Estudos Sociedade e Agricultura
vol. 26, n. 3, outubro de 2018 a janeiro de 2019


 

 

Alexandro Moura Araujo[1]

Eduardo Magalhães Ribeiro[2]

 

 

 

Feiras, feirantes e abastecimento:

uma revisão da bibliografia brasileira sobre comercialização nas feiras livres[3]

 

 

 

Introdução

No Brasil as feiras livres remontam ao período colonial. A importância dessas feiras se manifesta no abastecimento direto de consumidores, na geração de renda para a população rural e na animação do comércio urbano. Mas sua relevância ultrapassa a economia para compreender também hábitos alimentares, costumes sedimentados e a própria cultura.

Prova isso o destaque das feiras nas diversas manifestações culturais brasileiras.

Luiz Gonzaga exaltou a feira de Caruaru em música de 1957, pois “de tudo que ai no mundo, nela tem prá vender”. Sivuca, em 1978, resumiu o mosaico das feiras nordestinas de varejo em “Feira de mangaio”. E Elomar destacou a importância da feira para a moça do campo em “O pedido” (1982), um longo rol que, matreiramente, a moça passa ao amigo, pois “já que tu vais lá na feira, traga de lá para mim”, e encomenda “água da fulô que cheira, um nuvelo e um carmim (...)” e, dengosa, pede que “ah, se o dinheiro desse, eu queria um trancelim...”

Feiras foram eternizadas no cinema. Numa delas, o vaqueiro Manuel selou seu destino ao matar o patrão e, por escolha, acompanhou o beato Sebastião; depois, por falta de escolha, se transformou no cangaceiro Satanás ao se unir ao bando de Corisco, na fórmula usada por Glauber Rocha em Deus e o diabo na terra do sol (1964) para resumir os destinos dos camponeses do Semiárido. Em A grande feira (1961), Roberto Pires registrou os feirantes em confronto com a empresa que ambicionava o espaço da feira baiana de Águas de Meninos.

As feiras também foram cenários de romances, contos e crônicas. Alexandre e outros heróis, de Graciliano Ramos, Terra de Caruaru, de José Conde, Doidinho, de José Lins do Rêgo, Gabriela cravo e canela e A morte e a morte de Quincas Berro D’Água, de Jorge Amado, ambientaram seus personagens em feiras livres. Em Feiras e mafuás, Lima Barreto descreveu com luxo de detalhes as feiras do Rio de Janeiro.

Como as artes, embora com menor visibilidade, também a produção técnica e científica brasileira se debruçou sobre feiras livres. Já foram estudados, em todo o país, feiras, feirantes e consumidores, sua importância e seu papel no abastecimento, na segurança e soberania alimentar. Este artigo tem como objetivo analisar esses estudos: partindo da produção científica, detalha características gerais, regionais e especificas das feiras, destacando as similaridades e as diversidades deste fenômeno social, econômico e cultural.

 

Metodologia

O artigo se baseia num levantamento bibliográfico sistemático de estudos sobre as feiras livres brasileiras, catalogados em arquivos, bibliotecas e páginas da rede de computadores abertas ao público. O levantamento, realizado entre agosto e dezembro de 2017, explorou o acervo das plataformas Capes, Scielo, Google Acadêmico e Google Web, compreendendo as diversas formas de edição, independentemente do ano da publicação. A busca foi orientada por descritores associados às feiras: feira, feira livre, feirante, abastecimento urbano, comercialização agrícola, agricultura familiar, segurança alimentar, produção agrícola familiar, venda direta, circuito curto, agroindústria familiar, soberania alimentar; esses termos foram pesquisados também em combinação. À medida que surgiam, as referências eram classificadas segundo as palavras-chaves; como parâmetro, a pesquisa selecionou trabalhos compreendidos até a décima página da busca. A partir desses critérios foram selecionados trabalhos qualitativos e quantitativos que analisaram feiras livres no Brasil, e excluídos trabalhos que trataram indiretamente do tema — por exemplo: estudos teóricos sobre comercialização que abordavam feiras livres apenas como canal de vendas.

Usando este padrão, foram coletados 434 trabalhos, que foram classificados a partir das principais características, sendo que a primeira — valorizando as diferenças regionais entre feiras — foi a distribuição regional. Em seguida, os trabalhos foram classificados por veículo de origem, usando critérios da Plataforma Lattes/CNPq: periódicos científicos indexados, resumos e artigos completos publicados em anais de eventos, livros e capítulos, monografias, trabalhos de conclusão de cursos de especialização, dissertações, teses e relatórios técnicos. Depois, foram organizados por ano de publicação para identificar tendências temporais de pesquisas. Feito isso, foram analisados títulos, objetivos, resumos e metodologia dos trabalhos, que, por fim, foram organizados segundo a classificação de áreas da Capes: primeiro nível (Ciências da Vida, Humanidades, Ciências Exatas, Tecnológicas e Multidisciplinar), e segundo nível, ou “grandes áreas” de Ciências Sociais Aplicadas, Ciências Humanas, Ciências Agrárias, Ciências Biológicas, Multidisciplinar, Linguística, Letras e Artes, Ciências da Saúde, Engenharias e Ciências Exatas e da Terra.

Em seguida, diante do grande número de trabalhos, foram combinados três critérios para selecionar quais seriam lidos: (i) distribuição regional, cobrindo as grandes regiões do país; (ii) amplitude de abordagem, selecionando estudos que compreendiam a totalidade da feira (dinâmica de mercados, preços, produtos); (iii) relevância, indicada pelo número de citações no Google Acadêmico e Periódicos Capes. Para evitar desvios e acentuar a diversidade, foram analisados os resumos dos trabalhos. Ao final, foram analisados 50 estudos, representando 11,50% da produção identificada. Nestes, foram avaliados pontos essenciais das abordagens, agrupando-os quando os temas abordados apresentavam similaridades. Os resultados do estudo estão apresentados a seguir.

 

Situando o corpus do estudo

A grande quantidade de estudos sobre feiras livres deriva da sua importância. Carmo (1994) notou que, nos anos 1990, 51% das famílias urbanas do Brasil compravam em feiras; Ribeiro (2007) mostrou que, em 2005, 70,60% das famílias urbanas de municípios do vale do Jequitinhonha compravam em feiras. Freitas (2015) revelou que em 2009 feiras respondiam por 10,39% do abastecimento metropolitano de frutas e 23,72% do abastecimento de pequenas cidades. Além disso, feiras são essenciais para os produtores: geram rendas em vendas à vista, reduzem custo de comercialização, estimulam interação entre produtores e vendedores, e permitem ao agricultor acessar serviços urbanos (ANGULO, 2002; ANJOS, GODOY; CALDAS, 2005; RIBEIRO, 2007; COÊLHO, 2008).

Mas feiras também são importantes para a segurança do abastecimento alimentar. Consumidores acreditam que alimentos comprados do produtor são mais sadios e que, ao mesmo tempo, podem interferir na qualidade (MALUF, 1999; GODOY, 2005; DIAS JUNIOR, 2015). E, aproximando vendedores e compradores, feiras valorizam a soberania alimentar e cultural; superam o caráter restrito de ponto de venda; cimentam relações de proximidade; vão além do negócio ao unir no mesmo espaço comércio e sociabilidade (JESUS, 1992; RIBEIRO, 2007; SERVILHA, 2008; CASSOL, 2013). Também criam e reproduzem hábitos culturais de consumo, tantos e tão diferenciados quanto são as regiões brasileiras, porque seus espaços são apropriados por relações enraizadas no lugar (PLOEG, 2016). Dessa forma, feiras podem ser compreendidas como espaços de economia de proximidade, de hábitos culturalizados, de canais marcados pela informalidade dos negócios e pelas relações costumeiras, criando “um verdadeiro encontro entre a cidade e o campo” (ANDRADE, 1987: 103; ver também FORMAN, 2009).

 

Resultados

Essa importância das feiras livres se manifesta nos 434 estudos brasileiros catalogados sobre o tema. Para divulgá-los, foram usados canais variados: periódicos científicos abrigaram 155 trabalhos; artigos apresentados em eventos científicos totalizaram 97 trabalhos, e resumos, 67; dissertações de mestrado representaram 59 trabalhos; ainda foram produzidos 14 livros, 24 monografias, 9 teses e 8 relatórios. Percebe-se que foram feitos mais estudos sobre feiras do Nordeste (44,47%), seguidos por Sudeste (18,89%), Norte (13,37%), Sul (12,90%) e, por fim, Centro-Oeste, com 10,37% do quantitativo analisado (Tabela 1).

 

Tabela 1 – Meios de divulgação de trabalhos sobre feiras livres distribuídos por regiões de origem, em números absolutos e percentuais

Fonte

SE

S

CO

NE

N

Total

Percentual

Artigos em periódico científicos

33

14

21

66

21

155

35,71

Resumos publicados em anais de eventos

8

10

0

34

15

67

15,44

Artigos publicados em anais de eventos

15

18

11

45

8

97

22,35

Livros

4

1

2

6

1

14

3,23

Monografias de cursos de graduação

7

4

1

10

2

24

5,53

Monografias de cursos de especialização

0

0

1

0

0

1

0,23

Dissertações

9

6

9

27

8

59

13,59

Teses

1

3

0

4

1

9

2,07

Relatórios/documentos técnicos

5

0

0

1

2

8

1,84

Total

82

56

45

193

58

434

100,00

Fonte: Pesquisa documental, 2017.

 

Nota-se que o número de estudos sobre feiras cresceu a partir dos anos 2000 (Tabela 2). Isso pode se dever às fontes pesquisadas, pois trabalhos anteriores aos anos 2000 certamente não foram digitalizados, sendo por isso menos citados. Mas talvez tenha mais importância o crescimento da pesquisa sobre agricultura familiar e segurança alimentara a partir de estímulos de programas criados pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) desde 1998 e pela legislação para agricultura familiar posterior a 2006.

 

Tabela 2 – Década das publicações sobre feiras livres, em números absolutos e percentuais

Década

Produção

Percentual (%)

Anteriores a 1990

4

1

1990-2000

7

2

2000-2010

122

28

Posteriores a 2010

301

69

Total

434

100

Fonte: Pesquisa documental, 2017.

 

Percebe-se que os trabalhos abordaram principalmente espaços, relações e características das feiras (42% deles), e alimentos e grupos de produtos (40%). Mas também analisaram feirantes (33% dos trabalhos) e consumidores das feiras (23%). Usaram principalmente metodologias qualitativas (78% dos estudos); apenas 13% fizeram estudos quantitativos e 9% combinaram métodos quali e quantitativos.

Nas “grandes áreas” da Capes, os estudos se concentraram nas Ciências Sociais Aplicadas (41%), analisando estratégias de comercialização, trabalho e geração de receitas. Em seguida, vêm trabalhos de Ciências Humanas (28%), estudando relações entre feirantes e fregueses, questões culturais e de memória. Existem trabalhos também nas Ciências da Saúde (17%), compreendendo ergonomia, saúde e segurança do trabalho nas feiras; em menor quantidade, apareceram outras grandes áreas, conforme o Gráfico 1. Nas grandes áreas de Engenharia e Ciências Exatas e da Terra não foram encontrados trabalhos sobre feiras.

 

Gráfico 1 – Percentual de trabalhos sobre feiras livres nas grandes áreas Capes (segundo nível)

Fonte: Dados de pesquisa documental, 2017.

 

Tipificação das feiras

Os estudos indicam grande diversidade nas feiras brasileiras. Nelas, as especificidades regionais se manifestam e influem na comercialização, em estratégias de vendas e relações socioeconômicas. Considerando variações regionais, feiras livres podem ser agrupadas pelas características descritas a seguir.

 

Quanto ao feirante

A frequência à feira é um traço diferenciador de feirantes: alguns vendem no mesmo lugar um dia por semana (ANGULO, 2002; GODOY, 2005; ANJOS; GODOY; CALDAS, 2005); outros se deslocam, cada dia num lugar ou cidade, geralmente vendendo produção alheia, como é frequente no Nordeste (GARCIA, 1983; GARCIA JR., 1983; FORMAN, 2009; COELHO, 2008). E existe o feirante fixo, todo o tempo no mesmo mercado e ponto de venda, que definitivamente não é produtor; vende produção alheia, denominado às vezes de atravessador (GODOY, 2005) ou mercadante (SERVILHA, 2008; RIBEIRO, 2007).

 

Quanto ao tipo de feira

Feiras podem ser pontos de vendas de agricultores familiares (“feirinhas” ou “feiras livres”) ou contar apenas com atacadistas que abastecem áreas urbanas (“feirões”, conforme GARCIA, 1992). No Nordeste, as feiras podem ser classificadas ainda em “feiras de usina”, quando ofertam produtos agrícolas e industrializados e atendem a várias localidades próximas (FORMAN, 2009). Quando há apenas produtor direto, pode ser denominada “feira urbana de abastecimento” ou “feira do produtor”; pode ser “feira de mercado”, quando há presença de intermediários (PAZERA JR., 2003; GUERRA; SOUZA, 2010).

 

Quanto à técnica usada no produto

Feiras podem ser “convencionais”, se vendem alimentos produzidos com técnicas corriqueiras; “agroecológicas” ou “orgânicas”, se vendem alimentos produzidos segundo normas ambientais, com certificação e gestão integrada da produção e venda, geralmente relacionada ao associativismo (GODOY, 2005; ANJOS; GODOY; CALDAS, 2005). A Caisan (Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional /Ministério do Desenvolvimento Social), em 3.726 feiras brasileiras, encontrou 5,64% delas agroecológicas e 36,37% convencionais, com presença de produtos agroecológicos.

 

Quanto aos setores

De acordo com a região, feiras costumam se dividir em áreas, espaços delimitados para vendas dos mesmos produtos. Certamente a divisão mais conhecida é nas feiras nordestinas, divididas em feira de raízes e ervas, de flores, bolos, doces, ferragens, fumo, corda etc.; entre essas, destaca-se a feira do “mangaio”, setor de retalho e miudezas, que vende palhadas, argilas, sucatas, bens a preços baixos (GARCIA, 1983; IPHAN, 2006; PALMEIRA, 2014; FERNANDES JUNIOR, 2015). Feiras paraenses também se dividem em “espaços específicos: mercado de carne, mercado de peixe, feira do açaí e feira da farinha” (DIAS JUNIOR, 2015, p. 4).

 

Quanto às trocas

Feiras livres são espaços de venda à vista e preço fixado na concorrência (o “preço que corre”), conforme Angulo (2002). Mas existem variações: o escambo das “feiras do troca-troca”, na feira de Caruaru (IPHAN, 2006), e as trocas de perecíveis nos finais das feiras do Jequitinhonha (RIBEIRO, 2007). Uma variação das trocas é o fim da feira em todo o Brasil, quando cai a qualidade dos perecíveis e ocorrem reduções de preço; em alguns locais este momento é denominado “xepa” (PANDOLFO, 1987; COELHO; PINHEIRO, 2009).

 

Tipos de feirantes

Embora tenham traços semelhantes, feirantes têm singularidades de ocupação, renda ou produto. Por isso a literatura lhes atribui diferentes denominações. Feirantes “convencionais” (ANJOS; GODOY; CALDAS, 2005) ou “tradicionais” (JESUS, 1992) geralmente comercializam os mesmos produtos, concorrem entre si, e costumam ser divididos em dois tipos. São feirantes “produtores” aqueles que produzem a mercadoria que vendem, ou a maior parte dela (GODOY, 2005; ANJOS; GODOY; CALDAS, 2005; RIBEIRO, 2007; VALENÇA, 2016); são feirantes “comerciantes”, “intermediários”, “mercadores” (VALENÇA, 2016), ou ainda “mercadantes”, quando compram e revendem produtos.

Intermediários ligam “oferta e a demanda, coletando o produto diretamente junto aos produtores, realizando a estocagem, beneficiamento e distribuição ao comércio varejista” (GODOY, 2005, p. 74). Palmeira (2014) percebeu que os intermediários das feiras nordestinas (“retalheiros” ou “retalhistas”) eram vendedores “pequenos”, com pouco capital, que compravam de sitiantes e vendiam por consignação, sendo também chamados “fregueses de oito dias” ou “ribristas”. Mas depende da região: Ribeiro (2007, p. 81) observou que o intermediário é minoria nas feiras do Jequitinhonha e “costuma estar associado, além dos manufaturados, principalmente a fumo, carnes e parte da indústria doméstica rural”. Pandolfo (1987) definiu como “feirante de fim de semana” o vendedor que exerce outra atividade e apenas uma vez por semana se ocupa da feira. Já Zanini e Santos (2017) destacam que feiras tendem a ser mais diversificadas quando contam apenas com agricultores/produtores.

Quanto à renda, feirantes do Vale do Jequitinhonha mineiro se classificam em “fortes” ou “fracos”; os fracos comercializam pequenos volumes, com baixo valor agregado, enfrentam dificuldades de transporte e de acesso à água; feirantes fortes têm mais recursos e força produtiva, e mantêm oferta regular nas feiras (ANGULO, 2002; RIBEIRO, 2007).

Mas feirantes podem também ser denominados pelos produtos que vendem. Quando dispõem de espaço próprio para vender alimentos prontos podem ser conhecidos como “barraqueiros” (PANDOLFO, 1987). Quando comercializam produtos da agroindústria doméstica como rapadura e farinha, com “a convicção que seus produtos eram os melhores do mundo”, podem ser “feireiros” (ANTUNES JUNIOR, 1976, p. 182). “Raizeiros” vendem artigos medicinais, e nas suas bancas se podia “comprar também meizinhas para todos os males, tais como ataque, encalho, espinhela-caída, mordedura de cobra” (ANTUNES JUNIOR, 1976, p. 183; ver também SERVILHA, 2007). “Peixeiros” e açougueiros comercializam carnes e peixes nos mercados municipais (PANDOLFO, 1987).

Mas nas feiras existe ainda uma série de ocupações complementares, como os artistas, que apresentam manifestações culturais com cordel, teatro e música (PANDOLFO, 1987; GARCIA, 1992). Feiras também atraem camelôs, vendedores ambulantes de produtos não agrícolas que não dispõem de estrutura fixa para vendas (PANDOLFO, 1987; SOUZA, 2010). Ser ambulante é, muitas vezes, “um refúgio para todas as pessoas que, estando sem emprego, buscam nesta atividade uma forma de garantir sua sobrevivência” (PAZERA JR., 2003, p. 152). Com frequência se encontram nas feiras cambistas de rifas e jogos, com espaço fixo ou circulante (PANDOLFO, 1987). E feiras exigem trabalho de carregadores, geralmente crianças que auxiliam clientes no carreto de compras (PANDOLFO, 1987). Segundo Lima (2008), na feira do peixe paraense os carregadores transportam produtos para redes atacadistas e selecionam os melhores pescados. Existem ainda freteiros, que carregam produtos para as feiras (LIMA, 2008), e “arrumadores” ou “chapas” que, segundo Souza (2010), descarregam caminhões, e “frentistas” que fazem transporte para as bancas de feirantes. E feiras costumam ocupar “seguranças de posturas” para a guarda durante e após sua realização, e “rapas” e “fiscais da feira” para apreender produtos fora da legalidade (PANDOLFO, 1987).

 

Gênero

Na literatura sobre feiras as relações de gênero entre feirantes é assunto controverso. Existem diferenças entre regiões, produtos e, possivelmente, épocas. Certamente foi Garcia (1983; 1992) quem mais refletiu sobre o assunto. A autora observou que as feiras nordestinas são espaços masculinos, embora notasse na década de 1980, na Paraíba, o crescimento relativo do número de feirantes mulheres, que ocupavam 26% dos pontos de vendas. Segundo ela, feiras refletem a divisão sexual do trabalho que há nas unidades camponesas: o provedor da família decidia sobre produção e investimentos, mas existia “colaboração estreita entre homem e mulher, mesmo quando o trabalho feminino, seja qual for o nível de sua participação, é considerado ajuda” (GARCIA, 1992, p. 3). Além disso, filhos homens eram estimulados a participar das feiras; salvo quando não havia um filho para atuar com o pai, moças eram admitidas apenas em espaços específicos (GARCIA, 1992).

Herédia (2013), também analisando feiras do Nordeste, registrou que mulheres vendiam produtos “secundários” e seu trabalho era considerado “ajuda”. Segundo esta autora, mulheres não podiam vender produtos da agricultura e da agroindústria, considerados mais importantes para a renda da família. Este seria um dos mecanismos para instituir o controle masculino sobre a produção e a qualidade do produto. A mulher não participava da negociação na feira, pois “opina apenas quando consultada, o que nem sempre acontece; e no caso de ser solicitada sua opinião, sempre se faz de forma privada, sem a presença de terceiros” (HEREDIA, 2013, p. 56). Se considerava que a família seria desvirtuada se a mulher se tornasse “chefe da família”, confirmando a associação entre negócios e costumes. Para Garcia (1992, p. 3), “a feira é um lugar em que são medidos não só o valor dos produtos, mas também o valor dos homens”.

Diversos autores confirmam essa perspectiva; afirma Pandolfo (1987, p. 108) que mulheres “manipulam mercadorias consideradas menos relevantes, que exigem menor investimento”. Palmeira (2014, p. 332) foi na mesma direção: na venda e no abastecimento familiar persistem diferenças entre os sexos, e “tanto feirar (vender na feira) como fazer feira (comprar na feira) são definidos socialmente como atividades masculinas”. Um feirante enfatizou ser necessária responsabilidade para vender farinha nas feiras; por isso era atividade masculina: “mulher só vende uma coisinha maneira. Mulher não dá para vender farinha, que farinha exige muito cálculo. Não é fácil vender farinha” (PALMEIRA, 2014, p. 333).

Trabalho feminino nas feiras nordestinas, ponderando épocas e regiões dos estudos, era considerado “ajuda”. Mas a restrição à atuação da mulher feirante podia estar ligada também ao assédio, conforme Santos (2007). No Sul do país, Godoy (2005) também observou que mulheres (e esposas) só assumem ponto de venda quando o esposo abandona o ofício.

Mas existem sutilezas culturais e regionais.

A presença masculina é majoritária nos pontos de venda das feiras livres paraenses de Cametá, mas as mulheres predominam na venda de alimentos prontos (DIAS JUNIOR, 2015). Na região amazônica, Vargas (2015) observou grande participação feminina nas feiras livres, e trabalho majoritariamente familiar na produção. Agricultoras atuavam nas feiras livres e, também, em outras atividades: lecionando, costurando, mostra combinações “dentro da relação de gênero, bem como múltiplas atividades, com trabalhos que lhes proporcionem renda fixa, sendo o trabalho da agricultura e feira uma renda extra” (VARGAS, 2015, p. 86).

No Jequitinhonha mineiro, Ribeiro (2007) observou presença marcante de mulheres feirantes na venda de alimentos prontos; mas na produção e nos pontos de venda da feira o trabalho era sempre familiar. Na mesma região, Angulo (2002) percebeu a importância produtiva das mulheres nas feiras. E Silvestre et al. (2011) destacaram que as feiras de São Francisco, ao norte de Minas Gerais, são conduzidas predominantemente por mulheres, ressaltando sua importância na comercialização e nos ganhos para a família.

 

Rendas, preços e economia local

Feiras livres têm grande importância na renda de produtores e vendedores. Herédia (2013), Forman (2009) e Palmeira (2014) observaram a importância do comércio para as unidades familiares camponesas. Cassol (2013) indicou que feira era a principal fonte de receitas para 48% das famílias feirantes que pesquisou; embora tivesse importância para os ganhos dos demais pesquisados, o autor concluiu que feira “é essencial para a manutenção das famílias do meio rural e na atividade agrícola, posto que seja importante fonte de renda” (CASSOL, 2013, p. 124). Para Godoy (2005), feiras permitem que o feirante do Sul do Brasil obtenha rendas monetárias, mesmo quando tem pouco estoque de produtos, custos elevados com transporte, e não disponha de estruturas de marketing, como têm as redes varejistas.

Mas, embora sejam importantes, nem sempre essas rendas são expressivas. Forman (2009) observou o nível reduzido de estoques, destacando que acreditava serem muito baixas as margens de rentabilidade, apesar de difíceis de serem calculadas. Ribeiro (2007, p. 67) notou “que fica tecnicamente impossível estabelecer com segurança a renda gerada e consumida por agricultores familiares feirantes, salvo nos raros casos em que ela se origina de uma única fonte monetária”. Segundo Coelho (2008), nas feiras de Cascavel e Ocara (CE) apenas feirantes que comercializam carnes de primeira qualidade conseguem rendas elevadas; feirantes que vendem miúdos têm, geralmente, rendas menores. Por outro lado, feirantes que comercializam especiarias com menor valor agregado, como produtos de extração vegetal, são os que conseguem menores rendas das feiras; daí a importância da observação feita por Ribeiro (2007) e Coelho (2008), que notaram a importância dos programas públicos de transferência de renda para os feirantes, que combinam recursos a fim de melhorar os ganhos.

A formação de preços na feira combina muitas variáveis, pois se trata de mercado concorrencial com diferenciação reduzida dos produtos. Segundo Ribeiro (2007), os preços nas feiras do Jequitinhonha resultam da média dos preços do comércio local e daqueles praticados por outros feirantes; é definido em cada feira como “o preço que corre”; ou seja, o preço praticado por todos os vendedores da feira, derivado do levantamento que fazem de preços médios praticados no dia; assim decidem também a quantidade a ser vendida (ANGULO, 2002). Garcia Jr. (1983) destacou que, diante da flutuação de preços, feirantes costumam consumir os produtos que não alcançam os preços esperados.

De acordo com muitos dos autores pesquisados, o valor agregado influi muito no preço porque diferencia um produto dos demais. Mas há muita sutileza, e diferenciais de valor agregado podem se originar de matéria-prima, qualificação e fama do produtor, localidade de origem ou técnica de preparo. Antunes Junior (1976, p. 182) anotou que, na feira, um feirante afirmava que “o preço é este mesmo; ninguém vende um artigo melhor [que outro]”; mas, na negociação, enfatizava a qualidade do seu produto, que o valorizava perante os concorrentes.

A sazonalidade também influi na variação de preços (MALUF, 1999), assim como a escassez ou abundância relativa do produto (ANGULO, 2002). Variações também sempre ocorrem ao fim da feira, na “hora da xepa ou hora da viração quando o produto que, no início da feira, custa um preço muito alto para as camadas de baixa renda torna-se, no fim da mesma feira, bastante acessível” (PANDOLFO, 1987, p. 28). De acordo com um estudo,

os preços podem cair até 50%, pois o feirante não quer voltar para casa com a produção. Os preços tanto sofrem variações no correr do dia quanto no correr do mês e do ano. Variações ao longo do ano são acentuadas; os feirantes conhecem bem essa situação e procuram vender mais rápido e o melhor preço. (RIBEIRO, 2007, p. 126)

Nas feiras de Campina Grande (PB), os preços variavam também por influência do mercado varejista. As alterações eram derivadas das práticas dos supermercados, que influíam nos horários das feiras, no comportamento e na negociação com os clientes. Dessa forma, “na construção dos preços, feirantes, fornecedores e clientes participam ativamente tanto no processo de formação dos preços quanto no processo de regulação” (MORAIS, 2016, p. 128).

Também existem pressões de intermediários sobre os produtores. Segundo Moreira (1992), ao colocar preços mais reduzidos, intermediários forçam feirantes produtores a seguir a queda com receio de prejuízos. Palmeira (2014) também notou que preços considerados essenciais na feira, como farinha e cereais, são determinados por atacadistas e comerciantes.

Resumindo, preços nas feiras livres dependem de oferta, sazonalidade, intermediários, comércio urbano e qualidade; e esta última pode ser determinada objetiva ou subjetivamente.

Os preços se transformam em ganhos para feirantes, e feirantes produtores combinam ganhos de venda e produção. Mas, em certos casos, a influência desses ganhos vai além do sustento, e atinge as economias locais, fortalecendo circuitos de trocas econômicas. Porto (2005) escreveu que feiras livres se inserem em “circuitos inferiores” da economia, fornecendo produtos e serviços artesanais ao consumidor; segundo a Cepal (2014), feiras livres são “circuitos curtos” que abreviam mais as relações com o consumidor. Maluf (2004) observou que, na comercialização, a agricultura familiar se insere em circuitos produtivos regionais que integram produtores, cooperativas e associações familiares. A venda de produção familiar em feiras, “circuitos curtos” ou “mercados de proximidade” favorece a oferta, reduz custos e aumenta receitas, permitindo “realizar localmente o trabalho de venda, concorrendo assim para a manutenção dos empregos no território” (FRANÇOIS, 2000, p. 13).

As rendas dos feirantes entram nos circuitos locais do dinheiro, suas receitas passam às mãos de comerciantes que recebem pelas compras de bens ou serviços (RIBEIRO, 2007).  Assim, rendas de feirantes movimentam “bares, boates, restaurantes, casas lotéricas, lanchonetes, oficinas, salões de beleza e outros estabelecimentos [que] ganham intensidade nos dias de feira” (GUERRA; SOUZA, 2010, p. 130). A feira se torna “indicador da dinâmica econômica dos municípios” (COELHO, 2008, p. 21) pela circulação local das receitas.

 

Técnicas de vendas nas feiras

Feirantes diferenciam seus produtos para negociar melhor, pois feira é palco do saber-fazer da negociação, exige técnicas próprias de marketing, de “quantificações, medições, classificações, comparações, elegendo e utilizando os conhecimentos e instrumentos de que eles [os feirantes] dispõem em seu contexto imediato” (ALMEIDA, 2017, p. 15).

O feirante de Fortaleza, por exemplo, aprende essas técnicas ao reproduzir o comportamento de familiares e de outros feirantes que transmitem um “conjunto de habilidades que o torna capaz de dominar toda a linguagem e gestos do ato de comercializar, assim como a manipulação correta dos objetos e das mercadorias, ou seja, de como apresentá-las de forma a atrair o freguês” (MENEZES, 2005, p. 61). Silva (2008) considera que a estratégia do feirante começa na montagem da banca e alcança a comercialização, a divulgação audiovisual do produto e as formas de pagamento. Feirantes se comunicam com os fregueses, mas também entre si, estabelecendo ajuda mútua, resolvendo necessidades de produtos, trocos e informações. Analisando os sons das feiras, Zanini e Santos (2017, p. 45) mostraram que palavras e atitudes “procuram engajar os fregueses nas compras e mesmo nas conversas. Anunciar um produto não é apenas gritar seu nome e preço, mas inseri-lo nas possibilidades de troca que têm lugar no mercado, apresentando-o como algo especial”.

Essas técnicas de vendas são, também, sutis. Em Lençóis do Rio Verde, os erveiros das feiras, sabendo que seus produtos se diferenciavam principalmente a partir da percepção de seus efeitos medicinais, se esmeravam para convencer fregueses sobre suas qualidades; esclareciam que “casca de canela de ema e a catuaba precisavam ser tiradas na lua forte, num movimento de baixo para cima e levadas na mesma posição da caixa, [...] os fregueses acreditavam piamente neles, e isto era fundamental” para as vendas (ANTUNES JUNIOR, 1976, p. 182).  Há uma relação próxima entre feirantes e fregueses que conecta campo e cidade por meio dos alimentos ou pela valorização de técnicas produtivas (GODOY, 2005). Este autor salienta que, embora os fregueses planejem suas compras, são levados a adquirir mais produtos pelo destaque que nas feiras recebem os bons preços, as ofertas e promoções.

Um procedimento adotado pelos feirantes para aumentar vendas é ocultar os preços nas bancas para forçar a interação com os fregueses, pois o preço só aparece à medida que os clientes perguntam (MORAIS, 2016). Este autor ainda destaca que os fregueses têm hábito de pechinchar, tornando mais próxima a relação feirante-freguês. Segundo Guerra e Souza (2010), feirantes ganham clientes ocupando pontos de passagem, tornando a aproximação física inevitável. Kinjo e Ikeda (2005) ressaltam usos de cores dos produtos para destacar sua oferta e a degustação de produtos nas bancas como estímulo para as compras.

Feirantes criam estratégias de vendas para reduzir impactos negativos sobre produtos perecíveis. Palmeira (2014), além de outros autores, mostrou que feirantes pernambucanos admitiam reduzir preços com o propósito de evitar que um produto sobre na feira. Também se esforçam para vender muito nas primeiras horas da manhã, evitando a queda de preços que ocorrerá com a chegada tardia de caminhões de intermediários (PALMEIRA, 2014). A escolha do dia da feira pode ser importante para as vendas: nas áreas canavieiras, as feiras aconteciam aos domingos para atender cortadores de cana que trabalham durante a semana; igrejas interferiam para impedir feiras aos domingos, evitando coincidir com celebrações (GARCIA, 1992). E na feira cearense de Aprazível, feirantes divulgavam seus produtos numa revista local, a preços razoáveis; na mesma cidade também usavam uma motocicleta com alto-falante para divulgar produtos (PARENTE, 2015).

As feiras exigem ainda cálculo próprio, denominado às vezes “saber etnomatemático”, pois necessitam “em suas atividades, conhecimentos matemáticos que vão além do seu nível de escolaridade” (ALMEIDA, 2017, p. 14). Essa autora chama a atenção para a “lógica do troco” dos feirantes, que arredondam ou dão descontos nos preços quando não dispõem de troco. Gayer et al. (2009) citam o raciocínio “sessenta igual a um” usado para contar pés de alfaces que formam “lotes”, e informam que feirantes resolvem “as partes ruins da conta” retirando do cálculo valores decimais para torná-los próximos de números inteiros; depois os decimais são reinseridos na conta.

Feirantes do Jequitinhonha, em Minas Gerais, davam prazos a fregueses para pagamentos das compras: ao final das feiras ou até uma semana (ANGULO, 2002). Nessas mesmas feiras, Ribeiro (2007) revelou que as compras eram à vista, mas, dependendo do freguês, feirantes abriam crédito. Para Coelho (2008), feirantes-revendedores fazem seus pagamentos após as vendas (no “apurado”), por isso vendem sempre à vista.

Mas em feiras, além de vendas, acontecem trocas. Das feiras do “troca-troca” de produtos de segunda-mão em Caruaru participam produtores e intermediários, trocando de bolsas a eletrônicos, embora pouco se saiba sobre a origem de muitos desses produtos (IPHAN, 2006). No Jequitinhonha, Angulo (2002) destacou que parte da sobra da feira é trocada na própria feira ou nas comunidades rurais. Na mesma região, os feirantes fazem trocas para se abastecer de produtos que não têm em seus roçados, envolvendo produtos diversos: “troca-se, por exemplo, uma medida de farinha de mandioca por rapadura, duas medidas de farinha de mandioca por um quilo de carne” (RIBEIRO, 2007, p. 128).

Trocas em feiras estreitam as relações entre feirantes e fregueses. Nessas, “há a hospitalidade (...) em forma de dádiva, o freguês ganha sua segurança e comodidade, o vendedor ganha a sua venda e os dois ganham a amizade” (DIAS JUNIOR, 2015, p. 10). No Jequitinhonha, Servilha (2008) percebeu que nas feiras acontecem trocas materiais que envolvem mercadorias, serviços ou presentes, e simbólicas, que envolvem bens intangíveis: relações sociais, como prosas, informações e histórias de vida. E notou as trocas materiais com funções simbólicas, quando o feirante faz uma ação para paliar dificuldades pessoais, ou faz agrados; e trocas estritamente simbólicas, que envolvem apenas a sociabilidade nas feiras, informações e casos pessoais; por fim, fazem trocas simbólicas por razões materiais. Assim, relações sociais e comerciais se misturam nas feiras (SERVILHA, 2008).

 

Identidade dos produtos

Quando as sociedades se globalizam, manifestam tendência contraditória para valorizar a produção local, inclusive alimentos costumeiros, que se tornam marcas identitárias, geográficas e territoriais. Os circuitos planetários de trocas expandidos com a liberalização do comércio dos anos 1990 transformaram mercados locais e particularmente feiras livres em espaços importantes para vendas voltadas para abastecimento adaptado às demandas culturais, associados à soberania alimentar. Muitos dos produtos comercializados em feiras recebem agregação de valor cultural e são referência de qualidade local (ZUIN; ZUIN, 2008; WILKINSON, 2008; PECQUEUR, 2009).

Essas pautas alimentares locais têm particularidades. De acordo com Zuin e Zuin (2008), os alimentos que as pessoas consomem na infância fazem parte da memória alimentar. Produtos do território recebem valores das relações de confiança, dos quais “reputação, honestidade e amizade são os mais relevantes. A qualidade, neste sentido, é atestada pela interação pessoal estabelecida entre o consumidor e o produtor” (CASSOL, 2013, p. 58).

A formalização dessa apreciação alimentar pode organizar processos socioeconômicos de certificação, como Indicação Geográfica (IG) e Denominação de Origem (DO). O segundo é menos complexo e formalizado que o primeiro, mas ambos exigem adaptação de produtores a normas de agências reguladoras para se efetivarem, conforme Zuin e Zuin (2008). As certificações, porém, representam custos para a produção rural familiar, por isso é mais frequente manter essas denominações na informalidade do consumo costumeiro de produtos locais, sem monitoramento de agências públicas nem registro de marcas, mas se sustentando em relações de confiança entre consumidores e produtores. É o caso, por exemplo, dos “produtos coloniais” vendidos no Sul do Brasil (ZUIN; ZUIN, 2008). Produtos “coloniais”, “da roça” ou “da fazenda” se caracterizam por qualidades associadas ao sabor e procedência, que asseguram valor agregado aos produtos, como salienta Maluf (1999). Certificação desse estilo é o “Selo Sabor Gaúcho”, que revela a origem dos produtos, se baseia na agroindústria familiar e segue normas legais, sociais e sanitárias (SDR, 2017).

Nas feiras, esses valores são construídos nas trocas cotidianas entre feirantes e fregueses, que pontuam a força cultural do produto relacionada a gosto, origem, matéria-prima e produtor. A compra e o consumo são ligados às suas origens e, para clientes de feirantes, “as relações pessoais já são suficientes para atestar a qualidade dos produtos” (CASSOL, 2013, p. 40). Padrões de qualidade local variam, dependendo da combinação das preferências de clientes e feirantes, que negociam produtos com a mediação da fama e do gosto:

a goma é aprovada quando apresenta gosto azedo e textura fina, tem que dissolver na boca. A farinha tem que ficar úmida no momento em que entra em contato com a língua; se a secura persistir, a farinha não presta. A qualidade da rapadura se conhece pelo doce, que deve no começo lembrar a cana e no final, o mel, mas não pode nunca trazer ao final travo de sal, (RIBEIRO et al., 2011, p. 14)

Esses autores ressaltam que, dadas as características do gosto, os feirantes se tornam vendedores exclusivos de um mercado específico. Como os produtos atendem particularidades alimentares locais, a feira se torna um nicho defendido de invasores, liberto das escalas de produção, dominado por especialistas em produtos de gosto e qualidade socialmente reconhecidos (RIBEIRO et  al., 2011). E como é grande a diversidade alimentar no Brasil, alguns produtos ultrapassam o nicho local e adquirem dimensão nacional por conta de “algo culturalmente construído, o gosto” (MACIEL, 2005, p. 53).

A percepção subjetiva de qualidade faz com que os produtos passem a ser procurados nas feiras, valorizando o nome do feirante ou atrelando a “marca” à comunidade rural produtora (ANGULO, 2002; HEREDIA, 2013). Por isso, alguns agricultores-feirantes do Jequitinhonha mineiro são reputados pelos produtos de qualidade, ganhando fama pelo “capricho” (ANGULO, 2002) na produção. O “capricho”, segundo o autor, é referência de qualidade para produtores e consumidores, e se manifesta na boa aparência, higiene e sabor dos alimentos. A “fama” indica um “produtor caprichoso; o capricho é valorizado pelo consumidor, é considerado um dos principais atributos para aquisição de determinado produto” (RIBEIRO, 2007, p. 81). Maciel (2005) indicou que esses alimentos, valorizados culturalmente por alguns grupos, podem até ser estigmatizados em outros grupos, e cita como exemplo o uso de água com farinha (“tibé”) que, para alguns, é um alimento cultural, para outros, sinal de escassez de alimentos. Se são indiferenciados, consumidores podem não criar vínculos com produtos de feiras; por isso alguns produtos podem ser “facilmente substituíveis”: “[os consumidores] não querem escolher o produto ‘perfeito’, mas bom o suficiente para satisfazê-los” (KINJO; IKEDA, 2005, p. 9).

Assim como os produtos, nas feiras os sistemas de pesos e medidas dos produtos também costumam ser peculiares. Exemplo é o sistema de pesagem das mercadorias das feiras de Itabaiana, na qual Pazera Jr. (2003) assinalou que feirantes utilizavam vasilha metálica ou cuia para vender farinha. Moreira (1992) destacou a diversidade dos sistemas de medição de produtos que existiam nas feiras livres de Feira de Santana:

Café, farinha de trigo, algodão, açúcar, toicinho, cacau, “carne verde” (carne fresca) etc. eram comprados/vendidos a arroba. Farinha de mandioca, arroz, feijão, sal, ao alqueire. Óleo, cachaça, vinagre e outros líquidos eram comercializados a canadas; chá e manteiga a libra. Usava-se o celamin (ou selamim), também chamada litro, além das medidas lineares vara e côvado. (MOREIRA, 1992, p. 196)

Essa interação entre localidade, produtor e produto tem sido destacada na abordagem dos Sistemas Agroalimentares Localizados (Sial). Alimentos, conhecimentos e redes de proximidade entre produtores e consumidores formam os Sial, que têm forte ligação com o território e o saber-fazer dos agricultores. Dessa forma, criando valor pelas técnicas usadas nos processos de produção ou por matérias-primas específicas, produtos, produtores, agentes, recursos naturais e, enfim, o “próprio território torna-se produto a ser vendido” (PECQUEUR, 2009, p. 88). Dessa forma se estabelece a relação entre produtos “afamados” das feiras livres e uma “cesta de bens culturais”; a relação é criada por “produtos ou serviços oriundos de diferentes produtores e de lugares de um mesmo território” (PECQUEUR, 2003, p. 144).

 

Programas públicos de apoio

Feiras livres, de acordo com Ribeiro (2007), são espaços propícios para criar programas para a agricultura familiar, tendo em vista a interação entre produção, abastecimento e economias locais. Produtores familiares nem sempre alcançam bons resultados quando buscam mercados distantes, pois a intermediação é grande, acertos de contas se arrastam e custos de transação ficam, muitas vezes, proibitivos. Assim, valorizar feiras livres com programas públicos pode ser um apoio expressivo para o agricultor, cuja demanda principal, em geral, é o local de vendas e o transporte. A feira contribui para o abastecimento local, pode gerar acesso vantajoso da produção familiar aos mercados, influencia nos custos, na renda e na qualidade do abastecimento urbano. Porém, essas ações não se restringem à mobilidade, sendo necessárias políticas voltadas para

melhoria de sistemas produtivos, microfinanciamento comunitário à indústria doméstica rural, certificação de origem de produtos rurais são perfeitamente possíveis neste campo, além de inúmeras atividades de capacitação para o beneficiamento, ambiente, produção, alfabetização. (RIBEIRO, 2007, p. 17)

Experiências de fortalecimento de redes de feirantes voltadas para a solidariedade e justiça aconteceram nas Redes de Comércio Justo e Solidário, que também buscam ligações mais amplas, inclusive com mercados internacionais. Outras formas de coalizão entre feirantes, como associações, mostram a importância dos espaços criados pelos próprios feirantes para encaminhar questões referentes às feiras, e podem se tornar laboratórios para a criação de políticas públicas específicas, enraizadas nos atores que nelas atuam.

Em geral, os principais programas públicos de fomento às feiras no Brasil são criados por iniciativa do poder público municipal. Existem os denominados “Vale Feira”, que asseguram abastecimento de famílias em situação de vulnerabilidade (PREFEITURA DE MARATAÍZES, 2015), garantem aquisição de excedentes de feiras (JORNAL HORA DA GENTE, 2014) e induzem compras de funcionários públicos. Alguns estados criaram, ainda,  programas de distribuição de barracas e toldos para feirantes, e, durante certo tempo, o Ministério de Desenvolvimento Social (MDS) manteve um Edital de apoio às feiras como equipamentos de segurança alimentar e nutricional.

 

Considerações finais

O levantamento bibliográfico sobre as feiras livres no Brasil mostrou um conjunto bastante amplo de estudos, versando sobre assuntos que vão do reconhecimento de um espaço de fortalecimento da produção agrícola familiar, aos efeitos econômicos que geram nos municípios que as abrigam, ou ainda, como um espaço recheado de culturas, sociabilidades e potencialidades. Foi possível notar variadas formas de “ser feirante”, de contextos de feiras, de métodos aprendidos ou herdados para o ofício. A produção científica sobre as feiras livres no país é consonante com o próprio território brasileiro: é ampla, variada, contraditória, colorida, com um jaez de atores, saberes e sabores. Mas observa-se que existe uma concentração no que tange às formas de acesso a esses conhecimentos, que são disponibilizados principalmente em periódicos científicos, e contam com estudos recentes, posteriores à década de 2000.  Compreende-se ainda que existam dificuldades de análise de feiras em algumas áreas, principalmente nas tecnológicas e nas ciências exatas.

Apesar dos estudos feitos mostrarem a riqueza econômica e cultural das feiras livres de todo o país, apesar de elas alimentarem a população, fortalecerem a identidade cultural, vitalizarem circuitos próximos de troca e manterem forte repercussão na pegada ecológica dos alimentos, o que se percebe é que programas públicos criados para apoiar as feiras se mostram muito tímidos. Em geral são ações municipais, iniciativas pontuais, que estão longe de se equiparar à escala abrangente do alcance das feiras livres. Esta é uma lacuna séria na ação pública que precisa ser corrigida para assegurar soberania e segurança alimentar, para dar mais dignidade aos feirantes e para garantir o fortalecimento das muitas “províncias” alimentares que existem e se multiplicam pelo Brasil.

 

 

 

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ARAUJO, Alexandro Moura; RIBEIRO, Eduardo Magalhães. Feiras, feirantes e abastecimento: uma revisão da bibliografia brasileira sobre comercialização nas feiras livres. Estudos Sociedade e Agricultura, v. 26, n. 3, p. 561-583, out. 2018.

 

 

Resumo: (Feiras, feirantes e abastecimento: uma revisão da bibliografia brasileira sobre comercialização nas feiras livres). Este artigo analisa estudos brasileiros sobre feiras livres brasileiras para traçar um panorama da produção científica, destacando suas características regionais, similaridades e diversidades. A pesquisa se baseou em um levantamento bibliográfico sistemático de 434 trabalhos, classificados a partir da distribuição regional, veículo de origem, ano de publicação, metodologia e área de conhecimento. Foram analisados 50 estudos (11,50%), selecionados por critérios de distribuição regional, amplitude de abordagem e relevância, indicada pelo número de citações. Constatou-se que as feiras brasileiras são muito diferentes, tanto pelos tipos de feirantes quanto pelo contexto regional. Feiras são importantes para o abastecimento urbano e geração de rendas para produtores rurais e feirantes, mas, apesar de promoverem forte animação socioeconômica e terem grande importância na segurança alimentar, recebem limitados investimentos públicos, feitos em geral por administrações municipais.

Palavras chaves: abastecimento urbano; feiras livres; circuitos curtos; segurança alimentar.

 

Abstract: (Fairs, Sellers and Supply: a review of the Brazilian bibliography on commercialization at free fairs). This article analyzes Brazilian studies on street markets to describe a panorama of scientific production, highlighting its regional characteristics, similarities and diversities. The research was based on a systematic bibliographical survey of 434 papers classified according to their regional distribution, vehicle of origin, year of publication, methodology and area of ​​knowledge. Fifty studies (11.50%) were analyzed, selected by regional distribution criteria, scope and relevance, indicated by the number of citations. It was found that the Brazilian street markets are very different, both by the types of vendors and by the regional context. Marketsare important for urban supply and income generation for rural producers and vendors, and although they promote strong socioeconomic activity and have great importance in food security, they receive limited public investments, usually made by municipal administrations.

Keywords: urban supply; street markets; short circuits; food security.

 

 

Recebido em junho de 2018.

Aceito em setembro de 2018.



[1] Pós-graduando em Gestão Pública pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Norte de Minas Gerais (IFNMG) e Bolsista EXP C-CNPq. E-mail: alexx_m_a@hotmail.com.

[2] Professor titular do Instituto de Ciências Agrárias da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). E-mail: eduardomr@pq.cnpq.br.

[3] A pesquisa que originou este artigo foi apoiada pelo CNPq e Fapemig, aos quais os autores agradecem.