the use of new ruralities to characterise farming environments, and its impact over important indicators and governmental policies. With a focus on Brazil, the article traces recent processes that help to sketch out possible “snapshots” of the national agricultural landscape, as evidenced in work based on land grabbing and financialization of land, and on the constitution of rural territories. These processes are supported by important governmental policies, such as rural credit and territorial development programs. The recent crisis of agricultural policies in Brazil brings new challenges in terms of understanding this broader context, and raises new questions, which will be addressed in the concluding remarks.

Keywords: rural development; territorial development; agricultural policies; ruralities.

 

 

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[1] Professor Titular do Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (CPDA/UFRRJ). Coordenador do Observatório de Políticas Públicas para a Agricultura (OPPA). Diretor do Centro de Estudos Avançados (CEA) da UFRRJ. Bolsista de Produtividade em Pesquisa do CNPq e cientista do Nosso Estado da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ). E-mail: sergiopereiraleite@uol.com.br.

[2] Para uma interpretação sobre a importância dos referenciais na análise de políticas públicas ver Muller (1999).

[3] A saber: França, Espanha, Holanda, México, Chile, Costa Rica, Uruguai e Equador.

[4] Não é objeto do presente texto uma discussão aprofundada dessas metodologias e suas implicações em termos de políticas públicas. Para tanto veja, entre outros, o exaustivo trabalho de Delgado et al. (2013).

[5] Recentemente, o IBGE vem retrabalhando sua própria metodologia com vistas a uma melhor aferição dos espaços rurais durante a aplicação do Censo Demográfico de 2020. Um primeiro exercício desses novos cálculos, usando as informações do Censo de 2010, já indicava uma redução da população urbana de 84,4% para 76%. Ver: http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2017-07/nova-proposta-de-classificacao-territorial-do-ibge-ve-o-brasil-menos-urbano. Acesso em dezembro de 2017.

[6] A formulação inicial dessas ideias deve-se, em grande medida, aos “insights” formulados por Moacir Palmeira, por ocasião da pesquisa “Sociedade e Economia do Agronegócio no Brasil”. Para uma análise mais aprofundada, ver Heredia, Palmeira e Leite (2010).

[7] Ver, ainda, a importante contribuição de Clapp (2014, 2015 e 2017).

[8] Não há espaço, aqui, para uma recuperação da discussão sobre o que se convencionou denominar, na literatura especializada, de land grabbing, seja para conceituar e caracterizar devidamente esse processo; seja para apresentar evidências robustas do seu funcionamento em escala global. Para o primeiro ponto veja-se, em particular, Edelman (2013) e Edelman et al. (2015), entre outros; e para o segundo destaco a contribuição de Chouquer (2012) e McMichael (2014).

[9] Não há espaço para uma apresentação detalhada dessa política no presente texto. Existe hoje uma ampla bibliografia especializada. Ver, entre outros, os números da coleção do Fórum DRS do IICA e o texto de Delgado e Leite (2015). Recentemente, o programa tem sido objeto de estudos que tratam do desmonte das políticas agrárias brasileiras.