Estudos Sociedade e Agricultura
vol. 27, n. 3, outubro de 2019 a janeiro de 2020

 

 

 

Paulo Marcelo de Souza[1]
Hadma Milaneze de Souza[2]
Armando Fornazier[3]
Niraldo José Ponciano[4]

 

 

 

Análise regional da produção agropecuária do Rio de Janeiro, considerando-se os segmentos familiar e não familiar

 

 

 

Introdução

Um dos menores estados do país, com extensão territorial de 43.900 Km², o Rio de Janeiro apresenta uma das maiores densidades populacionais, 327,26 habitantes por km², distribuídos por 92 municípios  (RIBEIRO; CAVALCANTI, 2011). É caracterizado por elevado grau de urbanização, com forte concentração da distribuição populacional. Conforme Pereira et al. (2013), no ano 2000 mais de 96% da população residiam em áreas urbanas, e 76% desse total concentravam-se na região metropolitana do estado.

O processo de desruralização do estado, marcado pelo esvaziamento econômico e  demográfico, e pela perda de influência política e cultural do meio rural, foi muito intenso. Entre os anos de 1940 e 2000, a população rural diminuiu 830.000 habitantes (ALENTEJANO, 2005). Nesse contexto, a agricultura foi perdendo espaço e importância relativa, participando atualmente com cerca de 3% do PIB estadual (PEREIRA et al., 2013).

Essa baixa participação da agropecuária na economia do Rio de Janeiro tem relação com o encerramento dos ciclos de exportação de café e açúcar, respectivamente nas décadas de 1900-1930 e de 1970-1980, e consequente perda do dinamismo econômico, decorrente da crescente descapitalização e decadência das grandes lavouras (SOUZA et al., 2009). Por outro lado, resulta também da preponderância de outras atividades econômicas de destaque no estado, que é o segundo polo industrial brasileiro e o maior produtor de gás natural  e petróleo (MARAFON, 2006). Além disso, conforme Alentejano (1997), a produção agropecuária no Rio de Janeiro não é expressiva devido à área destinada a esta atividade, proporcionalmente inferior a de outros estados, e a uma agroindustrialização limitada.

No país, as principais transformações na agropecuária estiveram associadas ao processo de modernização agrícola, iniciado em meados do século passado. Porém, como afirma Casseres et al. (2006), a agricultura do Rio de Janeiro não se integrou plenamente ao movimento de modernização vigente no país naquele momento, como ocorreu em outros estados. Segundo Alentejano (2005), o espaço fluminense foi organizado a partir dos interesses do capital agrário e comercial, juntamente com as características ambientais das regiões. Para o autor, os dois processos que marcaram a transformação territorial do estado do Rio de Janeiro, o desenvolvimento da metropolização e o inicio da desruralização, se iniciaram nos primeiros anos do século XX. Esse período é marcado pela decadência da oligarquia cafeeira e ascensão a burguesia industrial.

Para Carneiro et al. (1998), as políticas públicas aplicadas no estado influenciaram radicalmente o seu desempenho agrícola, implicando uma heterogeneidade das formas de produção, crescimento das desigualdades entre as regiões e enfraquecimento da participação da atividade na economia fluminense. Essas condicionantes refletem-se em diferenças marcantes nas dinâmicas produtivas das regiões, como destacam Pereira et al. (2013). Segundo os autores, essas dinâmicas vêm sendo caracterizadas por: uma produção mais dinâmica e tecnicamente modernizada na Região Serrana; presença de terras ociosas combinadas a uma produção agrícola mal articulada no Noroeste Fluminense; predomínio de uma pecuária extensiva no Vale do Paraíba; importância da cana-de-açúcar e do petróleo na região Norte Fluminense; e forte especulação imobiliária e os conflitos agrários, presentes na baía de Ilha Grande e nas baixadas Litorânea e Fluminense.

Também a diversidade climática do estado contribui para as diferenças regionais. Isso tem possibilitado a presença de culturas historicamente associadas ao estado, como cana-de-açúcar, café e pecuária leiteira, e a expansão de novas atividades, como a olericultura, a fruticultura, a avicultura, a suinocultura, dentre outras.

Por outro lado, elementos históricos legaram ao estado uma estrutura fundiária concentrada. Segundo Pereira et al. (2013), que se baseiam em dados do Censo Agropecuário de 2006, 59% dos estabelecimentos agropecuários do estado possuem área inferior a 10 ha, mas representam apenas 5,5% da área total de estabelecimentos. No outro extremo, os estabelecimentos com área entre 100 e 1000 ha, que correspondem a 7% do total de estabelecimentos, e aqueles com mais de 1000 ha, ou 2,8% dos estabelecimentos, respondem por 50 e 14% da superfície agrícola do estado do Rio de Janeiro, respectivamente.

Uma das consequências dessa estrutura é a presença de expressivo contingente de pequenos estabelecimentos agropecuários, nos quais se reproduz a agricultura familiar. Conforme dados do Censo Agropecuário de 2006, há 44.145 estabelecimentos agropecuários familiares no estado, o que representa 75% do total. No entanto, dadas as características da distribuição da terra, eles ocupam uma área de apenas 470.221 ha, cerca de 23% da área total de estabelecimentos. Apesar disso, esses estabelecimentos respondem por cerca de 50% do valor da produção, com particular importância na produção de alimentos, e são responsáveis por 58% do total de pessoas ocupadas no setor (IBGE, 2010).

Em geral, esses agricultores estiveram sempre à margem das políticas agrícolas. Em particular, não captaram os vultosos estímulos adotados no período de modernização da agricultura brasileira. Conforme Martine e Beskow (1987), as políticas e programas públicos que atuaram no período da modernização agrícola, como o crédito rural, os preços mínimos, o seguro e os programas especiais, como o Programa Nacional do Álcool (Proalcool) e vários outros, trabalharam no sentido de incentivar a concentração fundiária, beneficiar atividades e regiões específicas e favorecer a grande produção. A política de crédito rural, em particular, prestigiou principalmente a região Centro-Sul do país, oferecendo vantagens a grandes produtores e seus produtos, em geral destinados à exportação (SILVA et al., 1983).

Portanto, elementos diversos, como clima, relevo, histórico de colonização e políticas diferenciadas colaborem para que a produção agropecuária do Rio de Janeiro apresente distintas dinâmicas regionais. Visando contribuir no sentido de entender tais dinâmicas, o presente estudo busca caracterizar os diferentes perfis regionais da produção agropecuária do estado. Nessa caracterização, procura-se analisar as diferentes contribuições dos segmentos patronal e familiar para o desenvolvimento rural do estado.

 

 

Metodologia

Indicadores para a caracterização da estrutura produtiva regional

Para caracterizar as diferenças regionais quanto ao perfil da produção, foram empregadas medidas de especialização e de localização. As medidas de localização são de natureza setorial e se preocupam com a localização das atividades entre as regiões, ou seja, procuram identificar padrões de concentração ou dispersão da produção setorial, num determinado período. No presente caso, o coeficiente de localização foi utilizado nessa identificação. Já as medidas de especialização se concentram na análise da estrutura produtiva de cada mesorregião, objetivando analisar o grau de especialização das economias regionais num determinado período. Para esta análise, foram utilizados o índice de diversificação e o coeficiente de especialização. Além dessas medidas, foram calculadas as razões de concentração (CR4 e CR8), visando caracterizar a maior ou menor dependência das regiões quanto a produtos específicos. A seguir, faz-se breve descrição de tais medidas, tendo por base Haddad (1989), Lara, Fiori e Zanin (2010), Lima et al. (2006a), Lima et al. (2006b), Oliveira Filho et al. (2014).

Para o cálculo das medidas citadas, as informações devem ser inicialmente organizadas em uma matriz que relaciona a distribuição setorial-espacial da variável-base (Quadro 1). Tradicionalmente, a variável empregada em nessas análises é o número de empregados por atividade. No entanto, diante da ausência de informações sobre o pessoal ocupado por atividade, foi empregada a variável valor da produção.

Nessa matriz, as colunas exibem a distribuição do valor da produção de determinada atividade entre as regiões, enquanto as linhas exibem a distribuição do valor da produção de dada região entre as diversas atividades que desenvolve. Essa matriz é composta pelos seguintes elementos:

 

 = valor da produção da atividade i da região j;

= valor da produção da atividade i do país;

= valor da produção de todas as atividades da região j;

= valor da produção total do país.

 

 

Quadro 1 – Matriz de informações geográfico-espaciais da distribuição do valor da produção

 

Distribuição do valor da produção

Regiões (j)

Total

Atividades (i)

 

 

 

 

 

 

Total

 

 

Fonte: Adaptado de Haddad, 1989

 

 

A partir da matriz de informações, são obtidas as medidas de localização e especialização.[5] São elas:

 

 

 

• Índice de Diversificação

Para calcular o grau de diversificação produtiva regional, foi empregado o Índice de Diversificação de Simpson (IDj). Esse índice é obtido por:

                                                  (01)

 


Quanto mais especializada uma região, mais próximo de 0 (zero) será esse índice. Quanto mais diversificada, mais próximo de 1 (um) ele será.

 

 

 

• Coeficiente de Especialização

O Coeficiente de Especialização (CEj) é uma medida regional que compara a estrutura produtiva de dada região, com base na participação de cada setor na produção total, com a estrutura produtiva de todo o estado. Ele é obtido pela soma, em módulo, das diferenças entre a participação do setor i na produção total da região j e a participação desse mesmo setor no estado. Seu cálculo é feito mediante a expressão:

                      (02)

 

Resultados iguais a 0 (zero) indicam que a mesorregião tem composição idêntica à do estado. Em contrapartida, coeficientes iguais ou próximos a 1 (um) demonstram um elevado grau de especialização, associado a um determinado setor ou a uma estrutura produtiva muito diferente da estrutura produtiva do estado.

 

 

 

• Coeficiente de Localização

O Coeficiente de Localização (CLi) relaciona a distribuição de uma dada atividade entre as regiões com a distribuição do valor total da produção entre essas mesmas regiões. É estimado mediante somatório, em módulo, das diferenças entre a participação da mesorregião j no setor i do país, e a participação dessa região no total de setores do país. É obtido pela equação:

                (03)

Se o coeficiente de localização for igual a 0 (zero), significa que o setor i distribui-se regionalmente, da mesma forma que o conjunto de todos os setores, ou seja, está mais disperso entre as mesorregiões. Se o valor for igual a 1 (um), o setor i apresenta um padrão de concentração regional mais intenso do que o conjunto de todos os setores.

 

 

 

• Razão de Concentração

A Razão de Concentração (CRmj) foi empregada para determinar em que medida o valor da produção de dada região concentra-se em certas atividades. Esse índice foi calculado considerando-se a participação das quatro ou oito atividades mais importantes (CR4 e CR8). Considerando-se um total de n atividades, a razão de concentração das m atividades mais importantes é calculada por:

                                                                 (4)

 

 

 

 

Variáveis e fonte dos dados

Foram consideradas todas as atividades que, em alguma região, tenham gerado valor de produção no ano de 2006. Procurou-se não somar os valores de produtos semelhantes, mas gerados por atividades distintas (por exemplo, leite de cabra e leite de vaca), nem o valor de produtos distintos gerados por uma mesma atividade (por exemplo, produção de aves e produção de ovos). O valor total da criação foi calculado somando-se o valor dos animais vendidos, dos animais consumidos e da variação do rebanho, e subtraindo-se deste total o valor dos animais comprados.

Com esses procedimentos, chegou-se a um total de 132 atividades de produção agropecuária, extrativista ou agroindustrial. As informações foram obtidas no Sistema de Recuperação Automática – Sidra, da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – FIBGE, e têm por base os dados do Censo Agropecuário de 2006. 

 

 

Resultados e discussão

Na Tabela 1 pode-se notar que as mesorregiões Metropolitana, Norte Fluminense e Centro Fluminense são as que possuem maior participação no valor da produção agropecuária do Rio de Janeiro. Em conjunto, elas respondem por quase 70% do valor da produção estadual. Nos três casos, a elevada contribuição regional está assentada em algumas microrregiões específicas: Serrana, na região Metropolitana, Campos dos Goytacazes, na região Norte, e Nova Friburgo na região Centro Fluminense. Juntas, essas microrregiões respondem por quase metade do valor da produção do estado.

Em seguida, encontram-se as mesorregiões Noroeste e Sul Fluminense, com participação conjunta de cerca de 27% do valor da produção. Já a mesorregião Baixadas, com baixa participação no valor da produção, destaca-se como a de menor importância agrícola do estado. O valor da produção dessas mesorregiões tende a se distribuir de maneira uniforme entre suas microrregiões, exceto no caso da microrregião baía de Ilha Grande, com baixa importância na mesorregião Sul e menor participação no valor da produção do estado.

 

Tabela 1 – Participação (%) das regiões em indicadores da agropecuária do estado do Rio de Janeiro (número de estabelecimentos, área, pessoal ocupado e valor da produção), 2006

 

Região

Estabelecimentos

Área

Pessoal

Valor da produção

Noroeste Fluminense

17,6

17,5

15,6

15,2

Itaperuna

9,4

10,2

8,9

7,6

Santo Antônio de Pádua

8,2

7,3

6,7

7,5

Norte Fluminense

30,0

25,8

31,7

24,3

Campos dos Goytacazes

27,9

21,6

29,7

22,7

Macaé

2,2

4,2

2,0

1,6

Centro Fluminense

18,5

19,9

17,7

19,3

Cantagalo/Cordeiro

2,8

4,3

2,7

1,5

Nova Friburgo

9,2

4,5

8,7

11,3

Santa Maria Madalena

4,1

5,3

3,5

2,9

Três Rios

2,4

5,7

2,7

3,6

Baixadas

4,0

6,5

4,6

3,5

Bacia de São João

1,3

3,7

1,9

1,8

Lagos

2,6

2,8

2,7

1,7

Sul Fluminense

9,2

17,4

8,4

12,3

Baía da Ilha Grande

1,4

1,7

1,1

0,7

Barra do Piraí

2,6

5,3

2,9

6,5

Vale do Paraíba Fluminense

5,2

10,4

4,4

5,1

Metropol. Rio de Janeiro

20,8

12,9

22,0

25,4

Itaguaí

1,8

1,3

1,7

1,7

Macacu/Caceribu

3,8

2,4

3,7

2,5

Rio de Janeiro

6,8

3,9

6,7

4,4

Serrana

6,5

2,4

7,3

13,8

Vassouras

1,9

2,9

2,6

3,0

Total

100,0

100,0

100,0

100,0

Fonte: Resultados da pesquisa.

 

 

Em alguma medida, essa conformação reflete diferenças entre regiões quanto à extensão territorial, perceptível nas distintas participações regionais no total de estabelecimentos agropecuários e na área que ocupam. Assim, constata-se que cerca de 87% dos estabelecimentos e do pessoal ocupado, e 80% da área dos estabelecimentos, concentram-se nas regiões Norte, Metropolitana, Centro e Noroeste.

No entanto, alguns desses resultados não podem ser explicados apenas por diferenças nas dimensões regionais. Nota-se, a esse respeito, que a participação na produção da região Sul Fluminense é significativamente inferior a sua participação na área, o que se deve principalmente à microrregião do Vale do Paraíba.[6] Ao contrário, na região Metropolitana (particularmente na microrregião Serrana) gera-se proporcionalmente à área ocupada um valor bem maior de produção (e também de mão de obra).[7] Isso também ocorre com mais intensidade na microrregião de Nova Friburgo, na região Centro Fluminense.

Possivelmente, essas disparidades estão associadas a outros fatores, como perfil da estrutura fundiária e composição da produção agrícola predominante, com reflexos na produtividade da terra e do trabalho. Essas diferenças estão ainda associadas a maior ou menor presença da agricultura familiar em determinadas regiões.

Conforme a Tabela 2, o segmento familiar do estado, com cerca de 23% da área, responde por aproximadamente 75% dos estabelecimentos, 62% do pessoal ocupado e 58% do valor da produção. Esse segmento tem maior expressão nas mesorregiões Noroeste, Centro e Metropolitana, onde representa 75-80% dos estabelecimentos, cerca de 30% da área (exceto a região metropolitana, com apenas 17%), 60-65% do valor da produção e 62-78% do pessoal ocupado. Nestas três regiões, as microrregiões de maior destaque são, respectivamente, Santo Antônio de Pádua, Nova Friburgo e Serrana, onde a participação da agricultura familiar fica em torno de 70% do valor da produção.

Em seguida, vem a região Norte, com alta participação nos estabelecimentos e no pessoal ocupado (cerca de 78 e 62%, respectivamente), 19% da área, e com 56% do valor da produção (56%). A menor importância desse segmento ocorre no Sul Fluminense e nas Baixadas, onde representa cerca de 65% dos estabelecimentos, 8-19% da área e 44-50% do valor da produção e do pessoal ocupado.

 

 

Tabela 2 – Participação (%) da agricultura familiar em indicadores da agropecuária – Rio de Janeiro e regiões, 2006

 

Região

Estabelecimentos

Área

Pessoal

Valor da produção

Noroeste Fluminense

75,5

31,2

64,3

62,2

Itaperuna

71,8

26,4

59,5

57,3

Santo Antônio de Pádua

79,8

38,0

70,7

68,7

Norte Fluminense

77,7

18,9

61,5

56,0

Campos dos Goytacazes

78,7

20,6

61,6

56,1

Macaé

65,6

10,3

60,7

53,3

Centro Fluminense

78,0

32,0

67,5

65,5

Cantagalo/Cordeiro

74,0

37,4

58,8

59,9

Nova Friburgo

85,9

40,3

77,4

74,9

Santa Maria Madalena

74,5

34,6

70,6

66,2

Três Rios

59,1

18,9

40,3

40,4

Baixadas

65,3

8,6

44,6

43,7

Bacia de São João

53,0

6,4

33,9

32,3

Lagos

71,5

11,5

51,9

51,5

Sul Fluminense

66,0

19,0

51,6

48,3

Baía da Ilha Grande

74,6

22,5

76,4

68,3

Barra do Piraí

59,5

17,8

42,2

39,9

Vale do Paraíba Fluminense

66,9

19,1

51,3

48,6

Metropol. Rio de Janeiro

75,8

16,8

62,0

59,6

Itaguaí

72,7

20,0

60,4

56,5

Macacu/Caceribu

69,0

20,6

58,8

59,8

Rio de Janeiro

75,2

14,7

62,7

58,9

Serrana

85,1

22,1

69,7

67,1

Vassouras

62,8

11,0

44,6

41,9

Total

75,4

22,8

61,5

58,2

 

Fonte: Resultados da pesquisa.

 

 

Em termos de diversificação da produção, constata-se que as mesorregiões Metropolitana e Centro Fluminense têm a produção agropecuária mais diversificada do estado (Tabela 3). Na primeira, destacam-se as microrregiões de Macacu/Caceribu, Rio de Janeiro e Serrana, com altos índices de diversificação da produção. Na região Centro Fluminense, a produção mais diversificada encontra-se na microrregião de Nova Friburgo, seguida de Santa Maria Madalena e Três Rios. Já a microrregião de Cantagalo-Cordeiro, situada na mesma região, apresenta um dos menores índices de diversificação da produção do estado (Figura 1). 

 

 

Tabela 3 – Índice de diversificação do valor da produção agropecuária – Rio de Janeiro e regiões, 2006

 

Região

Não familiar

Familiar

Total

Noroeste Fluminense

0,788

0,843

0,835

Itaperuna

0,776

0,745

0,777

Santo Antônio de Pádua

0,775

0,792

0,811

Norte Fluminense

0,569

0,826

0,710

Campos dos Goytacazes

0,526

0,810

0,683

Macaé

0,695

0,757

0,774

Centro Fluminense

0,899

0,934

0,940

Cantagalo/Cordeiro

0,657

0,679

0,672

Nova Friburgo

0,943

0,932

0,942

Santa Maria Madalena

0,747

0,865

0,858

Três Rios

0,786

0,907

0,851

Baixadas

0,784

0,900

0,822

Bacia de São João

0,759

0,895

0,808

Lagos

0,756

0,885

0,805

Sul Fluminense

0,712

0,857

0,797

Baía da Ilha Grande

0,808

0,691

0,755

Barra do Piraí

0,498

0,683

0,585

Vale do Paraíba Fluminense

0,748

0,865

0,811

Metropol. Rio de Janeiro

0,924

0,938

0,951

Itaguaí

0,788

0,798

0,795

Macacu/Caceribu

0,863

0,916

0,918

Rio de Janeiro

0,880

0,903

0,911

Serrana

0,813

0,882

0,902

Vassouras

0,809

0,746

0,802

Total

0,880

0,949

0,929

 

Fonte: Resultados da pesquisa.

 

 

Enquanto a região Noroeste fica numa posição intermediária, com produção um pouco mais diversificada na microrregião de Santo Antônio de Pádua, é nas regiões Norte e Sul fluminenses que os índices de diversificação são mais baixos. Campos dos Goytacazes, no primeiro caso, e Barra do Piraí, no segundo, juntamente com a microrregião de Cantagalo-Cordeiro, sãos as microrregiões com menor diversificação agrícola (Figura 1).  

 

 

Figura 1 – Classificação das microrregiões do Rio de Janeiro segundo o índice de diversificação da produção agropecuária

 

               

 

As razões de concentração (Tabela 4) ressaltam as diferenças entre os segmentos familiar e não familiar. No estado, conforme o valor da CR4, cerca de 47% do valor total produzido nos estabelecimentos agropecuários advém de apenas quatro atividades. No entanto, esse valor é bem mais elevado para o segmento não familiar, o qual chega a quase 67%, do que no segmento familiar, em que aproximadamente 37% do valor produzido são gerados pelas quatro principais atividades. No total, quase 64% do valor total da produção é gerado por oito atividades (CR8), cifra que atinge 77,5% no segmento não familiar. 

Nas mesorregiões, a maior concentração encontra-se no Norte Fluminense, onde as quatro e as oito atividades principais respondem por, respectivamente, 83% e 92% do valor total da produção. Esses valores são ainda mais elevados no segmento não familiar, no qual atingem as cifras de 92 e 96%, respectivamente. Em seguida, vêm as regiões Noroeste, Sul e Baixadas, com razões de concentração na faixa de 70-75%, considerando-se as quatro principais atividades, e em torno de 85% para as oito atividades mais importes. Enquanto na região Noroeste as diferenças entre os segmentos familiar e não familiar são menores, nas regiões Sul e Baixadas, assim como na região Norte, a concentração da produção no segmento não familiar é muito maior.

 

 

Tabela 4 – Razões de concentração da distribuição da produção agropecuária total (T), não familiar (NF) e familiar (F) – Rio de Janeiro e regiões, 2006

 

Região

CR4

 

CR8

T

NF

F

 

T

NF

F

Noroeste Fluminense

73,5

76,2

71,1

 

85,9

90,1

85,8

Itaperuna

80,6

81,5

83,5

 

89,7

90,3

91,8

Santo Antônio de Pádua

75,1

83,5

72,9

 

89,7

93,3

88,4

Norte Fluminense

83,3

92,3

71,8

 

91,7

96,2

88,2

Campos dos Goytacazes

84,5

93,0

74,2

 

92,8

96,8

88,7

Macaé

84,2

87,8

79,5

 

93,1

96,5

88,3

Centro Fluminense

41,2

58,5

38,6

 

55,3

72,8

52,9

Cantagalo/Cordeiro

90,4

92,9

90,3

 

95,6

97,3

95,3

Nova Friburgo

34,7

38,0

37,5

 

50,8

60,0

54,1

Santa Maria Madalena

64,8

81,2

58,1

 

77,1

90,3

71,7

Três Rios

72,3

84,7

51,8

 

84,8

93,4

70,5

Baixadas

70,6

79,7

55,5

 

86,5

91,5

77,7

Bacia de São João

71,3

77,6

56,9

 

86,4

90,5

81,9

Lagos

80,5

88,4

60,5

 

88,6

95,3

79,3

Sul Fluminense

74,9

86,8

58,8

 

85,8

92,9

73,5

Baía da Ilha Grande

67,4

72,2

78,2

 

86,1

92,0

88,6

Barra do Piraí

90,5

93,8

81,4

 

96,5

97,9

90,4

Vale do Paraíba Fluminense

64,6

78,5

57,1

 

77,9

88,3

71,9

Metropol. Rio de Janeiro

33,7

46,4

40,6

 

54,7

66,7

56,2

Itaguaí

73,8

76,3

71,6

 

85,9

88,7

84,2

Macacu/Caceribu

46,6

69,0

49,3

 

73,0

83,4

72,3

Rio de Janeiro

54,3

59,7

52,8

 

72,5

77,4

69,5

Serrana

56,5

62,1

59,2

 

70,3

74,1

73,9

Vassouras

71,4

75,6

73,5

 

86,8

89,3

87,7

Total

46,9

66,9

37,1

 

63,7

77,5

54,4

Fonte: Resultados da pesquisa.

 

 

No caso das regiões Centro e Metropolitana, cerca de apenas 55% do valor da produção está associado às oito principais atividades, e seus índices CR4 são da ordem de 41 e 34%, respectivamente. Em ambos os casos, o segmento familiar apresenta uma agricultura mais diversificada, mas é principalmente no Centro Fluminense que as diferenças entre os segmentos são mais marcantes, com a agricultura familiar contribuindo significativamente para a diversificação da economia regional.

Observa-se que as microrregiões com agricultura menos diversificada são Barra do Piraí, Cantagalo/Cordeiro, Campos dos Goytacazes e Macaé (Tabela 4 e Figura 2). Nestes casos, quatro atividades respondem por cerca de 85-95% do valor total da produção. Exceto por Cantagalo/Cordeiro, onde há pouca diferença entre os segmentos, nos demais casos a concentração da produção na agricultura familiar é menor. Em seguida, vêm as regiões de Itaperuna e Lagos, com CR4 e CR8 próximas de 80 e 90%, respectivamente. No primeiro caso, os índices são semelhantes para os segmentos, mas piores para a agricultura familiar. Já na região dos Lagos, a concentração da produção é sustentada pelos altos índices do segmento não familiar.

 

 

Figura 2 – Classificação das microrregiões do Rio de Janeiro segundo a razão de concentração (CR4) da distribuição do valor da produção agropecuária

 

 

               

 

Em todas essas regiões a pecuária assume significativa importância, sobretudo em Barra do Piraí, onde se destaca a produção de aves, além do leite, e em Cantagalo-Cordeiro, Macaé, Lagos e Itaperuna, onde predomina a bovinocultura para corte e leite. Nesta última destaca-se ainda a produção de café, enquanto em Campos dos Goytacazes os cultivos de cana e abacaxi assumem mais relevância (Tabela 5).

Em posição intermediária encontram-se as microrregiões de Santo Antônio de Pádua, Itaguaí, Três Rios, Vassouras, bacia de São João e bahia de Ilha Grande, com índices CR4 e CR8 próximos de  70-75% e 85-90%, respectivamente. Exceto na última delas, nas demais há menor concentração da produção no segmento familiar. Porém essa diferença se alarga nas regiões de Três Rios e bacia de São João, nas quais a participação das quatro atividades principais do segmento familiar é bem menor, aproximadamente 50-55%.  

Nos demais casos, a participação das quatro e oito principais atividades fica sempre abaixo dos 65% e 80%, nessa ordem. Nesse grupo destacam-se as microrregiões Serrana, Rio de Janeiro, Macacu/Caceribu e Nova Friburgo. Nas três primeiras, a participação das quatro e oito principais atividades fica em torno de 46-56% e 70-73%, respectivamente. Já em Nova Friburgo, região do estado com os menores índices de concentração da produção, as razões CR4 e CR8 são de apenas 34 e 50%. Nessa região, assim como na região Serrana,[8] predominam produtos da horticultura (Tabela 5).

 

 

Tabela 5 – Principais produtos* e respectivas participações no valor da produção, de cada microrregião geográfica do Rio de Janeiro, 2006

*Responsáveis por 80% ou mais da produção, ou os oito mais importantes.
Fonte
: Resultados da pesquisa.

 

 

Constatam-se poucas diferenças entre as mesorregiões quanto aos coeficientes de especialização (Tabela 6), o que em parte se explica pelo efeito conjunto das diferentes estruturas produtivas das microrregiões que as compõem. Não obstante, as regiões Norte, Sul, Noroeste e Baixadas apresentam coeficientes maiores, indicando uma diferença maior entre as estruturas produtivas dessas regiões e a do estado como um todo. No segmento familiar, a região das Baixadas é a que mais difere da estrutura produtiva média do segmento familiar estadual, o que em alguma medida também ocorre com as regiões Noroeste, Norte e Sul. No segmento não familiar as diferenças entre as regiões são menores, mas indicam uma estrutura produtiva mais especializada nas regiões Noroeste, Norte e Sul.

 

 

Tabela 6 – Coeficiente de especialização regional da produção agropecuária do Rio de Janeiro, 2006

 

Região

Não familiar

Familiar

Total

Noroeste Fluminense

0,462

0,508

0,477

Itaperuna

0,497

0,667

0,572

Santo Antônio de Pádua

0,490

0,538

0,513

Norte Fluminense

0,461

0,502

0,482

Campos dos Goytacazes

0,505

0,524

0,511

Macaé

0,478

0,663

0,548

Centro Fluminense

0,316

0,330

0,329

Cantagalo/Cordeiro

0,590

0,694

0,631

Nova Friburgo

0,569

0,423

0,533

Santa Maria Madalena

0,503

0,461

0,466

Três Rios

0,488

0,440

0,478

Baixadas

0,401

0,631

0,476

Bacia de São João

0,534

0,615

0,570

Lagos

0,374

0,659

0,466

Sul Fluminense

0,449

0,495

0,478

Baía da Ilha Grande

0,764

0,748

0,739

Barra do Piraí

0,583

0,693

0,636

Vale do Paraíba Fluminense

0,432

0,491

0,453

Metropol. Rio de Janeiro

0,378

0,427

0,388

Itaguaí

0,698

0,672

0,671

Macacu/Caceribu

0,533

0,651

0,566

Rio de Janeiro

0,517

0,589

0,534

Serrana

0,667

0,642

0,653

Vassouras

0,667

0,642

0,653

Total

0,434

0,572

0,453

Fonte: Resultados da pesquisa.

 

 

As microrregiões baía da Ilha Grande, Itaguaí, Serrana, Barra do Piraí e Cantagalo-Cordeiro são aquelas onde a distribuição da produção mais difere da distribuição do estado, apresentando os mais altos coeficientes de especialização (Figura 3). Essa especialização é também elevada nas microrregiões de Itaperuna, bacia de São João e Macacu-Caceribu. Como visto na Tabela 5, essa especialização está associada aos produtos: banana (Itaguaí e baía da Ilha Grande), produtos da horticultura (Serrana), aves (Barra do Piraí), bovinocultura (Cantagalo-Cordeiro, Bacia de São João e Macacu-Caceribu) e bovinocultura e café (Itaperuna). As regiões mais especializadas do segmento não familiar são baía da Ilha Grande, Itaguaí e Serrana, além de Cantagalo-Cordeiro, Barra do Piraí e Nova Friburgo. Na agricultura familiar, destacam-se baía da Ilha Grande, Cantagalo-Cordeiro e Barra do Piraí, além de Itaguaí, Itaperuna, Macaé, Lagos, Macacu-Caceribu, Serrana e bacia de São João.

 

 

Figura 3 – Classificação das microrregiões do Rio de Janeiro segundo o coeficiente de especialização da produção agropecuária

 

 

 

 

O coeficiente de localização, exibido na Tabela 7, evidencia que as atividades mais disseminadas entre as microrregiões do estado estão ligadas à produção animal. Esse é o caso da bovinocultura, para corte ou leite, da suinocultura e da aquicultura, todas com baixos coeficientes de localização. Isso ajuda a explicar a condição relativamente mais difusa da produção de queijo e requeijão, uma atividade listada no grupo agroindústria,[9] mas com vínculos com a pecuária leiteira. Também a produção de milho e cana forrageira, atividades possivelmente atreladas à criação animal, apresenta baixos coeficientes de localização.

               

 

 

Tabela 7 – Coeficiente de localização das principais atividades agropecuárias do Rio de Janeiro, 2006

 

 

Coeficiente de Localização

Atividade

Não familiar

Familiar

Total

Bovinos

0,244

0,321

0,251

Leite de vaca

0,301

0,428

0,340

Milho em grão

0,344

0,342

0,364

Suínos

0,491

0,457

0,366

Aquicultura

0,468

0,601

0,403

Silvicultura

0,444

0,595

0,454

Mandioca

0,496

0,463

0,466

Cana forrageira

0,476

0,546

0,495

Jiló

0,616

0,404

0,506

Pimentão

0,593

0,416

0,507

Quiabo

0,586

0,515

0,518

Queijo/requeijão

0,582

0,567

0,541

Alface

0,658

0,759

0,542

Ovos

0,711

0,324

0,567

Floricultura

0,700

0,579

0,614

Tomate (estaq.)

0,697

0,524

0,619

Banana

0,705

0,606

0,632

Couve

0,667

0,531

0,639

Chuchu

0,766

0,584

0,663

Cana-de-açúcar

0,650

0,637

0,670

Aves

0,683

0,545

0,678

Coco-da-baía

0,692

0,675

0,684

Café arábica

0,719

0,836

0,697

Agrião

0,727

0,600

0,699

Couve-flor

0,836

0,590

0,717

Brócolis

0,772

0,609

0,721

Laranja

0,754

0,666

0,726

Cebolinha

0,711

0,708

0,744

Inhame

0,799

0,672

0,745

Abacaxi

0,649

0,816

0,762

 

Fonte: Resultados da pesquisa.

 

 

Já a produção de aves e ovos é mais restrita a algumas localidades, e apresenta coeficientes de localização mais elevados. Na Tabela 8,[10] na qual são apresentadas as principais regiões produtoras das trinta atividades mais importantes[11] do estado, nota-se que a produção de aves é fortemente concentrada na região de Barra do Piraí, além da Serrana, enquanto a produção de ovos situa-se principalmente na região de Três Rios. Além dessas atividades, também a silvicultura e o cultivo de mandioca apresentam coeficientes de localização relativamente baixos.

No extremo oposto, com produção fortemente concentrada em algumas regiões, encontram-se as lavouras de abacaxi, laranja, café e cana-de-açúcar, e alguns produtos da horticultura, como inhame, cebolinha, brócolis, couve-flor e agrião. Enquanto os cultivos de abacaxi e cana concentram-se fortemente na microrregião de Campos dos Goytacazes, a produção de café situa-se principalmente na região de Itaperuna (Tabela 9). Também nesta região, juntamente com as regiões de Rio de Janeiro, Macacu-Caceribu e Lagos, concentra-se a maior parte da produção de laranja. A produção de cebolinha, brócolis e agrião é fortemente concentrada na região Serrana. A produção de couve-flor, outra cultura importante da região Serrana, concentra-se principalmente em Nova Friburgo, também a principal responsável pela produção de inhame.

 

 

Tabela 8 – Principais regiões produtoras e respectivas participações no valor da produção, de cada atividade agropecuária do Rio de Janeiro, 2006

*Responsáveis por 80% ou mais da produção, ou os oito mais importantes.
Fonte
: Resultados da pesquisa.

 

 

De modo geral, os menores coeficientes de localização encontram-se no segmento familiar, o que só não ocorre com as culturas de abacaxi, alface, café e cana forrageira, e também na silvicultura, na bovinocultura (corte e leite) e na aquicultura. Nota-se, na Tabela 9, que a agricultura familiar tem participação igual ou superior ao segmento patronal em dezessete dos principais produtos da agropecuária fluminense. Essa importância avulta sobretudo em produtos da horticultura, produzidos majoritariamente pela agricultura familiar. Com exceção apenas de três atividades (aves, silvicultura e ovos), em todas as demais a importância da agricultura familiar na produção é proporcionalmente superior à área que ocupa, cerca de 23% da área total de estabelecimentos agropecuários do estado.

 

 

Tabela 9 – Participação da agricultura familiar no valor da produção dos principais produtos do estado do Rio de Janeiro, 2006

 

Fonte: Resultados da pesquisa.

 

 

A tendência de maior dispersão das atividades da agricultura familiar entre as regiões deve-se, provavelmente, à importância que muitas delas ocupam na alimentação. Isso também ajuda a explicar os melhores índices de diversificação observados para esse segmento. No segmento não familiar, a localização das atividades resulta de vantagens comparativas de determinadas regiões, associadas a condições edafoclimáticas, de relevo, de localização, de infraestrutura de transportes, dentre outras, que se traduzem numa produção mais competitiva. Na agricultura familiar, a produção desse bem para o autoconsumo pode ainda ser interessante mesmo em regiões onde aquelas vantagens não estão presentes, uma vez que o custo de produção, ainda que não competitivo para a venda, pode resultar inferior ao custo de aquisição desse mesmo produto no mercado.

Outra questão refere-se às diferenças na dotação de recursos e seus efeitos sobre a escolha do que produzir. No segmento patronal, nas localidades com relevo adequado, o leque de atividades possíveis é maior, dada a possibilidade de mecanização das atividades e redução do emprego da mão de obra. Em relevos acidentados, esse leque diminui, já que a mecanização não é possível, e a tendência é a opção por atividades pouco intensivas em mão de obra, como a pecuária extensiva e a silvicultura. No segmento familiar, supondo menores a escassez e o custo da mão de obra, a produção de determinadas atividades em regiões com relevo acidentado contorna em alguma medida essa limitação com um processo produtivo mais intensivo em trabalho.

Por contra desses fatores, entende-se que a distribuição regional da produção das atividades no segmento familiar tende a uma menor rigidez, com índices de localização mais baixos.[12] Pela mesma razão, numa dada região a produção da agricultura familiar tende a ser mais diversificada, sobretudo se, por condições de relevo ou disponibilidade de mão de obra, as opções do segmento não familiar tornarem-se limitadas a produtos menos intensivos nesse fator. 

 

 

Conclusões

Constatou-se que a maior parte do valor da produção agropecuária do Rio de Janeiro concentra-se nas regiões Metropolitana, Norte Fluminense e Centro Fluminense. Nelas, destacam-se as microrregiões Serrana, Campos dos Goytacazes e Nova Friburgo, onde se encontra quase metade do valor da produção do estado. Observou-se ainda a importância elevada do segmento familiar no estado, sobretudo nas regiões Noroeste, Centro e Metropolitana, onde se destacam, respectivamente, as microrregiões Santo Antônio de Pádua, Nova Friburgo e Serrana. A menor importância desse segmento ocorre no Sul Fluminense e nas Baixadas.

Em termos de diversificação da produção, constatou-se que as mesorregiões Metropolitana e Centro Fluminense têm a produção agropecuária mais diversificada do estado. Na primeira, destacam-se as microrregiões de Macacu/Caceribu, Rio de Janeiro e Serrana, com altos índices de diversificação da produção. Na região Centro Fluminense, a produção mais diversificada encontra-se na microrregião de Nova Friburgo, seguida de Santa Maria Madalena e Três Rios. Já nas mesorregiões Norte e Sul estão os índices de diversificação mais baixos. Campos dos Goytacazes, no primeiro caso, e Barra do Piraí, no segundo, juntamente com a microrregião de Cantagalo-Cordeiro, na região Centro Fluminense, são as microrregiões com menor diversificação agrícola do estado.  

Constatou-se que a maior parte do valor da produção da região Norte, mas também das regiões Noroeste, Sul e Baixadas, concentra-se em poucos produtos. Nas microrregiões, isso ocorre particularmente em Barra do Piraí, Cantagalo/Cordeiro, Campos dos Goytacazes, Macaé, Itaperuna e Lagos. Nessas regiões predominam a pecuária, com a criação de aves (Barra do Piraí) e a bovinocultura (Cantagalo-Cordeiro, Macaé, Lagos e Itaperuna), a produção de cana-de-açúcar e abacaxi (Campos dos Goytacazes) e a cafeicultura (Itaperuna). Em situação oposta, encontram-se as microrregiões Serrana, Rio de Janeiro, Macacu/Caceribu e Nova Friburgo. Esta última, onde predomina a produção familiar de gêneros da horticultura, é a região do estado onde o valor da produção está associado a um maior número de produtos.

As atividades mais disseminadas entre as microrregiões do estado estão ligadas à produção animal, com destaque para a bovinocultura, a suinocultura e a aquicultura. A exceção é a avicultura, com produção de aves fortemente concentrada na região de Barra do Piraí, bem como a produção de ovos, baseada principalmente na microrregião de Três Rios. Em situação oposta, encontram-se as lavouras de abacaxi, laranja, café e cana-de-açúcar, e alguns produtos da horticultura, especialmente inhame, cebolinha, brócolis, couve-flor e agrião. Esses produtos estão fortemente associados a determinadas microrregiões, como Campos dos Goytacazes (abacaxi e cana), Itaperuna (café e laranja), Rio de Janeiro, Macacu-Caceribu e Lagos (laranja) e regiões Serrana e Nova Friburgo (produtos hortícolas).

De modo geral, os melhores índices de diversificação estão na agricultura familiar, responsável por grande parte dos principais produtos da agropecuária estadual. A importância da produção para autoconsumo e as possibilidades advindas do aproveitamento da mão de obra familiar em atividades intensivas em trabalho, como é caso da horticultura, são fatores que ajudam a explicar essa diversificação. Na ausência de tal segmento, a agricultura do estado, em especial nas regiões menos propícias ao desenvolvimento de uma agricultura intensiva em capital, estaria confinada a um número restrito de atividades. Em síntese, os resultados vão no sentido de reafirmar a importância do segmento familiar para o desenvolvimento rural.

 

 

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Resumo: (Análise regional da produção agropecuária do Rio de Janeiro, considerando-se os segmentos familiar e não familiar). As regiões do estado do Rio de Janeiro apresentam diferentes condições climáticas, de relevo, de estrutura fundiária, e foram marcadas por processos históricos de formação diferenciados. Disso resultam distintas dinâmicas produtivas regionais, em particular na agricultura. Com o uso de medidas de concentração, diversificação, especialização e localização, buscou-se caracterizar as diferenças regionais quanto à produção agropecuária do estado, considerando-se os segmentos familiar e não familiar. Foram observadas significativas diferenças regionais quanto aos índices calculados, e constatada a importância da agricultura familiar, principalmente nas regiões Noroeste, Centro e na Metropolitana, onde se destacam, respectivamente, as microrregiões Santo Antônio de Pádua, Nova Friburgo e Serrana. Como os melhores índices de diversificação encontram-se nessa agricultura, seu papel na diversificação da economia agrícola do estado tem sido marcante.

Palavras-chave: economia regional; desigualdades; agricultura familiar.

 

Abstract: (Regional analysis of agricultural production of Rio de Janeiro, considering the family and non-family sectors). The regions of the Rio de Janeiro present different conditions in terms of climate, relief and property structure, and were formed by different historical processes. This results in distinct regional productive dynamics, particularly in agriculture.In this research, using concentration, diversification, specialization and location measures, the objective was to characterize regional differences in agricultural production of Rio de Janeiro, considering family and non-family farmers.Significant regional differences were observed in respect to the measuresconsidered. The results show the importance of family farming, mainly in the Northwest, Center and Metropolitan regions, where the most important microregions are Santo Antônio de Pádua, Nova Friburgo and Serrana.As the best measures of diversification are found in this agriculture, its importance in diversifying the state's agricultural economy is evident.
Keywords: regional economy; inequalities; family farming.

 

 

 

Recebido em maio de 2019.

Aceito em agosto de 2019.



[1] Doutorado em Economia Aplicada pela Universidade Federal de Viçosa (UFV) e professor da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF). E-mail: pmsouza@uenf.br.

[2] Doutoranda em Extensão Rural pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). E-mail: hadmamilaneze@hotmail.com.

[3] Pós-doutorado no Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (CPDA/UFRRJ) e professor adjunto da Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária da Universidade de Brasília  (FAV/UnB). E-mail: armandouenf@yahoo.com.br.

[4] Doutorado em Economia Aplicada pela Universidade Federal de Viçosa (UFV) e professor associado I da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF). E-mail: ponciano@uenf.br.

[5] Como essas medidas baseiam-se em variáveis de participação relativa, disparidades quanto ao tamanho das mesorregiões não afetam os resultados (LIMA et al., 2006b). Tratam-se, portanto, de medidas adequadas ao presente caso, visto que há diferenças entre regiões em termos de estabelecimentos, área, pessoal ocupado e valor da produção. 

[6] No início século XX, a região do Vale do Paraíba sofreu grande impacto, com esvaziamento econômico e demográfico, associado ao declínio da cafeicultura. A degradação dos solos e o fim da escravidão no término do século anterior conduziram ao abandono dos cafezais, substituídos por uma pecuária extensiva e poupadora de mão de obra (GALVÃO, 1986).

[7] Segundo Marafon (2006), na Região Serrana predomina a produção de hortigranjeiros em pequenas propriedades. Além disso, seu relevo acidentado dificulta  o uso de máquinas (SIMÕES, 2010), daí resultando uma agricultura baseada no uso intensivo de trabalho e tecnologias químico/biológicas, que se refletem no aumento da produtividade da terra.

[8] Conforme Egger (2010), essa região passou por um processo de mudanças no perfil da produção, anteriormente baseada em culturas tradicionais para alimentação dos agricultores, que cederam espaço a uma horticultura intensiva e modernizada, com a utilização de agrotóxicos, sementes industrializadas e adubos químicos. 

 

[9] Quase 80% do valor da produção agroindustrial dos estabelecimentos está associado a esses produtos. Em seguida, com importância bem menor, vêm aguardente de cana (10%), doces e geleias (6%) e farinha de mandioca (2,5%).

[10] Nessa tabela são apresentadas as regiões responsáveis por 80% ou mais do valor de cada atividade (quando esse valor se concentra em poucas regiões), ou as oito regiões mais importantes (em conexão com o CR8). 

[11] Essa classificação considerou, sempre que possível, as atividades produtivas de cada grande grupo (por exemplo, bovinos, suínos, leite de vaca etc., em vez de produção animal). No entanto, no caso da silvicultura e da floricultura, o detalhamento do censo não pode ser considerado uma atividade específica. No primeiro caso, o valor da produção é dividido em lenha, madeira (cerca de 72% do valor produzido é de madeira, para papel ou outra finalidade), mudas etc. Na floricultura, flores, gramas, mudas, sementes etc. são as fontes do valor da produção. Por essa razão, esses dois grupos foram considerados como atividades. Quanto à aquicultura, que tem 73% de seu valor atrelado a peixes, optou-se por considerá-la em conjunto, para que figurasse entre as atividades mais importantes. Já o valor da extração vegetal (72% do qual está associado à coleta de palmito) não chega a ser expressivo, mesmo se consideradas todas as atividades. No total, as 30 atividades resultantes desse procedimento representam aproximadamente 90% do valor da produção agropecuária do estado (cerca de 95% do segmento familiar e 85% do não familiar), e uma faixa que vai de 75% a 98% do valor produzido em cada região.

[12] Essa é uma importante característica da agricultura familiar, uma vez que as condições para o exercício de uma agricultura intensamente mecanizada não estão presentes em todos os estados e municípios brasileiros. Nestes casos, em especial, o desenvolvimento de uma agricultura mais produtiva e diversificada passa, necessariamente, pelo apoio à agricultura familiar.