Estudos Sociedade e Agricultura
vol. 27, n. 2, junho a setembro de 2019

 

 

 

Maria Luiza de Andrade Benini[1]

Roberto Donato da Silva Júnior[2]

 

 

 

Traçando possibilidades metodológicas para os desafios dos estudos do consumo na agroecologia

 

 

 

Introdução

A agroecologia propõe a inserção de práticas sustentáveis à produção agrícola e, consequentemente, a criação de novos canais de comercialização e de formatos de consumo que dialoguem com a proposta de sustentabilidade. Nesse contexto, a criação de novos mercados, com a intenção de consumidores mais atentos a cadeias de abastecimento alimentar, é eminente e urgente. Experiências como feiras do produtor, grupos de consumo responsáveis e de CSA (Community Supported Agriculture) surgem como possibilidades pautadas em ações que pretendem aproximar agricultores e consumidores e propõem a possibilidade de novos formatos de consumo.

As feiras de produtores superam a perspectiva de serem espaços de comercialização e trocas mercantis e funcionam como ambientes de sociabilidade e de fomento das relações sociais. São ainda espaços que funcionam tanto para comercialização quanto para troca de informações e conhecimentos entre agricultores e consumidores (CASSOL, 2013). O Grupo de Consumo Responsável é caracterizado por ser uma articulação de consumidores que desejam comprar diretamente do produtor (INSTITUTO KAIROS E CAPINA, 2013). São ainda práticas vivenciadas entre consumidores e produtores, nas quais, como proposição, o ato de compra vincula-se a uma ação política, que objetiva fortalecer e fomentar tanto a sua própria experiência quanto melhores circunstâncias do planeta (INSTITUTO KAIRÓS, 2011). A CSA surge na tentativa de propor novos formatos de financiamento do trabalho no campo, com o compartilhamento de benefícios e riscos enfrentados na produção agrícola, desde o planejamento e produção até a colheita do alimento (TORUNSKY et al., 2015).

Os esforços na criação e desenvolvimento desses novos espaços e o aumento do número dessas experiências não são um reflexo do desenvolvimento científico da temática do consumo na agroecologia, já que há uma prevalência em pesquisas relativas à produção agrícola perante o consumo. Esse descompasso pôde ser observado em uma breve análise de artigos publicados na Web of Science e no portal de periódicos da Capes nos últimos dez anos. A primeira busca em ambas as plataformas foi por artigos com a combinação consumo e agroecologia. Posteriormente foi realizada busca para produção e agroecologia. No primeiro caso, foram encontrados 37 artigos na plataforma Web of Science e 26 (para esse número foram lidos todos os resumos dos artigos) no portal de periódicos da Capes. Para as buscas relativas à produção e à agroecologia, foram encontrados 415 na Web of Science e 978 nos periódicos da Capes. Além de o consumo ser pouco priorizado quantitativamente nas publicações agroecológicas, grande parte das pesquisas se propõe a fazer uma análise descritiva em torno do perfil do consumidor, na tentativa da identificação desse perfil para traçar alternativas de escoamento da produção agrícola. Essa abordagem, além de apresentar alcance explicativo limitado, ainda trata o consumo como resultado do escoamento da produção agrícola, reforçando a hierarquia entre produção e consumo. Esse descompasso, além de gerar diversas questões não respondidas, implica o desenvolvimento de pesquisas e o incentivo financeiro a projetos. Em uma breve análise do Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica – Planapo (BRASIL, 2013), é possível observar que grande parte dos recursos financeiros é investida na produção. O consumo dispõe de aproximadamente quatro vezes menos recurso do investimento do que a produção. Ainda, as ações relativas ao consumo, quando aparecem no Plano, estão vinculadas ao processo de comercialização.

Mas quais são as explicações bibliográficas para esse descompasso visualizado nas relações entre produção e consumo? Como viabilizar metodologicamente e incorporar uma redefinição das relações entre produção e consumo no contexto da agroecologia? Esse artigo pretende apresentar elementos que possam desvelar o por que de as discussões relativas ao consumo terem sido pouco valorizadas até a década de 1970, e quais as implicações disso nos debates atuais. Ainda, pretende observar algumas abordagens do consumo advindas de outros campos teóricos, a fim de refletir sobre o consumo por meio de outras perspectivas e contribuir com essa discussão dentro do campo da agroecologia. Para isso, apresenta-se o entendimento de mercados dentro do campo da economia e da perspectiva sociológica, por meio de elementos da sociologia econômica e da nova sociologia econômica. O consumo é abordado a partir dos debates da sociologia e antropologia do consumo, principalmente.

Compreender as diversas vertentes do consumo, seus entendimentos e desdobramentos torna-se relevante para a criação e desenvolvimento de novos formatos de comercialização e novas relações entre produção e consumo. Assim, ao final, pretende-se trazer elementos que possam fomentar outras discussões, pouco incorporadas no âmbito da agroecologia, para que o consumo possa ser compreendido por meio de moldes mais complexos.

 

Discussão

Mercado e consumo, entre a dicotomia do bem e do mal

O campo disciplinar da economia consolidou-se como responsável pela compreensão sobre mercados, principalmente após a estabilização da visão neoclássica. A economia, na abordagem neoclássica, é compreendida como um campo autônomo, formado por regras e normas que estaria à parte da vida social. Consequentemente, o mercado é entendido como uma entidade autossuficiente, que se estrutura a partir de transações e por compras e vendas. Tais ações seriam fluidas e estáveis devido à concorrência, consolidando a ideia de um suposto equilíbrio geral (ABRAMOVAY, 2004).

Granovetter (2007) afirma que a racionalidade é a grande base para esta corrente teórica. A economia é considerada um campo específico, separado da sociedade, em que as transações econômicas são regidas por cálculos racionais baseados em interesses individuais, e não mais por obrigações sociais ou parentais. Assim, produção, distribuição e consumo não seriam influenciados por impactos advindos da estrutura social. E a sociologia mantinha-se distante dos estudos econômicos e de mercado.

A proposta neoclássica reafirma tanto a perspectiva autorreguladora quanto a autorrequilibrada, sugerida pelos autores clássicos. Apresenta a proposta de uma teoria de equilíbrio econômico geral e da utilidade marginal (PRADO, 2001). Nessa proposta, pressupõe-se a existência de um sistema de preços de mercados, composto por preços dos bens de consumo, de bens intermediários, de serviços produtivos, de capital e de capital-dinheiro (taxa de juros), em que estes são dispostos a fim de obter a maximização da satisfação e/ou da utilidade. Como fundamento dessa abordagem, está um indivíduo alheio a relações sociais e que busca satisfazer seus interesses (GANEM, 2012).

Nesse contexto, a concepção do valor vincula-se à utilidade e riqueza delimitada por meio da escassez, contrariando a proposta clássica sugerida por Marx, por exemplo, que associava o trabalho à origem do valor (GANEM, 2012). O indivíduo tornar-se um agente que realiza escolhas a partir da maximização da utilidade, ou seja, busca obter o máximo benefício por unidade de dispêndio de seus recursos escassos (PAIVA; CUNHA, 2008, p. 15). Assim, todas as suas decisões são racionais e tomadas a partir de seu próprio interesse. Entretanto, um consumidor, nesse cenário, pode gerar um desequilíbrio na circulação de bens, causando assimetrias entre oferta e procura. Na tentativa de resolução dessa assimetria, surge a proposta da teoria do equilíbrio geral, na qual em um ambiente descentralizado, formado por atores individuais e racionais, o mercado se autorregulava (WALRAS, 1986). O mercado, como um ambiente autônomo, se equilibra a partir de regras e situações geradas dentro de seu próprio contexto, atingindo sua eficiência máxima com a utilização eficiente de matéria-prima. Os preços são gerados pelo interesse dos próprios consumidores e equilibram-se por meio da concorrência (MEIRELLES, 2010).

A economia neoclássica ainda influencia e fundamenta o entendimento sobre mercados na situação atual, contudo, há diversas críticas quanto à perspectiva racionalista. Resico (2012) afirma que o entendimento sobre o racionalismo de mercado é uma concepção mecanicista, em que os processos são preestabelecidos por uma relação fixa e invariável de causa e efeito” (p. 75). Ou seja, o mercado nessa abordagem é compreendido como uma entidade abstrata e inacessível em que as relações são sempre determinadas previamente, independentemente de causas e efeitos. Ainda, o homo economicus ou “homem econômico racional” deveria ser compreendido como uma idealização, e não como uma representação da realidade, já que em nosso cotidiano não tomamos decisões de forma racional (RESICO, 2012).

Após diversos questionamentos referentes à configuração estável e racional proposta pela economia neoclássica, e quando tornam-se evidentes os limites da teoria econômica, surge no final do século XIX a proposta da sociologia econômica, a partir das contribuições de modelos analíticos da sociologia nos estudos de fenômenos econômicos (RAUD-MATTEDI, 2005). Nessa proposta, destacam-se autores como Pareto, Durkheim e Weber.

Pareto reconhece a relevância na combinação de estudos relativos ao comportamento humano e de aspectos econômicos. No Manual de Economia Política, o autor deixa claro sua intenção de incorporar as contribuições das Ciências Sociais ao desenvolvimento da economia. Pareto (1987) pretende complexificar a proposta da economia pura, sugerida pelos neoclássicos, iniciando seu argumento com a compreensão de que o homo economicus não seria tão racional como se sugeria, já que toma suas decisões a partir de desejos. Pareto (1987) não nega a racionalidade do indivíduo, porém acrescenta a “não racionalidade” e incorpora aspectos relevantes no debate da construção social dos mercados, por meio do reconhecimento da subjetividade presente nas escolhas individuais.

Durkheim, ao desenvolver As Regras do Método Sociológico, descreve regras, acordos e leis como fatos sociais.[3] A delimitação desse conceito tornou possível outra abordagem para o entendimento do funcionamento dos mercados (DURKHEIM, 1999). Conforme argumentado por Raud-Mattedi (2005), Durkheim não conceitua o termo ‘mercado’, contudo, afirma que quando um indivíduo se sujeita a normas sociais formais ou informais (como as trazidas pelas tradições ou condutas morais), elaboradas de maneira coletiva, dentro de uma perspectiva temporal, ele insere-se em um contexto de relação social. Ou seja, conforme coloca Raud-Matted (2005, p. 129), “a relação mercantil gera um laço social mesmo sem passar por relações pessoais íntimas, na medida em que esse laço não se esgota no único ato da troca, mas se enraíza e participa do processo de reprodução das instituições sociais”.

Marcel Mauss dialoga e contribui com a proposta durkheimeana. O autor (1999) sugere haver um valor simbólico a cada objeto ou serviço a ser trocado, capaz de estabelecer vínculos. Esses sistemas de troca, mercantilizado ou não, representam um fato social (MAUSS, 1999). Mauss complexifica as motivações envolvidas nas trocas de mercadorias. Com isso, rompe com a proposta do homo economicus (MARTINS, 2005). Em sua proposta relativa à teoria da Dádiva (1988), descreve diversos sistemas de trocas de diferentes culturas, em que as ações de dar, receber e retribuir desempenham outras formas relacionais.

Weber (1991), ao descrever sua proposta de ‘tipos sociais’, afirma que o interesse do sociólogo não são as análises individuais, mas as abordagens que se aproximam das instituições propostas por Durkheim. Assim, o autor descreve três instituições que regulam o mercado: o Direito, a convenção e o uso/costume. Weber propõe observar o mercado como um campo de interação econômica e acrescenta a perspectiva temporal em sua proposta (RAUD-MATTEDI, 2005). Para esse autor, o mercado é um ambiente resultante de configurações de interação social, regido por situações de conflito de interesses, em um cenário equilibrado com a concretização de troca efetiva (RAUD-MATTEDI, 2005).

A sociologia econômica não intenciona negar terminantemente as propostas da teoria econômica neoclássica, entretanto, não objetiva considerá-las como uma abordagem definitiva. Pretende estabelecer conexões entre as análises sociológicas e econômicas, na intenção de melhor compreender os aspectos socioeconômicos. Assim, não se opõe à concepção do indivíduo egoísta, mas sugere expor a questão a partir de outras abordagens. (STEINER, 2006). 

Abramovay (2004) reconhece que nos últimos 20 ou 30 anos, houve uma mudança significativa no âmbito da economia, onde a perspectiva de um campo autônomo, formado por atores egoístas que interagem eventualmente a favor de um equilíbrio geral, tornou-se somente uma parte dessa disciplina. Aspectos subjetivos, em decorrência das contribuições da sociologia econômica foram incorporados, surgindo a proposta da nova sociologia econômica. A partir dessa abordagem, o mercado passou a ser entendido como um ambiente formado por indivíduos que podem desejar cooperar ao mesmo tempo em que competem entre si, o que extrapola o entendimento puramente racionalista. A nova sociologia econômica objetiva contribuir, por meio de análise sociológica, nas questões econômicas centrais (STEINER, 2006).

Para Wilkinson (2008), a nova sociologia econômica desenvolve uma abordagem para explicar os mercados a partir de redes sociais, por meio da proposta de embeddedness ou enraizamento de Granovetter. Granovetter (2007) realiza uma leitura sobre o contexto econômico por meio do papel de relações sociais concretas e pelas estruturas (ou redes), baseadas em confiança. Wilkinson (2008), ao se colocar sobre a perspectiva de embeddedness, apresenta e discorre sobre os dados empíricos da pesquisa sobre empregos realizada por Granovetter. Conforme os resultados dessa, o acesso ao mercado de empregos ocorre de forma mais satisfatória por meio da inserção em redes sociais. Aqueles que foram contratados em consequência de processos formais tendem a ser mais mal remunerados. Essa situação tem como premissa o argumento de que os indivíduos tomam decisões a partir de recordações e conhecimentos de relações que vivenciam.

O grande diferencial desta abordagem de embeddedness ou enraizamento, é que ela não está fundamentada em generalizações, sendo que cada conjuntura deve ser determinada conforme especificidades de sua própria estrutura social. Conforme o autor exemplifica, muitas empresas estrangeiras não compreendem os tipos de negociações que ocorrem no contexto do mercado japonês, já que para os japoneses, as negociações iniciam-se no contexto das relações pessoais, assim, encontros como happy hours são propícios para o estabelecimento de relações e acordos (GRANOVETTER, 2007).

Wilkinson (2008, p. 93) apresenta as contribuições da proposta de embeddedness afirmando que:

Em primeiro lugar, a reinterpretação de embeddedness em termos de redes sociais permite demonstrar a maneira em que a ação econômica é permanentemente filtrada por relações sociais. Em segundo lugar, essa noção de redes sociais é desdobrada em uma tipologia que permite correlacionar distintos padrões de comportamento econômico com determinados tipos de redes.

Assim, o mercado passa a ser compreendido como um espaço real, repleto de encontros, desencontros e confrontos entre os atores.

Wilkinson (2016) considera essencial o esclarecimento de que a diversidade de atores envolvidos com o processo de formação de mercados extrapola os produtores diretos, assim, torna-se importante a inserção de formadores de opiniões nesse contexto, por exemplo. Os mercados são ambientes onde a concorrência existe, sendo comuns processos de disputas, inclusões e exclusões. Ainda, os consumidores tornam-se importantes na formação de mercados a partir do momento em que são realizadas avaliações sociais e ambientais, originárias dos interesses públicos e mesmo dos próprios consumidores.

Mas será que a observação de mercados enquanto espaços de interação nos coloca defronte das complexidades que os envolvem? Será que a partir de tais perspectivas apresentadas nos afastamos das abordagens já consolidadas sobre essa temática, o que possibilita a compreensão a partir de outras óticas? 

Abramovay (2004) argumenta que uma das características das ciências sociais contemporâneas é o fortalecimento de trabalhos interdisciplinares, principalmente no campo da economia. Esta configuração possibilitou um ambiente propício para diversas discussões, como o estudo dos mercados de maneira complexa. Contudo, o autor relembra que imperam duas visões distintas do mercado. A primeira refere-se a um ambiente enaltecido, superior aos indivíduos, enquanto que a outra se remete a um ambiente obscuro, onde se predominam interações egoístas e individualistas. Conforme o autor, nenhuma dessas extremidades mostra-se capaz de confrontar os desafios contemporâneos de uma sociedade descentralizada, onde existem ambientes cooperativos (ABRAMOVAY, 2004).

No contexto dos estudos da agricultura familiar, o entendimento do mercado enquanto um sinônimo de capitalismo ou de economia de mercado tem gerado incômodo em estudiosos, sendo tal debate foi explorado por outros campos disciplinares. Entretanto, Schneider (2016) afirma que ao deslocar o entendimento de mercado como uma estrutura homogênea, torna-se possível incorporar a diversidade e a heterogeneidade nesse debate, sendo mais adequado à agricultura familiar.

Appadurai (2008) e Kopytoff (2008) podem contribuir (e tranquilizar) na discussão presente no contexto dos movimentos sociais e da agricultura familiar com relação aos mercados. Appadurai (2008) afirma que o termo mercadoria no contexto contemporâneo refere-se a bens manufaturados, ou serviços e é vinculado ao modo de produção capitalista.  Relacionamos ‘coisas’ e mercadorias, e conferimos à mercadoria um sentido pejorativo. Tal compreensão origina-se na perspectiva de estudos marxistas, onde a mercadoria era a representação última do processo produtivo. Appadurai (2008, p. 25) explica que:

Ademais, enquanto presentes vinculam coisas a pessoas e inserem o fluxo de coisas no fluxo de relações sociais, mercadorias supostamente representam o movimento — em grande parte livre de coerções morais ou culturais – de bens uns pelos outros, movimento mediado pelo dinheiro, não pela sociabilidade.

O autor demonstra que tal perspectiva dualista seria ‘exagerada e simplista’.As ‘coisas’, assim como os seres humanos são dotados de uma vida social, independente de ocupar o lugar de mercadoria ou não. Para superar tal dualidade de pensamento, Appadurai (2008, p. 27) sugere:

...olhar para o potencial mercantil de todas as coisas, em vez de buscar em vão a mágica distinção entre mercadorias e outros tipos de coisas. Também significa romper de um modo categórico com a visão marxista da mercadoria, dominada pela perspectiva da produção, e concentrar-se em toda a trajetória, desde produção, passando pela troca/distribuição, até o consumo.

Kopytoff (2008) sugere que sejam analisadas as histórias de vida das ‘coisas’, por meio de uma construção biográfica. A partir desta percepção, o autor propõe que mercadorias não sejam consideradas coisas em si, mas uma etapa que essa pode assumir em sua história de vida. O mesmo autor conceitua mercadoria como:

algo que tem o valor de uso e que pode ser trocado por uma contrapartida numa transação descontínua, sendo que o próprio fato da troca indica que a contrapartida tem um valor equivalente, dentro do contexto imediato. A contrapartida de acordo com a mesma lógica, é também uma mercadoria na hora em que foi trocada. A troca pode ser direta ou pode ser feita de forma  indireta mediante dinheiro. (KOPTTOFF, 2008, p. 95)

O impacto dos entendimentos de mercadoria baseados em julgamentos dentro das ações e de consumo é visível. Mesmo sendo o consumo, segundo Barbosa e Campbell (2006), a ação que realmente todos os seres humanos realizam constantemente, diferentemente da produção, “Não trabalhar é um estigma, enquanto não consumir é uma qualidade, moralmente superior ao inverso” (BARBOSA; CAMPBELL, 2006, p. 21). Mas por que temos tanto receio do ato de consumir? Será que tais receios são frutos somente dos entendimentos pejorativos dados à mercadoria? Quais seriam outras possibilidades de entendimentos sobre esse tema?

Apesar de diversos entendimentos para o consumo no contexto contemporâneo, as discussões, em sua maioria, caracterizam-no desde um ato supérfluo até uma ação afetiva. Barbosa e Campbell (2006) mostram que esta ambiguidade no entendimento do consumo ocorre, inclusive, devido a sua etimologia. Consumo, do latim consumere, significa esgotamento, enquanto consummation, do inglês, possui sentido do verbo adicionar. Os mesmos autores relatam que no Brasil nos aproximamos do entendimento proveniente do latim. Assim, relacionamos o consumo a um significado negativo e desenvolvemos discussões a partir de uma perspectiva repleta de preconceitos e desconfortos.

A concepção negativa, segundo Goodman e DuPuis (2002), ocorre também nas discussões relativas aos sistemas agroalimentares, abordados pela sociologia rural, e pode ser explicada em virtude de um processo histórico. Boa parte dos debates que compõem esse campo é influenciada por uma abordagem marxista, em que a produção relaciona-se ao sentido de poder e a mercadoria acoberta suas relações exploratórias. Os consumidores são considerados passivos, interagindo somente no âmbito não político referente à circulação, pois não teriam conhecimento das desigualdades que estão por trás da mercadoria. Nesse sentido, afirmamos orgulhosamente que trabalhamos e produzimos, mas nos sentimos individualistas e alienados quando assumimos que consumimos. Miller (2007) e Duarte (2010) também comentam a relação entre a influência das propostas marxistas e o interesse pela produção diante do consumo.

Douglas e Isherwood (2004) se colocam a partir de uma crítica às visões do consumo, em que, num ato de futilidade, o consumidor é classificado como um ser irracional. Para os autores, a prática do consumo está repleta de simbolismos, valores morais e culturais, e deve ser compreendida como relação social a ser observada sem preconceitos. Com olhar semelhante, Miller (2002) afirma que um ato de compra realizado para suprir as necessidades de um lar é reconhecido como atitudes de responsabilidade e cuidado capazes de construir vínculos sociais — valores esses, materializados em atos de amor. Carneiro (2012) sustenta que, com base nessa perspectiva de Miller, o fator determinante para o ato da compra não é tão intensamente definido pela lógica financeira, mas pela lógica do afeto. 

Para Tretmann (2004), o fato de o foco da discussão referente ao consumo centralizar-se no ato de compras de bens, no qual prevalece a abordagem do consumidor individualista e de instituições comerciais, capazes de pautar as características da sociedade, é uma perspectiva problemática. Principalmente quando se cria a impressão de uma sociedade consumista, o que no limite nos causa a falsa percepção da possibilidade de julgamento do que é necessidade e/ou consumo exagerado para o outro. Portilho e Catañeda (2009, p. 3) afirmam que características relacionadas tradicionalmente à “sociedade de consumo” como egoísmo, individualidade, superficialidade, alienação têm se mostrado contrárias às particularidades e valores de responsabilidade, coletividade, solidariedade e cidadania, observadas empiricamente nos processos de consumo.

Duarte (2010) afirma o desinteresse da antropologia diante dos estudos sobre o consumo devido à forma como ela estruturou suas pesquisas nas sociedades pré-industriais. Com isso, criou-se uma dicotomia: de um lado sociedades pré-industriais nas quais prevaleciam os sistemas de dádiva, com base em trocas não mercantilizadas (MAUSS, 1988), e se estabeleciam laços de relações sociais, e de outro, sociedades industriais (ou de mercadoria) com a predominância dos bens de massa, em que o presente (elemento da dinâmica da dádiva) é substituído pela mercadoria.

A mesma autora assegura que por volta dos anos 1970 iniciou-se o movimento da antropologia do consumo. Nesse período, o debate sobre o consumo e a compreensão das possíveis construções sociais que podem emergir a partir desse fortaleceram-se. Entretanto, até a década de 1980, prevaleceu a preferência pelo desenvolvimento de pesquisas relativas à produção no contexto das ciências sociais, com a confiabilidade de que por meio dessas seria possível entender o funcionamento da sociedade capitalista (BARBOSA; CAMPBELL, 2006).

Já nos anos 1980, a antropologia do consumo se consolida como uma temática transversal e um subcampo acadêmico em diversas disciplinas. Os estudos sobre consumo tornam-se independentes das abordagens sobre os sistemas produtivos, contudo, ainda permanecia enraizada a ideia do consumo alienante, vinculado à cultura de massa (DUARTE, 2010). Apesar da abertura para pesquisas relativas ao consumo, essas ainda apareciam conectadas aos discursos marxistas, permanecendo a perspectiva da imoralidade vinculada ao consumo (BARBOSA; CAMPBELL, 2006).

Qundo se olha para essa sociedade de consumidores e para sociedades que realizavam trocas não mercantilizadas, como as apresentadas por Mauss (1988), é possível transformar a própria proposta antropológica e assumir “o consumo moderno no papel de um dos principais vilões da humanidade e do próprio capitalismo” (BARBOSA; CAMPBELL, 2006, p. 30). Assim, a possibilidade de uma antropologia do consumo só começou a ser viável quando se compreendeu haver uma heterogeneidade no consumo de massa (MILLER apud BARBOSA; CAMPBELL, 2006). Surge também outra vertente de estudos que propõe o consumidor como agente ativo do ato de consumo, fomentando a ideia do consumo como elemento de construção social. Portilho e Barbosa (2016) afirmam que nesse período não apenas a antropologia, como também o campo das Ciências Sociais como um todo, começa a desenvolver estudos sobre o consumo com perspectiva sociológica e analítica, com o intuito de compreender os processos que envolvem o consumo, bem como seus múltiplos usos e significados, dentro da “sociedade de consumo” (p. 255).

Appadurai (2008), ao lançar o livro A vida social das coisas, em 1986, contribuiu com esse processo, estabelecendo o consumo como relacional e social. A partir da associação entre demanda e a relação produção e consumo, seria possível caracterizar o consumo como um “mecanismo social” (APPADURAI, 2008, p. 60) que atua como mediador na circulação de mercadorias, tanto de curto quanto de longo prazo, conforme suas rotas (APPADURAI, 2008). Nos anos 1990, a antropologia do consumo passou a dialogar com a temática da globalização. O consumo torna-se potencial criador de novas configurações culturais e emergem as redes de circulação de mercadorias como campo de estudo (DUARTE, 2010).

O interesse por discussões relativas ao consumo tem aumentado, principalmente depois de  pós-estruturalistas e pós-modernistas contestarem a perspectiva dominante das relações de produção, vinculada ao poder. Contudo, apesar de o consumo aparecer em diversos estudos, principalmente com o intuito de colaboração para o entendimento das tendências nos sistemas agroalimentares, ele ainda permanece centrado em debates relativos à produção.

[...] Essencialmente, a dinâmica do consumo está localizada na esfera da produção, e os consumidores são encarregados de praticar políticas centradas na produção. Grande parte deste trabalho esconde uma noção implícita e não reconhecida de consumidores como indivíduos manipuláveis ​​e intermitentes, cuja epifania política virá apenas se as escalas do fetichismo de mercadoria puderem ser removidas de seus olhos. O consumidor escapa à atenção teórica porque ela ou ele não parece “agir” politicamente. (GOODMAN; DUPUIS, 2002, p. 9)

 

O consumo político como uma possibilidade para a agroecologia

Na perspectiva do consumo político, o consumidor é reconhecido como sujeito ativo, em que, por meio de uma escolha, afirma um posicionamento. Para Goodman e DuPuis (2002, p. 18), “as ações do consumidor podem ser vistas como políticas quando exercem ‘a capacidade de agir’ de qualquer maneira que afete a forma futura da sociedade”. Portilho et al. (2011) afirmam que o consumo político fundamenta-se na tentativa de incorporar, concretizar e publicizar valores a favor de melhorias sociais e ambientais. Sendo que esse pode manifestar-se em ações organizadas, como grupos de consumidores, da mesma forma como em atos pontuais e não organizados de consumidores. Assim, o próprio entendimento sobre o consumo vem se alterando dentro das Ciências Sociais, de um ato individualista e egoísta para incorporação de valores solidários e de responsabilidade. Ainda, o consumo político pode ser entendido como ações políticas não institucionalizadas realizadas na esfera do consumo individual (PORTILHO, 2009).

O consumo politizado e a ambientalização do consumo (PORTILHO; CATAÑEDA, 2009) começaram a relacionar-se quando as questões ambientais começaram a influenciar os atos de consumo. Nesse cenário globalizado, o consumo, como esgotamento de recursos, começou a ganhar destaque após a Conferência de Estocolmo (1972), referindo-se principalmente a questões ambientais relacionadas à poluição e à utilização intensa de recursos naturais por parte dos países industrializados. Nesse período, as causas dos problemas ambientais vinculavam-se ao processo produtivo e ao aumento populacional. Contudo, durante os anos 1990, quando os altos índices de consumo foram relacionados aos impactos ambientais, o consumo ganhou destaque. Assim, na Rio 92, o consumo foi incorporado ao discurso ambientalista, principalmente associado ao modo de vida das sociedades em países do hemisfério Norte, tornando-se um fator determinante no processo de degradação ambiental (PORTILHO, 2005).

A sociedade consolidava-se nas possibilidades do ato de consumir, sendo que este era concebido como um fator determinante quanto à configuração social, em que a escolha por um determinado objeto também representa um limite entre grupos sociais e indivíduos (BARBOSA; CAMPBELL, 2006).

Após o movimento iniciado nos preparativos para a Rio 92, surgiram diversos discursos, abordagens e propostas relativos ao consumo, como o “consumo verde”. Essa proposta iniciou-se no movimento ambientalista, no qual consumidores passaram também a interessar-se por questões ambientais relativas ao produto e sua fabricação (PORTILHO, 2005), para além da qualidade e preço. O movimento do consumo sustentável também surge após a Rio 92, quando foi introduzido o debate referente aos impactos socioambientais vinculados ao alto consumo da sociedade. Foram incorporados aspectos relacionados ao acesso, à distribuição e à justiça no discurso ambiental. Nesse contexto, as ações de consumo vinculam-se a posicionamentos políticos (PORTILHO, 2005).

Contemporaneamente, surgem diversos movimentos sociais que estabelecem redes econômicas relevantes para o contexto local, tornando-os potenciais agentes políticos, como os movimentos de economia solidária, comércio justo, slow food e movimento de consumidores organizados (WILKINSON, 2008). Carneiro (2012) afirma que ações de consumo, diante dessa perspectiva, ultrapassam os âmbitos de escolhas individuais, sendo influenciadas por questões de justiça, solidariedade, sustentabilidade, segurança alimentar. Nesse sentido, representa um posicionamento político cotidiano, tornando a vida privada também politizada. Nas sociedades atuais, o produto final a ser consumido, sendo ele um bem material ou um serviço, também é constituído pelas relações de trabalho e pelo modo de produção (BARBOSA; CAMPBELL, 2006).

A alimentação torna-se um campo de disputas capaz de articular indivíduos “a comunidades abstratas, ao meio ambiente, a inovações tecnocientíficas e a conceitos morais” (PORTILHO et al., 2011, p.103), nos quais são evidenciados riscos e incertezas da produção de alimentos. Contudo, o consumo de alimentos não se torna político simplesmente por sê-lo globalizado ou devido a instrumentos regulatórios que passam a ser exigidos. Tal situação fortaleceu-se após o reconhecimento de que por trás de cada alimento há uma história cujas complexidades não eram previstas até então. Entretanto, nem sempre realizamos a conexão entre comida como uma manifestação política (PORTILHO et al., 2011).

O campo alimentar tem tornado-se politizado a partir dos anos de 1990, quando ocorre uma mudança histórica na compreensão do consumo alimentar. Nesse contexto, o consumidor passa a realizar suas escolhas com base no equilíbrio entre o seu valor monetário e o risco e a desconfiança, frente a um cenário de epidemias, escândalos alimentares e a introdução de organismos geneticamente modificados (CASTAÑEDA, 2012). Esse processo tornou-se favorável quando aspectos relacionados à compreensão da nutrição, ao afloramento de movimentos ambientais e ecológicos, aos movimentos sociais em defesa de populações tradicionais e de suas práticas agrícolas associadas, além das consequências trazidas pela globalização, passaram a estar presentes no cotidiano desses consumidores, transformando-os também em indivíduos políticos frente a suas ações. (PORTILHO et al., 2011).

Para Goodman e Dupuis (2002) ações políticas teriam maior vínculo às atividades cotidianas do que a atos revolucionários pontuais. Dentro das discussões alimentares, o consumidor talvez não tenha a possibilidade de alterar grandemente o sistema em que está inserido, mas pode influenciar e reestruturar o sistema alimentar. Nas discussões sobre sistemas agroalimentares contemporâneas, a possibilidade de o consumidor conhecer seu alimento torna-se tão relevante quanto o estabelecimento de redes de conhecimento entre os agricultores.

Conforme Barbosa (2007), tanto a alimentação quanto o ato de comer modificaram-se de uma ação individual vinculada à escolhas e preferências, para comportamentos que influenciam o âmbito público. Fischler (2002) argumenta que tal percepção da escolha alimentar como um ato individual desconsidera que as seleções de alimentos realizadas por humanos se originam a partir de determinismos culturais e sociais(p. 145). O autor ainda acrescenta que muitas vezes, tal escolha baseada em aspectos coletivos culturais e sociais, é realizada de forma inconsciente pelo consumidor. Assim, o campo alimentar, como importante categoria, é convidado a tornar-se um espaço político, por meio da politização do consumo.

Apesar da investigação de questões contemporâneas a partir do entendimento do consumo ser essencial, Portilho (2005) destaca a dificuldade das ciências ambientais e sociais, e das políticas públicas em abordarem a temática, permanecendo sempre vinculado ao debate de fundo produtivista. A mesma autora (2009) ressalta que investigações com foco nos movimentos de consumidores organizados são escassas no Brasil, inclusive no campo das Ciências Sociais, enfatizando a carência de abordagens sobre as formas de consumo atuais. Goodman e  DuPuis (2002) também comentam sobre a assimetria existente entre estudos que abordam a temática da produção e do consumo — “Ou seja, o consumidor emerge apenas para desaparecer novamente em um quadro centrado na produção” (GOODMAN; DUPUIS, 2002, p. 7). Barbosa e Campbell (2006) destacam as dificuldades conceituais e metodológicas a serem enfrentadas por pesquisadores do consumo.

 

Apontamentos finais

Esse artigo objetivou fomentar o debate sobre o consumo no contexto agroecológico, na tentativa de reposicioná-lo no âmbito das discussões entre produção e consumo. Ainda, procurou apresentar as complexidades entorno do consumo, bem como compreender e refletir sobre os processos históricos que contribuíram para que esse se tornasse menos priorizado. Apesar dos esforços dentro do contexto da agroecologia, na criação e desenvolvimento de novos formatos de comercialização pouco se sabe sobre as formas de consumo. Tal constatação torna-se evidente não somente em aspectos quantitativos, como a quantidade de publicações científicas. Mas também por meio da perspectiva qualitativa. Onde, em sua maioria, o consumo é discutido por escolhas metodológicas pouco explicativas. Mas como viabilizar metodologicamente e incorporar uma redefinição das relações entre produção e consumo na agroecologia?

Após as reflexões dos processos históricos e das contribuições da literatura, sugerimos alguns elementos para essa construção metodológica para o contexto agroecológico. Inicialmente, propomos um retorno ao empírico para evitarmos relações preestabelecidas de causalidade entre produção e consumo. Conforme destacado por diversos autores (PORTILHO; CASTAÑEDA, 2009; MILLER, 2002; CARNEIRO, 2012; entre outros), o ato do consumo é repleto de complexidades e surpresas. Esse, quando observado empiricamente, tende a revelar valores de responsabilidade, coletividade, solidariedade e afeto. Nesse contexto, podemos compreender realmente como tem se dado e se recriado as relações entre produção e consumo na esfera agroecológica.

Ao realizar esse movimento ao empirismo, sugerimos privilegiar as experiências que questionem espaços convencionais. Estamos habituados a compreender o sítio enquanto espaço de produção e a feira enquanto ambiente do consumo. Entretanto, experiências como a CSA, entre outras, complexificam essas relações, como exemplo, consumidores também se tornam responsáveis pela produção. Essas experiências revelam tanto a complexidade como a diversidade de relações entre produção e consumo.

Ainda, observar a relação entre produção e consumo com profundidade e a partir de um olhar sem julgamentos. Nesse sentido, a proposta etnográfica apresenta diversas técnicas que podem contribuir na viabilização metodológica para a redefinição da relação entre produção e consumo no contexto agroecológico. A proposta do consumo político pode ser uma, entre diversas possibilidades para encararmos o debate do consumo sem preconceitos. Observar o consumo a partir dessa e de outras abordagens pode contribuir para a compreensão de sua complexidade. Com isso, talvez possamos começar a entender o consumo e o consumidor do alimento agroecológico e propor formatos de produção e comercialização que sejam coerentes não somente com moldes sustentáveis, mas também humano.

 

 

 

 

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Resumo: (Traçando possibilidades metodológicas para os desafios dos estudos do consumo na agroecologia). A agroecologia propõe a incorporação de práticas sustentáveis na produção agrícola e consequentemente o desenvolvimento de novos canais de comercialização que dialoguem com esse produto agrícola. Entretanto, apesar dos esforços na criação desses espaços e na tentativa de diálogo entre o ambiente de produção e consumo, há uma predileção para debates e investimentos de recursos em produção. Pudemos observar essa distinção (quantitativa e qualitativa) revisando a literatura científica no período de 2008 a 2018. Esse artigo objetiva realizar uma reflexão histórica sobre os motivos dessa hierarquização na relação entre produção e consumo a partir da compreensão do mercado para economia neoclássica, sociologia econômica e nova sociologia econômica. O consumo é discutido a partir das contribuições da sociologia e antropologia do consumo. Destacamos ainda as complexidades e desafios dos estudos do consumo. Por fim, apresentamos aspectos metodológicos para viabilizar uma redefinição entre essa relação dentro do contexto da agroecologia.

Palavras-chave: consumo; agroecologia; Sociologia do consumo; Politização do consumo; consumo alimentar; etnografia.

 

Abstract: (Tracing methodological possibilities for the challenges of consumption studies in agroecology). Agroecology proposes to incorporate sustainable practices in agricultural production and consequently the development of new marketing channels prepared to assimilate its goods. Despite the efforts to create those marketing channels and to improve the communication between production and consumption, there is a preference for debate and resource investments in production. We observed this distinction (both quantitative and qualitative) reviewing the scientific literature from 2008 to 2018. This paper aims to develop an historical approach to understand the reasons for this hierarchy between production and consumption based on an understanding of the market concept in neoclassical economics, economic sociology and the new economic sociology. Consumption is discussed through the lenses of the sociology and anthropology of consumption. In addition, we highlight the complexity and challenges in studying consumption, and we present methodological aspects that would enable us to redefine the relationship between production and consumption within the agroecology context. 

Keywords: consumption; agroecology; Sociology of consumption; Politicization of consumption; food consumption; ethnography.

 

 

 

Recebido em janeiro de 2019.

Aceito em março de 2019.



[1] Mestrado no programa Interdisciplinar em Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). E-mail: mailto:malubenini@gmail.com.

[2] Professor Doutor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), atuante no Núcleo Geral Comum (NGC), Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Ciências Humanas e Sociais Aplicadas da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA) e Programa de Pós-Graduação em Ambiente e Sociedade do Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais (NEPAM/IFCH). E-mail: roberto.junior@fca.unicamp.br.

[3] “Fato social é toda maneira de fazer, fixada ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior; ou ainda, toda maneira de fazer que é geral na extensão de uma sociedade dada e, ao mesmo tempo, possui uma existência própria, independente de suas manifestações individuais”. (DURKHEIM, 1999, p.13)